sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Rio Inconfidente

Por Cátia Cilene




Qual o papel do intelectual como força de transformação da sociedade? Fonte ou produto? Revolucionário ou reformista?

São perguntas antigas, sempre renovadas. E à revisitação conveniente presta-se a preocupação desses letrados no Rio colonial ao final do século XVIII: necessidade-liberdade; teoria-prática.

Nos limites da apreensão do real, a antinomia se resolve e o século XIX que se segue será pertinente a um projeto de Estado, em detrimento da ideia de nação, na construção do Brasil em seguida à independência. Um esforço de construção do que cabe ao Estado tributário à  identidade nacional – eis o que, de fato, substantiva o projeto, diacronicamente, do século XVIII, em seu final na relação desses letrados e a América portuguesa, até recentemente, quando da crise provocada pela Nova História, novos objetos, novas abordagens, fragmentações identitárias.

Muito da leitura intelectual feita por nacionais estava marcada pela visão das fontes que os influenciaram. Fontes, em geral, estrangeiras, condicionadas pela formação de origem.

Em Capítulos da História Colonial, Capistrano de Abreu reproduz tal influência e imputa aos inconfidentes um equívoco que não poderiam ter cometido. Exigia-lhes uma consciência nacional que revelava uma cobrança que só poderia vir de alguém claramente influenciado pela experiência notadamente européia. Era-lhes impossível: aos mineiros não era dada outra alternativa senão pensar a própria província. Ainda não havia a questão nacional do ponto-de-vista da colônia – um atributo da metrópole portuguesa.

O Brasil-Império do século XIX não se sentia confortável com a memória dos inimigos inconfidentes que, ao final do século anterior, assacaram contra a metrópole. Tema tabu, sua abordagem envolver-se-ia, via de regra, em imprecações.

A linha evolutiva e a instrumentalidade para prevenção, esclarecimento e orientação indicam com clareza a marca do dezenove em seu cientificismo iluminista na historiografia do Brasil-Império. A história que se produz gira em torno do Estado imperial e do que interessa ao grupo restrito de uma elita letrada, concupiscentemente cooptada.

No século XIX, a história deixa de ser uma atividade literária para virar produção científica. Uma mudança dentro de um quadro mais amplo em que se discute a questão da identidade nacional na Europa.

O lugar nacional do discurso historiográfico é o IHGB, fundado em 1838, cópia do modelo europeu das academias ilustradas organizadas com base nas relações sociais, o caráter eminentemente elitista da tradição das luzes. Portanto, a discussão da identidade nacional, à reboque da consolidação do Estado imperial no Brasil, não poderia apresentar-se senão marcada por um forte elitismo nasciturno. Qual a ideologia que sustenta tal projeto de construção?

Certamente a que evite inconvenientes. A questão nacional via Estado, tema candente na Europa, deveria evitar aqui a escravidão e a população indígena. Dificuldade anunciada por José Bonifácio, já em 1813: “...amalgamação muito difícil será a liga de tanto metal heterogêneo, como brancos, mulatos, pretos livres e escravos, índios, etc, etc, etc em um corpo sólido e político.”

Típico método iluminista: esclarece-se, primeiro, a cúpula, em seguida, o resto. Ponto central da historiografia que irá definir a identidade nacional, tanto interna, quanto externamente, sua particularidade está na ausência de ruptura: a nação brasileira é pensada contínua, desdobramento linear e cronológico do processo civilizatório iniciado pela metrópole portuguesa. Nação, Estado e Coroa: ao contrário da Europa em que Nação e Estado são campos distintos. A identidade brasileira tem de ser, necessariamente, um legado da colonização portuguesa. A metáfora de povos irmãos é uma estratégia a fim de reforçar a ideia de continuidade, ao invés da ruptura. Uma continuidade que apresentava, internamente, no âmbito de uma concepção em academia de elite, iluminista, a exclusão  daqueles não considerados em condições para o exercício civilizatório definido (negros e índios); externamente, a monarquia, regime superior, era a antítese do que se percebia como a barbárie republicana adotada no resto do continente.

Uma conexão oportuna para este trabalho, exatamente neste ponto, seria pensar no futebol, relacioná-lo ao que há pouco mais ou menos 100 anos separa a primeira bola trazida ao Brasil por Charles Miller e as relações entre aqueles letrados e a América portuguesa, autoritária, repressora, ao final do século XVIII. Não haveria uma semelhança com o método que se desenvolve ao longo do século XIX, mudando apenas os pressupostos? O que no projeto identitário imperial era um problema, o “amálgama racial” inviável, a que se referira pejorativamente José Bonifácio, na República, adiante no Estado Novo, é a solução, as “raças” distintas na confraternização da democracia racial. Na era das massas despossuídas em que se temia pelo regime da propriedade, a massa nacional mestiça e negra exigia um encaminhamento. A solução encontrada foi o projeto de Freyre da “democracia racial”, para o qual o futebol que havia sido importado teria uma importância estratégica, seria o locus próprio de experimentação desse projeto. O futebol, entretanto, também como pensava Freyre, não domina mecanicamente a cultura brasileira, é muito mais do que sublimação de irracionalismos e controle social, é apropriado e ressignificado pela esquina carioca.

A periodização começa com a posse a Vice-Rei do Conde de Resende, em julho de 1790. uma conjuntura internacional conturbada, amplamente revolucionária em virtude das recentes revoluções americana e francesa. Inevitável o reflexo no plano interno, sobretudo entre os intelectuais. Repressão é a palavra-chave de Resende, mandando fechar a sociedade literária do Rio, na casa do poeta Silva Alvarenga, considerada cerne da divulgação subversiva.

No Rio era latente a predisposição “inconfidente”. Sua base material assentava-se entre os grandes comerciantes e proprietários, inconformados com o monopólio português que lhes incorria em prejuízos.

Em José Joaquim Maia, estudante carioca na França, onde correspondeu-se e estabeleceu relações com Thomas Jefferson, aparece com clareza o proselitismo de um futuro estado independente de sucesso ideológico garantido, sem contradições relevantes, unificado pelo discurso. Na paisagem social da colônia, os brancos e os portugueses radicados eram o “corpo da nação”, queriam a revolução, tal como a que se investira na França, a independência do jugo português ainda nos moldes do Antigo Sistema Colonial.

O Rio, portanto, reunia todas as condições objetivas para ter uma importância capital no movimento inconfidente. Éramos a convergência material e intelectual, núcleo de letrados, em que as ideias revolucionárias provenientes da França de 1789 encontraram abrigo e seguia o fluxo à sua difusão interna.

Reprimir o Rio era estratégico. Indispensável mantê-lo sob controle, imune ao “contágio francês”, num verdadeiro “cordão sanitário dos Estados monárquicos e conservadores”, aos quais vinculava-se, subordinadamente, a Coroa portuguesa.

O dia 21 de abril de 1789, data da execução de Tiradentes, tinha de ser exemplo. E o Conde de Resende, então,  transformou o Rio num cenário simbólico do anátema, e “que esta cidade ficasse isenta e ilesa do contágio de tão infame conspiração”. O rito, para maior eficácia, necessitava apoio sagrado e “no dia 26, na Igreja dos terceiros dos Carmos, oficiou-se o te deum, em agradecimento a Deus pelo benefício que fez a estes povos em se descobrir a infame conjuração.”

Do enforcamento de Tiradentes ao futebol carioca, passando pelo carnaval e pelo comício das Diretas Já na Candelária, em 84, o Rio sempre foi um espaço para o laboratório de identidades de todos os tipos de Brasil, moderno, pós-moderno, fragmentário, o que for.

Como último parágrafo e porque se trata de um trabalho, de resto, carioca, ocorreu-me o desfile da Beija-flor, se não me engano em 92, Ratos e Urubus, algo pouco mais ou menos com esse título para um enredo revolucionário em que ao Cristo Redentor coberto, numa recidiva do Conde de Resende na figura de Eugênio Salles,  seguia-se um cortejo Rubro-negro esfarrapado, favelado. Carioca.

quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Braço Graciliano

Por 28



Cada passo não era uma representação. A vila, imagem já tão gasta, não mais uma ampliação do típico, do suburbano, aperto pequeno-burguês. Um movimento de concepção, apagando o já posto, há 48 anos imutável, por uma linha de pequenas casas geminadas. Uma menina de nota suave ganhava configuração e se impunha sobre o portão velho, que parecia romper a vulgaridade de seu grafismo e render-se à novas possibilidades de composição. Ela olhava a “figura”. “Figura” era como se referia a alguém, que, como ele,  para ela caminhava. A claridade forte e ácida do 30 de dezembro, niveladora de matizes e gente, refletia-se sobre o espelho de sua altivez. Havia algo de “cult” naquela menina que o calor não desfigurava. Uma forma de elegância para além desta palavra. “Cult” – era isso, era o que queria esclarecer, mas que só conseguia perceber à medida que caminhava em sua direção.  De perto, antes de tocá-la, sentiu-lhe a força, rara, concisa, percebida apenas quando frente ao encanto feminino, que só pode vir do que é calado. Ela, de fato, não o conhecia. E não se sabe se o conheceu.

“E aí, cansada da viagem?”

Ela não demonstra surpresa, avisada que estava sobre o pardieiro. Educada, evitando constrangê-lo, poderia, mas não anda, na ponta dos pés. Instala-se no quarto, à direita da entrada.

Ele a observa detidamente. A brincadeira ao telefone lhe ocorre e cogita mesmo concretizá-la, dizendo à menina que gostaria de tirar a roupa. Não tira, mas insiste, continua a insistir; adiante com a menina sobre o seu colo, reticente, cuidadosa, a espetá-lo aquele olhar que se repetiria com frequência e que, para se tornar gráfico, bastavam apenas as palavras não vocalizadas, contudo expressivas. A primeira vez que conhecia uma menina de olhar gráfico:

“Para. Viajei horas, estou suada, quero tomar um banho.”

Foi no banheiro a primeira manifestação do rigor que ela imprimia aos conceitos. Indispensável a limpeza, lavar o sanitário, a pia, o box de acrílico e alumínio em fusão promíscua. Como um maquinismo emperrado, ele acostumara-se ao hábito. Anestesia por anestesia, convém que ao esquecimento acresciam-se as substãncias.

A presença dela era água represa, contida em diques de filtro com fins específicos. Num primeiro nível, a elegância, o saber separar o que vale do que não vale. Só sociedades que souberam o valor do supérfluo foram as mais capazes para o exercício da influência. A Espanha, quando pragmática, em surto de niilismo, gesta um Franco, que dispensa um Picasso, acolhido na França do supérfluo para um Guernica da morte. Preto e branco, como um coxo de amputação. Neste nível, ela lava o nanquim preto, lava-o por dentro, mas ele não demonstra, temeroso de amá-la, e então reage. Infantil.

“Puxa, cara, como você é bobo.”

Confuso, metendo os pés pelas mãos

“Muito incompetente.”

Inúteis as tentativas de humor negro, a forma de proteção lúcida mais adequada.

Estão num shopping. Ela fala com propriedade de um objeto, cujo preço o assusta pela ausência do costume. Mas, quem está fora da vida é ele; ela nunca sofreu de solução de continuidade. A naturalidade diante do que lhe é inacessível compõe em sua cabeça a imagem de um conduto de água límpida, exclusivo e “cult”. A cada minuto quer mais desejá-la, amá-la da forma em que se sente seguro. Ele a ama naquela mesma noite, pesquisando a madrugada no corpo que se oferece lento, em aroma inebriante, amadeirado. Ela é intensa, de base arquitetônica, como um templo Descobri-la é uma sensação única. Ele se esforça por perder-se, não teme este tipo de viagem. Ela, às vezes, lhe parece ceder, a arquitetura quase transparente. Recua, a cordilheira se recompondo, protetora ao ímpeto do viajante desconhecido. Aí também ele se sente um privilegiado, intuindo a proximidade com o Original. Ali a diferença que faz fixar a beleza, ficando a grande arte para um lado, do outro, a sucessão monótona de nomes femininos, que só são femininos porque têm nomes.

Uma vez alguém escreveu:

“ A única realidade que conta é a da imaginação.”

Por inépcia, prefere a de Graciliano, no conselho que deu à irmã que queria escrever:

“Arte é sangue.”

Cores complementares, ele e ela. Ele, o azul; ela, viva, o laranja. Ele, o Goethe de Fausto, ela o Goethe da Teoria das Cores. Da imaginação, que o surprendia, ela arranca devagar um tijolo, em seguida o cimento, não demora a casa de linhas sinuosas que o convida a conhecer. Uma subjetividade de construção. 

“Arte é sangue.”

Ele repete olhando com saudade a foto de Graciliano, cujo braço ela achou elegante. Pensa num título: “Braço Graciliano”.

“Estou me sentindo plena.”

O “boteco”, metido a irlandês, em vez do Bonno Vox, o Anthony Kids, do Red Hot. Ele não gosta de lugares fechados. Mas, como resistir? Uma fissura provocada pelo vício do cigarro. Conheceu 45 dias tremendo, à base de Carbamazepina, fluoxetina e rivotril, que, aliás, não o adormecia, obrigando a um negócio com um companheiro de clínica, que o escondia na língua, voltava da fila do remédio, se encontrava com ele no campo de futebol e o trocava por um maço de derby.

O primeiro beijo. Era o momento de olhar para o drink dela e brincar com o nome Alexander. Soaria inteligente, na ironia fina de analogia, se houvesse citado Alexander Caldas e feito referência ao inventor do móbile, a escultura de pingente, presa a fios,  hoje tão banalizada que não há quarto onde se instala berço de bebê sobre o qual não se encontra.

“Um gole, posso?”

Para de escrever.

Retomar as impressões e recuperar as sensações não são tão fáceis para o tipo de texto que escreve.  É que o chamaram ao telefone. Na vizinha, sua irmã, sobre questões do inventário, lhe pede cópias da identidade e do cpf, cópias que deverão ser enviadas o quanto antes, sobretudo, antes do carnaval. Cogita também da possibilidade de uma procuração, que ele prontamente se dispõe.

“Como você está, meu irmão?”

Curioso. “Meu irmão”, para ele, forma de tratamento indiscriminada; dito assim, no entanto, dito desse jeito, certamente, tem um gosto de afeto.

“Não tenho outra alternativa senão estar bem. O que aconteceu não tem volta.”

“Então, anota o fax. Esse é o lá de casa. Quer o da escola?”

“Valeu, minha irmã, não precisa.”

“Um beijo.”

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

A Praia da Bica de Assunção


A fauna tricolor, a praia da bica de Assunção, suburbanos de segunda, amarelos-chorões. Só faltavam a CBF e a imprensa privada sem descarga da bola. Agora não falta nada e constituída está a ignorância arco-íris, sob o epíteto de "unificação dos títulos".

Outro dia escrevi que a obtusidade dessa gente não resiste a menor análise. Falam de história como se soubessem do que se trata. O que significa história? A ignorância arco-íris certamente pensa no mugido  "contra fatos não há argumentos". Deixemo-la a ruminar. Não gastemos vela com defunto barato, tentando perguntar se já ouviram falar de Ranke, historicismo alemão, positivismo, marxismo, tipos ideais weberianos, Escola de Annales - isso pra tirar a dúvida e confirmar mesmo se ainda continuam no século XIX.


Agora que é engraçado disso ninguém tem dúvida.


À praia da bica de Assunção, que do dia pra noite ganhou de lambuja 8 "títulos" brasileiros, soma-se a fauna das laranjeiras mandando pintar o "tri" naquele campo do confiança.

É verdade. Honestidade completa ninguém desfruta e não sejamos injustos com a ignorância arco-íris. Não é de hoje que os bambis da pinheiro machado vivem de chicanas jurídicas. Todos conhecem o apelido de seu departamento jurídico: "o rei do tapetão". Além disso, a fim de permanecer na superfície, na memória que dispensa a história, lembremos da mesa virada pra que a fauna que costuma correr assustada no Santa Bárbara possa se situar e ajeitar as flores do seu arranjo que caiu e esquecer-se do espinho da rosa triste de madalena arrependida, subitamente convertida, incólume, à primeira divisão do futebol, quando já caminhava pra disputar campeonato de rua, como os que havia em Vila Isabel numa rua conhecida por Senador Soares.


São "Tri"? 

Sei não, mas a bambilândia das laranjeiras tem mais é cara de bi.

SRN

sábado, 25 de dezembro de 2010

A Companhia de um tricolor só não é pior do que a de dois tricolores

 

É preferível 5 minutos de Carlos Drummond de Andrade à meia-hora de qualquer tricolor.

Ontem , em plena noite de natal, compreendi, afinal, o que representa ter o saco do bom velhinho. A começar pela paciência que se faz necessária para traduzir para brasileiro o próprio português. Também é conveniente informar que Carlos Drummond de Andrade era poeta e escritor (tais simplificações, de resto,  são suficientes, meus caros tricolores, já servem para quando vocês prestarem provas no EJA).

Agora calculem:

Tranquilamente à porta, esperando Papai Noel chegar, quando irrompem as personagens, como se fossem plágios de segunda, de terceira, de quarta divisão e, de lá de onde nunca teriam voltado, não fossem Havelange e a virada de mesa, o Dom Quixote de Gilberto Braga e o Sancho Pança de Glória Peres:

"Nada a ver, pô... esse cara é maluco...madeira com cupim, Frei Caneca... pô!"

Como bom aspone, interveio logo em seguida o Sancho do capítulo atrasado:

"Só podia se dos framengo... ah! Ah! Ah!"

A intenção era fazer graça com a minha postagem aqui do Nação, mas é visível o problema sintático.  Ademais, é natal, noite de confraternização, de tolerância a um ponto até o ponto de resistir, permanecer firme para não tornar ao livro, ainda que fosse o do Paulo Coelho.

"Nada a ver, pô.. esse cara é maluco...madeira com cupim, Frei Caneca...pô!"

"Só podia se dos framengo...ah! Ah! Ah!"

A reprodução é literal, pois  impossível resumir o que  é ágrafo.

E nada do bom velhinho. 

Foi quando me ocorreu que, apesar de grande, seu saco também possui limite. Impossível descer à terra  sem profligar, e aí a malandragem do velho que é bom, mas não  estóico, a fim de aturar aquela combinação néscia boquirrota.

E o cd, com defeito, não cansava a aporrinhola:

"Nada a ver, pô.................................."


"Só podia se dos...................................."

Ao cd pirata sucedeu rápido o celular com fotos do Dom Quixote de Gilberto Braga tiradas ao lado, entre outros,  do Leandro Eusébio. Ao fundo outro tricolor, sempre papagaio de pirata.

Começou a chover.

Feliz Natal

Ainda foi possível. 

SRN

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Na Frei Caneca Não se Deve Vender Madeira com Cupim

Este blog é antigo, justo porque em sua maioria feito por antigos. Dois dos quais viram o mítico Geraldo jogar. O cara era um craque, fazia o que Zidane apresentou como novidade, andando sobre a bola, já em 1974.  Mas, francamente, me irritava, irritava a um ponto, até o ponto de gritar junto com a Charanga:

"Tadeu! Tadeu!"

O meio-campo que viera do América e que, hoje, certamente pegaria seleção.Mas, por que a ida a nossa Idade Média nesta véspera natalina? 

 É que a castanha podre de 87 continua e o saco de Noel, que não é o da Vila que, de resto, não iria perder tempo com iniquidades, continua com as bolas, digo, bolinhas apertadas pelas renas que deveriam tê-las devolvido, mas, oportunistas, prenderam-nas, rijas, no morumbi.

Rubro-Negros aproveitamos o saco do Noel para nele enfiar a CBF, a taça de bolinhas, as renas do morumbi. 

Aqui também a justificativa da introdução antiga: as chuteiras já foram penduradas, mas quando não eram, sem nenhuma disposição, sem chance mesmo de brigar com uma mulher e não será agora que a administração de nossa Patrícia, independente e a despeito do que seja, receberá deste velho a crítica indevida. Com muito mais razão, abstenho-me, não como Pilatos no Credo, pois não creio em mais nada, deixei de crer há muito, tenho andado até a preferir Adam Smith a Marx, o que dirá a crucificação de Patrícia por Teixeira e Leite. A combinação lembra a razão social de loja de madeira da Frei caneca, onde também, a bom preço, contrata-se lustrador de móveis, cadeiras, estatuetas e caras de pau. 

É muito fácil ser engenheiro de obra feita, mas penso que a Patrícia deveria partir de vez pro confronto e entrar na justiça, conforme recomendou uma das partes assemelhadas ao referido negócio descrito acima. Temos aqui no blog parceiros aptos em leis e códigos, não me cabendo senão a função do palpite.

Faça isso, Presidenta, entre na justiça reivindicando de vez o título legítimo de 87, sob o argumento sem cuja resolução, se for possível, não iniciar-se-ia o próximo brasileiro.

Não que, Rubro-negros, faça-nos a diferença. Desde 87 que não nos faz, tetracampeões. 

Mas, é que não há monopólio na Frei Caneca. Além disso, a madeira que essa firma vende costuma vir com cupim.

SRN

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Aos "Idiotas da Objetividade"

Acabo de receber este e-mail, enviado por 28. Segundo este meu irmão, trata-se de cópia de fragmento de texto de um palestrante, Amparo Puskas, que, lamentavelmente, não pôde aceitar o convite para comparecer ao recente Footecon que o Parreira promoveu no Copacabana Palace. Não sei se foi publicado nem como o 28 a ele teve acesso. Seja como for, o que me dizem?

SRN
Máximo


Aos "idiotas da objetividade"

Por Amparo Puskas

Mário Filho era Rubro-Negro. Para a maioria aqui presente, ainda muito jovem, o nome ao qual acabo de me referir deve lhes lembrar apenas o Maracanã.

Na verdade, não foi à toa que Mário Filho chegou a ter seu nome na fachada do Campo Oficial do Flamengo. Leiam "O Negro no Futebol Brasileiro", integrante da bibliografia de referência, uma das obras fundamentais para se entender a importância do futebol no Brasil e a sua conexão com Gilberto Freyre na construção de um projeto identitário nacional tributário à modernidade, um tipo de inteligibilidade ultimamente contestada pela Nova História, novos objetos, novas abordagens, centrifugações identitárias. Mas, não é este o tema de minha participação e sim a objetividade dos idiotas.

Reparem, entretanto, o título desta comunicação: "Aos idiotas da objetividade". Trata-se de uma expressão confeccionada pelo irmão de Mário Filho, o também jornalista, escritor e dramaturgo, Nelson Rodrigues. Praticamente cego - o que explica o fato de ser  tricolor - Nelson Rodrigues ia ao Campo Oficial do Flamengo e inventava, imaginando da tribuna colorida em pó de arroz o que dava por ocorrer em campo em meio à fauna serelepe das laranjeiras. No dia seguinte, nas páginas do Jornal dos Sports, aparecia um outro jogo, escrito pela imaginação delirante do irmão de Mário Filho.

"Mas, Nelson, o jogo foi outra coisa. Nada tem a ver com o que você escreveu. Vá ver o videotape!"

"O videotape é burro e vocês são todos uns idiotas, idiotas da objetividade."

Essa resposta vale mais do que uma piada. É a expressão da objetividade idiota que os demais tricolores cobravam de Nelson. Não pesquisei o suficiente, até porque pra entrar em qualquer arquivo tricolor é preciso antes passar pó-de-arroz e eu sou alérgico, lamentavelmente. Importante, no entanto, é o sentido implícito contido no recado criativo do irmão de Mário Filho: a história já há muito abandonou o historicismo, o nível dos acontecimentos que se sucedem em cadeia cronológica numa explicação monocausal. São várias as fontes produzindo sentidos que atuam reciprocamente. Em suma: Nelson confirma a estupidez, muito comum no resto do Rio de tricolores ecológicos, vascaínos de segunda e botafoguenses amarelos-chorões, de que "contra fatos não há argumentos".

Um conselho de veterano: toda vez que ouvirem tamanha platitude olhem pra face do infeliz que a proferiu. O orgulho que demonstra, como se anunciasse uma das verdades renovadas de um dos 10 mandamentos. Pobre-diabo. Não irei complicá-lo, derretendo-lhe seus pobres miolos toscos, mas, a despeito de não recorrer a qualquer outro referencial teórico que inutilizaria em poucos segundos a idiotia, recorro simplesmente ao irmão de Mário Filho: "idiotas da objetividade".

Esta é a introdução, indispensável à análise do estropiamento do esporte pelo negócio a que assistimos na reta final deste brasileiro. A entrega vergonhosa dos paulistas a esse time medíocre das Laranjeiras, sem cuja ajuda, vinda de plagas forasteiras, em lombo de burro, não teríamos sequer notícia.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Ratos, ratazanas, de grená, verde e branco



Parece que a última medida do excelente governo Lula será um convênio com a Secretaria de Saúde do Rio de Janeiro. Os cariocas andam empesteados por ratos, ratazanas, algumas velhas de mais 25 anos que viviam entocadas, envergonhadas nos bueiros mais ou menos entupidos, ali entre a saída do Santa Bárbara e a Santa Úrsula.

Certo, são meio esquisitas, grená, verde, branco...


O próprio Sérgio Cabral, que costuma se esconder atrás do Beltrame, só pôde sair do Guanabara após o cortejo das "grenás" a obstruir-lhe o carro oficial. E olhe que Cabral convive com variados tipos de bichos, entre os quais lesmas, sapos, burros não só na política, mas também em São Cristovão, num campo de pelada abandonado que volta e meia é objeto do disque-denúncia.

Minha paciência é a de um bom cristão. Sempre faço o sinal do cruz e, quando levanto pela manhã, só uso o pé esquerdo, como bom canhoto. Mas, 28, que é  meu irrmão não-consanguíneo, reclama dos seres humanos um grau de intolerância tributário à pequenez da espécie. Não se trata - argumenta - vermes ou pusilânimes, embora maquilados de grená, verde e branco, com a mesma grandeza devida às comunidades responsáveis pela construção silenciosa de uma Nação.


"Porra, Máximo. Esse papo de politicamente correto tem limites. Tá tranquilo, etc, etc, mas, o que se vê hoje no Rio é regressão. Mais do que leptospirose colorida, o que enfrentamos é uma lobotomização à Lombroso, a respeito de cujas iniquidades só se fazia alusão como diatribe histórica. Sem chance, meu irmão. Recuperar uma futilidade anacrônica me lembra o que eu ouvia quando moleque sobre as putas polonesas. Da polônia, a última foi o tal João, reacionário, talvez, por isso, o milagreiro de um  único milagre que foi fazer aquele arremedo de monturos ganhar não sei o quê em 80."


Olha a taxa, 28. O defunto é tão barato que usa fósforo gasto pra acender a própria vela.


SRN

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Demiurgo

13 de dezembro foi dia dos títulos do Mundial Interclubes de 1981 e do Campeonato Brasileiro de 1987



do Flamengo / www.flamengo.com.br
 
Nunes marcou duas vezes na decisão
Nunes marcou duas vezes na decisão
Todo bom rubro-negro sabe que o dia 13 de dezembro é uma data especial. Foi neste dia, há 29 anos, que o mundo se coloriu de vermelho e preto, começando no Japão e chegando a uma festa que parou o Brasil. Com um verdadeiro show da equipe de Zico, Junior, Adílio, Nunes e companhia, o Flamengo derrotou o Liverpool, por 3 a 0, e sagrou-se campeão mundial interclubes.

Mas não é "apenas" o maior título da história do clube que faz aniversário nesta data. Outra importante conquista rubro-negra também aconteceu em 13 de dezembro: o tetracampeonato brasileiro, em 1987. Em um Maracanã com mais de 90 mil torcedores, Zé Carlos, Jorginho, Leandro, Edinho e Leonardo; Andrade, Aílton e Zico (Flávio); Renato Gaúcho, Bebeto e Zinho fizeram história.

Comandados por um dos maiores treinadores destes 115 anos do Clube de Regatas do Flamengo, Carlinhos, os rubro-negros suaram, mas venceram o Internacional por 1 a 0, gol de Bebeto, e conquistaram o quatro Campeonato Brasileiro para o clube da Gávea. E alguns dos jogadores deste grupo eram remanescentes da equipe que conquistou o mundo, seis anos antes.

Em 13 de dezembro de 1981, Leandro, Andrade e Zico eram mais novos e tinham a missão de parar a sensação do futebol europeu à época, o Liverpool, da Inglaterra. Em Tóquio, no Japão, a equipe britânica era considerada favorita, mas viu toda a sua supremacia pré-jogo cair por terra ainda no primeiro tempo. Com dois gols de Nunes e um do Adílio, goleada rubro-negra por 3 a 0.

domingo, 12 de dezembro de 2010

Não Precisa Explicar

Por Renato Lopes

Na segunda metade do século XIX um naturalista inglês, chamado Charles Darwin, partiu num tour cientifico pela América do Sul, passou pelas Ilhas Galápagos e depois de muito observar a natureza, sua fauna e flora, elaborou a Teoria da Evolução (ok, sei que foi muito mais do que isso, é só uma forma breve e grosseira até, para expressar onde quero chegar). Escandalizou o mundo ao afirmar que homens e primatas tinham um ancestral em comum (o não menos famoso “elo perdido”), deu uma afastadinha de Deus nas questões concernentes a vida e seus desdobramentos, teve suas palavras destorcidas, principalmente por um tal Herbert Spencer que tentou usar um outro equivoco, O Darwinismo Social, para explicar a sociedade como é, dotada de igualdades e desigualdades, tendo como mote a teoria da evolução, onde só os mais fortes sobrevivem. Mas Spencer, talvez por estar muito inebriado com as suas idéias (ou seria falta delas), nem se deu ao trabalho de perceber que existem numa sociedade  relações materiais, uma estrutura, uma superestrutura, uma síntese, embalados na dialética, ou seja, não é linear, é interativo. Um principio que aliás, se bem observado está muito bem escrito, não com as palavras habituais, nas idéias de Darwin. Ele sempre levou em conta a interação e as propriedades dos seres vivos, capacidade de se desenvolver melhor em um ambiente do que em outro, a disputa que há entre seres de uma mesma espécie e de outras, o embate nunca será só entre espécies diferentes como uma necessidade sempre de sobrepujar a outra. Darwinismo não é historicismo, não se trata de se sobrepor em linha reta, o próprio Darwin assumia isso. Logo, a sociedade não é linear, afinal ela é parte do processo histórico. Spencer só faltou dizer com todas as letras que não há lutas de classes. E fez pior: aumentou o racismo e o preconceito contra todos os povos, logicamente não europeus, e trouxe de volta as tabulas rasas dos pensadores menores, aquele tipo ideal tão pensando por um certo Marx Weber. Mas, o papo não é bem esse. É futebol, em muitos casos puro darwinismo.

Vamos até a copa de 1986. Um argentino, com pouco menos de 1,70, penetra na zaga da seleção inglesa, ergue a “mão de Deus”, ajeita o tesouro dos céus (vulgo bola de futebol), e marca um senhor gol. Os ingleses até hoje o tem entalado na garganta. Talvez no dia que eles tiverem muito mais do que um simples Rooney, provocarão uma sensação dessas em outra seleção.

Avancemos mais um pouco. Na copa de 1994, um outro baixinho, dessa vez jogando pela seleção brasileira, está entre os gigantes nórdicos da seleção sueca. Recebe o cruzamento de outro baixinho, ele nem sequer pula, não é bem um titã para se erguer entre meros mortais, não precisa, ele só dá um “quique” pula, cabeceia e marca um gol, que posteriormente se revelou a chave para o nosso burocrático tetra campeonato.

Dois momentos distintos, duas copas, dois jogadores, Maradona e Romário, dois politicamente incorretos, dois algozes quando o assunto é as quatro linhas. Dois caras se opondo a tudo considerado o mais adverso em suas condições de jogadores, e mesmo assim fazendo bem o seu trabalho. Por que?

Um cara de quase dois metros, pode se adaptar menos aquele gramado do que um baixinho de um metro e sessenta a pouco? Será que nesse mato a girafa do pescoço grande tem mais dificuldade em dobra-lo até o chão para pegar o capim, coisa que a girafa menor faz de forma mais corriqueira? O uniforme da seleção argentina é azul, não verde, em mimetismo com o campo Maradona não entrou, então ele estava visível a todos. Qual a medida da boa adaptação do nanico portenho em comparação aos gigantes anglo saxões? Pois segunda consta nos “autos”, eles são de estirpe mais nobre. É...basta assistir a um jogo para ver o Spencerianismo ir para o ralo. E ainda há quem defina o futebol como um instrumento alienador. Corta essa, povo. Um passo na evolução, Maradona? A troco de que? Ele só era o cara no lugar certo, na hora certa, fazendo a jogada certa Mais do que força, entre em cena a esperteza. Quem se propõe a ser superior, deveria ser o bom em tudo, afinal é o tipo ideal. Não classifico essa força, raça e vontade do Maradona como evolução, linha reta, justo com a bola nos pés (ou nas mãos), isso não existe, está mais para astúcia mesmo. Uma capacidade incrível de se adaptar aos mais diversos meios. De viver a dialética, sem ser a síntese definitiva, afinal ele precisa se reinventar.Está mais para a semente, que assume as caracteristicas do meio onde se planta. E depois disso existem os trogloditas prontos para defender a lei do mais forte

Romário não tem asas, só no sentido de abusado mesmo. E voava pelo campo. Na pequena área estava mais para abelha em volta da colméia só esperando para dar o bote. Na força nunca ninguém conseguiu segura-lo. Favorecido pela genética com uma estatura diminuta, mas compensada em outras áreas, como no oportunismo futebolístico, ganhou a capacidade de se adaptar igualmente as condições mais adversas. Seja no jogando no campo de areia do Abóbora, lá dentro do jacarezinho, ou num estádio lotado num país europeu em pleno inverno. Traz no sangue o calor dos trópicos. Não podemos considerá-lo o próximo passo da evolução, ele é só mais um astuto. Ele tem a visão, o tempo da bola, se antecipa ao gol.

Pensemos um pouco. Darwin, com a sua teoria numa mão e, como bom observador, com um binóculo na outra, assistindo atentamente os dois craques jogarem. Origem distintas, capacidades semelhantes, mas sempre com a mesma finalidade: o gol. Nenhum usou de força, só mesmo esperteza. Ao redor deles, sempre uma massa de pessoas, igualmente distintas, vivendo aquele momento, sempre conscientes de que independente do que aconteça ali não vai torná-los menos proletários, menos vitimas da mais valia. Palavras de Darwin: “Não são os mais fortes, e quem é forte por natureza nessa sociedade? São fortes providos por aquilo que lhes concede as condições materiais em que vivem e através da difusão dos meios que controlam para espalhar sua cultura de dominador. Tentam evoluir à medida que buscam minar a luta de classes, porém não o conseguem, por se tratarem de uma lei mais naturalmente observável do que todas. Se lutam para acentuar a exploração, a perseguição, o máximo que alcançam e acentuar as contradições de seu sistema, criam novas ferramentas contra eles mesmo, querem acabar com o conflito entre as classes, criando uma classe única, mas não abolindo-a. Nem o tigre que caça nas savanas quer comer todas as zebras de uma vez, ele sabe que quando acabá-las acaba seu tempo naquele ambiente, por isso eleger uma. O povo tem seu objetivo, fim da classe burguesa. A burguesia quer acabar com o pobre e acabar com as outras burguesias. Lobos de si mesmo. O pintassilgo do bico mais largo sempre busca a melhor minhoca na terra. O do bico curto está fadado a padecer mais cedo. O homem com um pouco mais de recursos tende a viver mais. O homem que abre mão de parte de seus recursos e compartilha suas idéias com o menos afortunados perpetua sua vida e aumenta a dos outros. Como isso pode ser evolutivo? O que há de linear no gesto de solidariedade? Onde estão fortes a fracos bem marcados? Spencer me deve algumas explicações. Ah esses dois baixinhos...preciso de um autografo deles. Esses sim são fortes.”

Agora vamos partir em busca dos elos perdidos de Maradona e Romário.

  

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

A Pá de Cal Iluminista

Por  Paulo Teodoro da Silva


Vivemos um momento particularmente difícil. Em meio a muita bobagem, especialistas de última hora, de sociólogo a ex-militar, passando até por "celebridades", naquilo que, de resto,  exige  apreensão, codificação e domínio da complexidade urbana.
 
Mas, o assunto deste blog é o futebol, notadamente o futebol carioca (agradeço ao Máximo a concessão para falar de um futebol carioca menor, não ampliado como é o Flamengo) . 

A maior parte ainda não era sequer nascida, sem condições, portanto,  de compreender a importância, o significado dialético do futebol carioca. Havia sempre um resto  de tese na antítese que opunham ao Flamengo:  80. Em seguida, a negação. 82. 83. Uma negação um pouco mais longa. 87. Novamente a negação relativamente espaçada. 92. E aí o que se sabe até o ano passado: 2009. 

E o que temos hoje não passa de um anacronismo tricolor. Um arremedo desatualizado de pretensões elitistas. 

Comparem.

Quanta estupidez produzida. Parece a programação da globonews, com aqueles neófitos de óculos coloridos, que acabaram de inventar a roda e foram ao jardim botânico pra contar.

2010 é a pá de cal sempre renovada no iluminismo. Do que mais se necessita para demonstrar que não há na história nenhuma lei do progresso? Indispensável notar como a vida não segue nenhuma linha reta evolutiva, em que o próximo passo será superior ao anterior.  Se alguma lei há na história, certamente é dialética, a vida cheia de contradições e problemas, sem qualquer garantia para o que virá. A depender da correlação de forças a síntese poderá resultar tanto em algo melhor, quanto pior. 

A vida é Rubro-Negra. No ano passado, campeões, neste ano, batendo na trave do rebaixamento e contando com caipiras pra alcançarmos a sul-americana. Este ano uma sucessão de problemas envolvendo até o impensável, quando o mito se humaniza e o Zico chega, fica pouco tempo e tem de se afastar. 

2010 foi a negação da tese, no esforço empreendido pelo resto do Rio, expressão muito conveniente usada não sei se pelo Máximo ou pelo 28. Amarelos no primeiro semestre, empesteando o Rio, e a fauna comprometida, em desalinho ecológico tangida pelos grunhidos que foram arrumar lá na roça do tietê.

Repito a pergunta pra concluir: do que mais se necessita, ao fim deste ano, para demonstrar que não há na história qualquer lei de progresso?

SRN

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Aos que lutaram por um Brasil livre






 


DIREITO À MEMÓRIA E À VERDADE

A Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, em parceria com o Clube de Regatas do Flamengo, o Centro Acadêmico Stuart Angel e a Agência Livre para Informação, Cidadania e Educação, convida para a inauguração do memorial 'Pessoas Imprescindíveis' em homenagem a Stuart Angel Jones, morto pela ditadura que dominou o País durante vinte e um anos. Este trabalho faz parte do Projeto 'Direito à Memória e à Verdade', um resgate da história recente do País. O evento contará com a presença do ministro Paulo Vannuchi.

9 DE DEZEMBRO DE 2010

ÀS 11 HORAS

CLUBE DE REGATAS DO FLAMENGO

Av. Borges de Medeiros, 997 , Lagoa - RJ

sábado, 4 de dezembro de 2010

A Cristaleira do Correa

 Postagem antiga, da época em que contratamos o Correa. Por que o Luxemburgo não aproveita o tumulto de ontem e chama o bombeiro para levá-lo embora, como fez a mãe do meu amigo gago?

SRN
Máximo


A Cristaleira do Correa

Tenho um velho amigo gago. Dessas figuras folclóricas, à espera de um registro. Popular e prestativo, da rua ao quarteirão logo ao bairro, praticamente.

Talvez eu seja o primeiro. E a oportunidade do registro não poderia ser mais oportuna.


O Correa, contratado pelo Flamengo, eu já conhecia, mas não como volante.


Contou esse meu amigo que, ruim agora, sua gagueira era bem pior quando pequeno. Pelo que entendi, pois nessas horas é mais fácil pra ele representar, tornar graficamente visível a cena: pega minha caneta nanquim, coloca no canto da boca, torce o nariz, pega um copo, enche d'água. Olha prum lado, pro outro e parece que o tanque é útil, nele derrama um pouco da água e volta trocando os pernas, sacudindo o corpo:


"Eeeeenn...enteeen...deu, Mámámá...Máxi...?"


Entendi, o cara era macumbeiro.


Ainda meio sonolento, o barulho na sala chegando até o quarto, mas já estava acostumado e sabia que naquele dia o pessoal da Fábrica Confiança, onde sua mãe trabalhava, vinha pro descarrego. Então, a baforada do charuto fora suficiente. O pai de santo, devidamente arriado, suponho (nessa parte, meu amigo dobra-se todo, ainda mais ininteligível) abre o porta do quarto, seguido pela sua mãe, e aproxima-se da cama. Faz o "pela cruz", bafora ali, bafora aqui:


"Tá carregado esse meu filho."


Essa parte é mais uma recriação, pois eu não entendia nada do que o meu amigo falava.


"Fiquei bom, nanana... hoora, Máma...ximo."


Aí tentou repetir o que começara a falar e nisso, em consideração, bateu quase 4 da manhã. Tentando encurtar a conversa:


"Maravilha, meu irmão, fica pra próxima."


"Tu naaauuumm qué sasaa...ber o resto?"


"Tá tranquilo, vai lá."


O pai de santo também se chamava Correa e prestava serviços pra todo mundo na fábrica. Até na sala do pai do Braguinha, que fora diretor da Fábrica Confiança, o Correa entrava e, assim como quem não quer nada, abria a sua marafa e dava sua baforada.


Não cobrava nada, mas não fazia muita diferença. Corrrea era glutão e a garantia do "trabalho" era dada mediante o "caboclo comer e beber do bom e do melhor".


Em Vila Isabel, muito português, dono de açougue, fechou a semana graças à voracidade do caboclo do Correa.


Naquele dia, entretanto, Correa excedeu-se.


Certo, "meu camarada", como diria o 28, convenhamos que só quem conheça a gagueira desse meu amigo avalie do trabalho do caboclo, cansando e, provavelmente, levando à exaustão: Correia, após meu amigo emitir impecável, "três tigres tristes", sacudiu o corpo de uma tal maneira que a força que o caboclo fez pra subir acabou jogando-o pela janela, vindo a cair em cima dos vasos de antúrio e "comigo ninguém pode" que a Mãe desse meu amigo cultivava na porta da casa de vila.


Correa comeu e bebeu, novamente bebeu e comeu e, antes de sair, resolveu evocar o caboclo, pois a Mãe desse meu amigo caprichara e Correa, pelo jeito, queria deixar tudo certo pra poder voltar:


"Madame, mi si fio, só pra fechar..."


E saiu pela casa, baforando. Caboclo inglês, meticuloso, resolveu passar em baixo de uma cristaleira que ficava a um canto da sala.


"Só pra confirmar..."


Correa acabou entalado e tiveram que chamar o bombeiro.


Gosto muito desse meu amigo, mas já estava muito tarde. Não soube se o caboclo chegou a ser resgatado junto com o Correa.

SRN

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

O Flamengo é Arte Política

Passar em frente ao quartel da PE, vindo da Barão de Mesquita, pra entrar na Gonzaga, é um trecho que não me agrada. Não me entra na cabeça a covardia, a possibilidade de imaginar alguém completamente imobilizado, pendurado no pau-de-arara, levando choque nos culhões. A história que precisa sempre ser contada. 

Outra história  que lamento ter de contar: descendo a Gonzaga, pouco antes de entrar na casa, já escuto o latido do Maradona, fila que o 28 trouxe de Saquarema. Dizia que também bebia, quando o 28 também bebia e que não parou, mesmo após 28 ter parado. Havia no latido do Maradona uma nota Ramones. De fato: a porta aberta, alguns manuscritos espalhados em torno da muleta caída sobre as costas do 28. Felizmente, foi só um susto. 28 ainda está internado no Hospital da Lagoa, mas passa bem. Acabei de falar com sua filha, a quem disse que iria fazer uma compilação, aproveitando o título do que provavelmente seria uma postagem,  para a postagem de hoje.

SRN
Máximo


O Flamengo é Arte Política

Por 28

O futebol é um fenômeno urbano exatamente como o capital. A circulação que lhes dá densidade encontra no populismo a conveniente expressão política. O futebol fornece a emoção que liga diretamente às massas. Renova a estrutura, mitigando o capital. A prosseguir no argumento a conclusão parece inescapável: o futebol é um instrumento de alienação. 

(Aprofundar leitura da primeira teoria do populismo: massa objeto. Adiante, a revisão crítica, a segunda teoria, massa como sujeito.)

Outra dimensão de análise é a estética. Golbery dizia que política é arte, porque exige apoio. A arte mobiliza a emoção, criando identidade e estabelecendo compromisso. A adesão ao futebol é uma das mais genuínas manifestações estéticas. Uma das formas mais prazerosas o  gosto popular pela bola. 

(Não esquecer de anotar tudo, qualquer ponto, até reticências. Reticências é o cacete. Reticências é pra quem não diz. E não me esconderei nessa memória muquirana, traíra.)

O historicismo relaciona-se ao acontecimento, opondo particularismo ao universal iluminista. O indivíduo é o eixo em torno do qual gira o mundo.

A história estrutural acaba com os heróis e se desloca para o materialismo.

O romantismo marxista talvez seja a melhor Nova História. Com Thompson, a valorização dos novos objetos está na imaginação, no sentimento que humaniza a estrutura, capta-lhe o específico (o afeto familiar do camponês, o prazer com a habilidade do artesão - atributos pré-industriais não como anacronismo de tradições superadas, mas como crítica ao pragmatismo racional utilitarista), a sincronia na diacronia, renovando a dialética, a unidade na adversidade.

No romantismo marxista de Thompson, a raiz emocional da razão é a sincronia na diacronia.

Penso que o importante, quando, sobre Liminha, Merica e Dendê afirmam-se Zico, Júnior e Adílio, temos o nosso correspondente muggletoniano.

A síntese marxista não é apenas racional, mas também emocional. 

O historicismo, ao contrário, é um estímulo ao panegírico. A vida segue linear e causal. "Querer é poder' só serve de título de livro do Lair Ribeiro. Porque não há dialética. As demandas e contradições da realidade não contam. Porque não vendem.

É preferível a história mítica, a narrativa dialética do herói (Herói Rubro-negro, por que não? No trem, no ônibus, na Avenida Brasil, no inferno da bala oficial, da bala pútrida ): exclusão, provação, redenção. Ao redimir, o Herói Rubro-negro torna-se social, na redenção coletiva de uma nova realidade. 

É o tal negócio.

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Sem Rancor



Por Pablo Faria

Para começar bem e para mantermos as boas, uma reflexão de Mãe Clementina:

Na hora da Sede

Na hora da sede
Você pensa em mim
Lá,laiá
Pois eu sou o seu copo d'água
Sou eu quem mato a sua sede
E dou alívio à sua mágoa
Na hora da sede você pensa em mim

Na hora da sede
Você pensa em mim
Lá,laiá
Pois eu sou o seu copo d'água
Sou eu quem mato a sua sede
E dou alívio à sua mágoa
É sempre assim
Você foge de mim
Eh, pra você eu só sirvo de água
Mas se a fonte secar você se acaba
Lá, laiá
Você vai, você vem
Você não me larga
Lá, laiá
Mas se a fonte secar você se acaba
Lá, laiá
Você vai, você vem
Você não me larga
Lá, laiá
Na hora da sede
Você pensa em mim
Lá,laiá
Pois eu sou o seu copo d'água
Sou eu quem mato a sua sede
E dou alívio à sua mágoa
Na hora da sede...
É sempre assim...

Clementina de Jesus

Felizmente, acabou! Vamos pensar daqui para frente? Sem brigas, sem remorsos, sabemos, bem lá no fundo, que tudo termina um dia. O fim é certo, interessa saber a forma: acho que vamos terminar felizes. Foram anos de companheirismo, amizade, amor, dedicação exclusiva do tipo de funcionário público, mas, sem ou com todas as explicações do mundo, degringolou. Tivemos ótimos momentos juntos, você era meu bálsamo nos momentos ruins e eu era seu bastião quando as coisas apertavam. Na verdade, era uma troca onde os pesos e as medidas eram iguais, portanto vamos fazer o seguinte: fiquemos ambos na memória e, ao fim e ao cabo, vida que segue. Combinado?
Dessa forma, adeus 2010, adeus Lomba, adeus Juan, adeus Leo Moura, adeus Angelim, adeus Renato Ex-Canhão da Gávea, adeus Kleberson, adeus Diogo, adeus Val Baiano. Porém, um desses adeus não é adeus, é desejo que fique para sempre no Flamengo, Maravilhoso e Mais Querido, para sempre. Caso não fique materialmente, ficará eternamente para todos aqueles que vestem com orgulho o vermelho e preto encarnado por tudo que fez e por jogar como homem sempre: adeus, Petkovic.

Stalingrado Rubro-Negro


Por Renato Lopes

Para o Clube de Regatas do Flamengo um ano para não se esquecer. Não pelas glórias, mas pelas inglórias. Não pelas marcas que deixamos, mas pelas marcas deixadas na Nação. Não pelas vitórias, mas pelas derrotas, dentro e fora de campo e nos bastidores, que levaram até mesmo nosso maior ídolo e entregar as pontas.

Muitos Rubro – Negros querem esquecer esse ano, não tiro sua razão, não vamos lembrar dele como o mais vitorioso de nossa história. Mas vamos lembrar dele toda vez em que formos exigir alguma coisa dos nossos dirigentes, quando fomos torcer, quando votarmos. Não tiro a razão de Zico quando disse, com todas as letras “o título de 2009 fez muito mau ao Flamengo”. Nos acomodamos, não colocamos a rédea curta em nossos potenciais craques, em troca de suas excelentes jogadas deixamos que se excedessem fora de campo, cujos resultados refletiram em campo. Deixamos que os outros se sentissem vencedores em nossa derrota. Generalizaram de uma forma digna de jornais udenistas - elitistas.  Clamaram por uma UPP na Gávea. E quer saber, precisávamos de uma sim. Tem muita gente ali que não honra o Nosso Nome, e precisava ir parar atrás das grades.

Nossa Nação viveu seu Stalingrado ao contrário. Padecemos em nosso próprio solo, como se não bastasse sentir a tormenta em nosso próprio campo. Não tivemos a altivez de um Exército Vermelho. Não nos inspiramos em nos congêneres Partisans que imprimiram derrotas vergonhas aos Nazistas, esquecemos nossa veia de Raça, não no sentido étnico segregacionista, e sim como a força que nos move. Nos deixamos calar. Infelizmente

Não tivemos um inverno, tivemos uma tormenta de calor. Nosso Stalingrado foi quente como o inferno. Não houve camaradagem, não houve apoio. Não houve um Vassili Zaitsev (franco atirador, herói russo da segunda guerra mundial). Mas houveram vários contra nós.
Onde já fizemos muitos padecerem...cavamos nossa cava, rasa, a pior de todas, onde nos últimos meses nos reviraram, enterraram e deixaram o cadáver em putrefação a mostra.

Será que esse Urubu vai fazer as vezes da fênix e renascer das cinzas? Torcemos para que sim. Não tenho mais palavras para falar, por isso vou usar um trecho de verso da história em quadrinhos V de Vingança, para não esquecermos.
   
“Lembrai, lembrai, lembrai
[...]
Da pólvora e do ardil
Quem poderia perpetrar
Uma traição tão vil”