sábado, 16 de julho de 2011

Telê, Antônio Cândido e a "Comissão da Verdade"

Por Máximo



Antônio Cândido escreve, logo no primeiro parágrafo do prefácio a "Raízes do Brasil", de Sérgio Buarque, que a despeito de acharmo-nos muito diferentes, à medida da passagem do tempo nos diluímos nas características de nossa época, de modo que o que dizemos não é mero testemunho, mas o registro de uma “visão do mundo, no momento particular do tempo que se deseja evocar.”

Falar de Telê é tirar o tênis, voltar a ser peladeiro de rua. A seleção de 82 era o Brasil que se jogava à rua. Cansados do peso da bota bárbara, os calos de sangue eram abertos em cada esquina, com agulhas nem sempre esterilizadas. No quartel da PE, no início da Gonzaga Bastos, o sangue coagulava-se, calos e crostas ressecados, entregues à ferida.

Jogar descalço numa rua de paralelepípedo era muito melhor do que no campo de “soçaite”, em asfalto abrasivo, que havia naquele quartel.

Cada lançamento, cada tabelinha de um meio-campo formado por Cerezzo, Falcão, Sócrates e Zico. A resposta silenciosa da rua descalça que talvez pensasse  em ideologia que  só pudesse vir armada.

Melhor abandonar as palavras ao inventário de corpos alinhados, disciplinados, abatidos em reverência à ordem que teimava em nos envelhecer. E envelhecer era acumular cadáveres.

Pensávamos a cada letra, a cada chilena, a cada balãozinho, a cada trivela, hoje completamente mortos, uma ideologia que só pudesse vir armada na perversão de uma utopia em sua vontade de não fazer nada, na desfiguração da candura, que hoje soa ainda mais cínica em “Comissões da Verdade”.

Guevara, Debray, Leandro, Júnior, Adílio e Lico, inventores de uma heresia que precisam tornar ao crime. Porque não querem o tipo de vida que segue, que passa como o tempo: rápida, morna, opaca.

Impune.

SRN

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