quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Chorumela recidiva ou "quero meu dinheiro"

Por 28

Vê lá, Máximo, faz alguma coisa de útil nesse teu curso e aproveita pra sugerir lá no nono andar da UERJ, ao núcleo de pesquisas sobre o futebol, uma disciplina que poderia muito bem se chamar "História do Resto". A princípio, pensei em "História dos Pequenos", mas percebi que isso poderia criar problemas, aumentando ainda mais os complexos clássicos dos de segunda, amarelos e da bambilândia. Resto, embora aparentemente depreciativo, parte de uma verificação realista, com base no que efetivamente sobra quando não se é efetiva e majoritariamente carioca. O que estou dizendo, meu irmão, é que, na impossibilidade defeituosa de não se torcer pelo Flamengo, é melhor ser resto do que pequeno, pois sempre há alternativa de consertar o erro e integrar-se à grandeza.

Repare como a realidade é inquestionável e deve ser mesmo a referência. A vocação para o complexo apareceu ontem novamente entre os amarelos. Agora a culpa é do Caio, um moleque de 19 anos, agora é o culpado pelo chororô de ontem, chororô de anteontem, chororô velho desde quando ele ainda nem sequer era projeto. Quantos anos, lembra-se? Acho que mais de 20 entre um título ao final da década de sessenta e aquele comprado pelo bicheiro no gol roubado pelo empurrão no Leonardo, em 89, contra o Flamengo. O goleiro era o Gigante, lá do Maxwell, lembra-se?

E os da bambilândia que precisam recorrer à História, se quiserem saber o que significa um título de expressão? A memória não se sustenta, porque necessita repetição, experiência impossível pra quem só conseguiu um título antigo, tão antigo quanto o esquecimento. Até já me esqueci, quando foi mesmo o título brasileiro da fauna laranjeira?


Deve ser uma emoção indescritível, inédita, viver o que estão vivendo hoje. Não é à toa que o patrocinador da fauna em que circula o resto é um plano de saúde. O que tem nela de problemas cardíacos pela emoção de ficar em primeiro lugar aumentou muito as vendas de plano de saúde. Cuidado só pro conca não repetir o romerito, que vivia cobrando o calote que havia levado, sempre dizendo:


"Quero o meu dinheiro!"


SRN

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Jornada de lutas na Europa (podiam aproveitar e chamar o Jean, o Correa e o Silas)

Perguntaram uma vez a Niemeyer, naquele espírito conveniente do politicamente correto:

"E aí, mestre, como vai a maturidade, a experiência?"

"Não fode. A idade é uma merda."

De fato, meu irmão.

Não calcule quando a cabeça insiste no anacronismo e o corpo, pra mostrar que não está de sacanagem, apresenta as pontas dos dedos dos pés pretos porque se resolveu jogar bola com um tênis improvisado. E o pior é que a cabeça, beirando a esquizofrenia, ainda insiste em olhar pros pés e ver aquele moleque que jogava descalço e o Velho, à noite, esquentar a agulha, passar a linha, furar os calos, filtrando o sangue como num dreno.

É que ao saber da mobilização na Europa me dá a sensação de que a idade é mesmo o que diz o grande artista.

Torço para que esforços pelo coletivo acertem a mercadoria, cada vez mais metabolizada. Os deslocamentos que o capital provoca são muito dinâmicos e, em sua fase atual de consumo da imagem, a acumulação tornou-se flexível, precarizando o trabalho. O fetiche da imagem seduz, mas o acesso é pra poucos, mas, é justo nesse dilema, que não é pra ser resolvido, que está todo o poder da mercadoria fetichizada em imagem. Há mesmo uma realidade em que parte do trabalho já é desnecessária. Nessas condições fragmentárias, dispersas, "pós-modernas", será que funciona uma mobilização nos termos do capitalismo industrial, já superado pela sociedade de consumo?

Será que o futebol virou lugar só de Jeans, Correas e Silas? De gol na roça só no final e , ainda por cima, de um Deivid?

É, meu irmão, ainda bem que tem um ferro-velho aqui perto.

SRN

terça-feira, 28 de setembro de 2010

No caminho da roça

Dá pra carregar?

Jean

Correa

Silas

O azar do Goiás é que o padre é mineiro

Por 28

"O momento individual não importa se o coletivo não vai bem. Fiz dois gols nos últimos jogos, mas a equipe não venceu e é isso o que mais importa para mim: que o time se saia bem, vença as partidas e suba na tabela".

Copiei o que o gringo disse lá do sítio oficial do Flamengo. A terceira idade serve pra tornar o que sempre foi de excelência consciência e refinamento como contrapartida à perda da disposição física. Essa a diferença do nosso gringo para os demais estrangeiros. Da roça do tietê, eles chegam em lombos de burro, de porco, só pra aporrinhar. Mas, isso é de se esperar, diferente de perder tempo lá na roça da grande são paulo hoje. É voltar com os três pontos.

É o tal negócio, Máximo: a concessão que ainda é possível ao resto carioca leva ao sacrifício do senso de humor quando o caminhão frigorífico chega no Rio, encosta aqui perto e descarrega a mercadoria.

Teu pai tinha açougue ali na Silva Pinto, em Vila Isabel, tá lembrado? Lembra como chegavam aquelas "peças" (não era assim que o Velho se referia à carne de porco, boi, de vaca, galinha, o que fosse?)?

O futebol é a prova de que a roça ainda pode deixar de ser paulista. Luxemburgo não arrumava nada em Campo Grande e teve de ir lá pro interior de uma bragança dessas pra poder andar de armani. Foi lá bancar o artista do padre da piada:

Chega um camarada na roça do tietê, sem dinheiro, diz que é artista, com passagem pelo Rio, é bem tratado, dão-lhe casa, comida, roupa lavada, vai sair fora, quando chega o cbn esporte clube. O camarada não tem como fugir, mas, caipira não trabalha tarde na rádio à toa, quer mostrar serviço, a sociedade de espetáculo afinal também chegou até ali. Arrumam um cenário na igreja, na praça do arraial, chitãozinho, chororós, olivettos, kfouris, miltons - todos reunidos pra vê-lo pintar ou então apresentar uma de suas obras-primas. E aí?

"Minha obra é de uma tal grandeza, que só quem tem uma mãe pura poderá vê-la."

O camarada tira a toalha que cobria a tela que trouxera.

Os mais extasiados falam, descrevem à luz do referencial olivetto a estética do nada.

O resto, de resto, como cabe a chitãozinhos, xororós, etc.

Só o padre, que era mineiro, se levanta e diz:

"É, meus filhos, o único filho da puta aqui sou eu mesmo."

SRN

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Pós-Modernidade Rubro-Negra

Companheiro da mesma geração, adolescente nos anos 70, e velho parceiro daquelas peladas descalços na rua, 28 tem intimidade, e sobretudo razão, pra me observar a limitação intelectual.

Concordo que ainda não compreendo direito esse papo de pós-modernidade. E é obtusidade, de fato, pois tenho lido com acuidade Fredric Jameson, Terry Eagleton e o grande E. P. Thompson (recomendação, aliás, de Maxwell Gonzaga, que, de quando em quando, manda alguma coisa).

Tanta leitura que já deveria ter aprendido que Val Baiano, Deivid, Correa e o Jean são a diluição da arte da bola nas condições de produção da mercadoria futebol.

Fazer, como volta e meia faço, citações, estabelecer, como sempre faço, ilações, são um equívoco, além de uma falta de respeito com a memória dos mortos. Evocar Drummond, ainda que para acompanhá-lo de Raul, leandro, Marinho, Mozer, enfim, não obedece sequer a linha branca, do tipo do que se despacha no lar do Prado, junto com o caboclo lp 45 da roça do tietê.

O que dá alívio é que, em meio ao que não entendo, palavras enfileiradas diante de um muro burro, há uma boa citação de auxílio, do historiador Pierre Nora:

"O fato que só exista uma palavra em francês para designar a história vivida e a operação intelectual que a torna inteligível ( o que os alemães distinguem por gerschichte e historie ) torna-se aqui sua profunda verdade: o movimento que nos transporta é da mesma natureza que aquele que o representa para nós. A memória é um fenômeno sempre atual, um elo vivido no eterno presente: a história, uma representação do passado."

Isso dá pra ver. Basta comparar com o resto. Rubro-Negros somos a vida que segue, com as lembranças que permanecem, revisitadas, às vezes inconscientes, surpreendendo.

Já a história é o que se necessita pesquisar a respeito, pois que só restaram indícios, a exemplo do resto carioca, cujos títulos de significação, quando não únicos, imemoriais, também já perderam sua estrutura de continuidade, em novas gerações de infelizes que não tiveram a oportunidade de ser Flamengo.

Talvez seja a memória de títulos Rubro-Negros que insiste em se atualizar que me impeça a compreensão correta e, somada a uma inteligência apenas razoável, pragmática, resista incólume à pós-modernidade que combina Val Baiano e um Jorginho de Macedo paulista.

SRN





domingo, 26 de setembro de 2010

Camões ou receita de bolo?

Era assim, com poemas de Camões ou com receitas de bolo, estampados na primeira página, que o antigo JB protestava contra a censura e a ditadura militar.

Os tempos são outros - o que faz toda a diferença.

Hoje é possível cuidar da vida, do Flamengo. Mas, como estou sem paciência pra procurar Camões na internet nem nunca soube sequer fazer café em cafeteira elétrica, o que dizer do Flamengo?

O que se viu ontem era um bando.

SRN

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Rubro-Negro sem paciência pra Disney

O MARXISMO HOJE: ENTREVISTA COM ISTVÁN MÉSZÁROS

/www.unicamp.br/cemarx/criticamarxista/

Tradução: João Roberto Martins Filho

Esta entrevista é uma versão elaborada a partir daquela publicada em
Monthly Review (voI. 44, nº 11, abril de 1993) e que, inicialmente e na
íntegra, apareceu em Radical Philosophy (nº 62, outono de 1992), sob a
condução de Chris Arthur e Joseph McCarney. István Mészáros é um
conhecido filósofo húngaro que colaborou diretamente com Lukács, junto
à Universidade de Budapest, nos anos que antecederam à intervenção
soviética na Hungria, em 1956. Posteriormente, radicou-se na Inglaterra,
junto à Universidade de Sussex, onde aposentou-se recentemente. Sua
produção é vasta e significativa, onde destacam-se Marx's theory of
alienation (1970), publicada em diversos países (no Brasil, Rio de Janeiro,
pela Zahar Ed., 1981); Philosophy, ideology and social science (1986, no
Brasil, São Paulo, pela Ed., Ensaio, 1993, dentre vários textos do autor
publicados por esta editora) e The power of ideology (1989), entre tantos
outros trabalhos.
Na edição desta entrevista - cuja publicação em Crítica marxista foi
autorizada pelo autor - optou-se por destacar aquelas partes em que estão
presentes algumas teses que constam de seu novo trabalho Beyond capital:
Towards a theory of transition, que está em via de publicação pela Medin
Press, Londres. Volume que sintetiza praticamente duas décadas de intensa
elaboração intelectual, compreendendo, em sua versão original, mais de
oitocentas páginas, onde são tematizados elementos decisivos do mundo
contemporâneo e que se apresenta como uma das mais instigantes e densas
reflexões no interior do marxismo contemporâneo. A publicação desta
entrevista objetiva oferecer ao leitor brasileiro algumas das teses presentes
em Beyond capital.
(Ricardo Antunes)

Em textos recentes sobre a transformação socialista, o senhor introduziu uma importante distinção entre capital e capitalismo. Poderia explicar essa distinção e seu significado para a luta socialista?

MÉSZÁROS: Bem, na verdade tal distinção remonta ao próprio Marx. Eu
salientei inúmeras vezes que Marx não intitulou sua principal obra O
capitalismo, e sim O capital e também anotei que o subtítulo do volume I
foi mal traduzido, sob a supervisão de Engels, como "o processo de
produção capitalista", quando, de fato, é "o processo de produção do
capital", o que tem um sentido radicalmente diverso. O que importa aqui,
sem dúvida, é que o objetivo, o alvo da transformação socialista é superar o
poder do capital. O capitalismo é um objetivo relativamente fácil nesse
empreendimento, pois você pode, num certo sentido, abolir o capitalismo
por meio do levante revolucionário e da intervenção no plano da política,
pela expropriação do capitalista. Ao fazê-lo, você colocou um fim no
capitalismo, mas nem sequer tocou no poder do capital. O capital não
depende do poder do capitalismo e isso é importante também no sentido de
que o capital precede o capitalismo em milhares de anos. O capital pode
sobreviver ao capitalismo, é de esperar que não por milhares de anos, mas
quando o capitalismo é derrubado numa área limitada, o poder do capital
continua, mesmo que numa forma híbrida.
A União Soviética não era capitalista, nem mesmo capitalista de
Estado. Mas o sistema soviético era bastante dominado pelo poder do
capital: a divisão de trabalho permaneceu intacta, a estrutura hierárquica de
comando do capital subsistiu. O capital é um sistema de comando cujo
modo de funcionamento é orientado para a acumulação, e esta pode ser
assegurada de muitas formas diferentes. Na União Soviética, o trabalho
excedente era extraído de forma política e foi isso o que entrou em crise
nos anos recentes. A extração politicamente regulada de trabalho excedente
tomou-se insustentável por uma variedade de razões. O controle político da
força de trabalho não é o que se poderia considerar uma forma ótima ou
ideal de controlar o processo de trabalho. Sob o capitalismo, no Ocidente, o
que temos é uma extração economicamente regulada de trabalho excedente
e de valor excedente. No sistema soviético isso era feito de um modo
bastante impróprio, quando a ótica é a da produtividade, porque o trabalho
retinha um imenso poder, na forma de atos negativos, desafio, sabotagem,
dupla jornada etc., diante do qual não se podia sequer sonhar em atingir o
tipo de produtividade viável em outros lugares e que minava a raison d’être
desse sistema sob Stalin e seus sucessores - a acumulação politicamente
imposta. Sua parte de acumulação ficou paralisada e, por isso, todo o
sistema entrou em colapso. Publiquei na Itália um longo ensaio, na
primavera de 1982, no qual afirmei explicitamente que, enquanto as antigas
políticas dos EUA para a regressão político-militar do socialismo de tipo
soviético não pareciam passíveis de sucesso, o que estava ocorrendo na
Europa oriental podia levar à restauração do capitalismo. Pela mesma
razão, eu também considerava a idéia de socialismo de mercado uma
contradição nos próprios termos, porque pretenderia, numa concepção
esperançosa, unir as duas modalidades: a extração econômica com a ex-
tração politicamente regulada de trabalho excedente - daí porque seria
sempre um ponto de partida impossível.
É absolutamente crucial reconhecer que o capital é um sistema
metabólico, um sistema metabólico sócio-econômico de controle. Você
pode derrotar o capitalista, mas o sistema fabril permanece, a divisão de
trabalho permanece, nada mudou nas funções metabólicas da sociedade.
Com efeito, cedo ou tarde, você perceberá a necessidade de reatribuir essas
formas de controle a personalidades, e é assim que a burocracia tem
origem. A burocracia é uma função dessa estrutura de comando sob as
circunstâncias alteradas onde, na ausência do capitalista privado, você tem
que achar um equivalente para esse controle. Considero essa conclusão
muito importante, porque com muita freqüência a noção de burocracia é
apresentada como uma espécie de quadro explanatório mítico, quando não
explica nada. A própria burocracia precisa de explicação. Como surge essa
burocracia? Quando você a utiliza como uma espécie de deus ex machina
que tudo explica em termos de burocracia, se você se livrar dela então tudo
estará resolvido. Mas você não se livra da burocracia, a menos que ataque
os alicerces sócio-econômicos e vislumbre um modo alternativo de regular
o processo metabólico da sociedade, de tal forma que o poder do capital
seja, de início, limitado para, ao final, ser certamente eliminado. O capital
éuma força controladora, você não pode controlar o capital, você somente
pode se livrar dele por meio da transformação de todo o complexo de
relações metabólicas da sociedade - é impossível enganá-lo. Ou ele o
controla ou você se livra dele, não há solução intermediária, e é por isso
que a idéia de socialismo de mercado não poderia concebivelmente
funcionar, desde o princípio. O que realmente se necessita não é a
restauração do mercado capitalista, sob o apelido de um mercado social
totalmente fictício, mas a adoção de um sistema adequado de incentivos.
Não há sistema de produção social que possa funcionar sem eles - e com
que pessoas devemos relacioná-los? Não entidades coletivas abstratas, mas
indivíduos. Se as pessoas como indivíduos não estão interessadas, não se
envolvem com o processo de produção, com a regulação do processo
metabólico social, então, cedo ou tarde, elas assumem uma atitude negativa
ou mesmo ativamente hostil diante dele.

Estamos falando de incentivos materiais?

MÉSZÁROS: Ambas as coisas. A oposição entre incentivo moral e
material é, com freqüência, bastante retórica e abstrata, pois se o resultado
dessa intervenção e participação nos processos sociais é uma melhor
produção, uma produtividade crescente, a ativação das potencial idades dos
indivíduos envolvidos, então ela se toma um incentivo material. Mas na
medida em que eles controlam seus próprios processos de vida, é também
um incentivo moral: os dois devem caminhar juntos. Os incentivos mate-
riais e morais devem andar lado a lado. É uma questão de controle dos
processos desse sistema sócio-econômico no qual a ativação do potencial
reprimido das pessoas é também um incentivo. Em nossa sociedade, os
incentivos materiais tal como nos são apresentados sempre colocam as
pessoas umas contra as outras. É possível ver isso por toda a parte, em toda
profissão, no ensino, na universidade, em qualquer canto da vida: os
incentivos operam na presunção de que podemos dividir as pessoas para
melhor controlá-las; eis o processo inteiro. Agora, se você reverte essa
relação e diz que as pessoas têm o controle daquilo em que estão envolvidas,
então a divisão não mais opera, pois elas deixam de ser os sujeitos
sofredores neste tipo de sistema. Portanto, os incentivos materiais e morais
podem ser também de caráter igualitário. Esta é a tragédia do
desenvolvimento de tipo soviético. Quando se fala de colapso do
socialismo para se referir a isso, trata-se de u.ma grotesca deturpação dos
fatos, porque o socialismo sequer foi iniciado, não foram dados nem os
primeiros passos na direção de uma transformação socialista, cujo alvo
somente pode ser a derrubada do poder do capital e a superação da divisão
social do trabalho, a derrubada do poder do Estado, que é também uma
estrutura de comando para a regulação da vida das pessoas a partir do alto.

O senhor fala em desafiar o capital e me pergunto se poderia dizer um pouco mais sobre as implicações práticas, as implicações para a luta socialista, de sua distinção entre capital e capitalismo.
MÉSZÁROS: Antes de tudo, a estratégia a considerar tem que ser definida nesses
termos. Os socialistas não podem continuar com a ilusão de que tudo se resume a
abolir o capitalismo privado - porque o problema real permanece. Enfrentamos
realmente uma profunda crise histórica. O processo de expansão do capital,
abrangendo o próprio globo, foi mais ou menos realizado. O que presenciamos
nas últimas décadas foi a crise estrutural do capital. Eu sempre defendi
que há uma grande diferença da época em que Marx falava da crise como algo que
se desencadeia na forma de grandes tempestades. Hoje ela não tem que assumir
essa forma. O que caracteriza a crise de nosso tempo são as precipitações de
variada intensidade, tendentes a um continuum depressivo. Recentemente
começamos a falar de uma recessão de mergulho duplo (double dip), logo
falaremos de uma recessão de mergulho triplo. O que estou dizendo é que essa
tendência para um continuum depressivo, em que uma recessão se segue a outra,
não é uma condição que pode ser mantida indefinidamente, porque ao final
ela reativa violentamente as explosivas contradições internas do capital e existem
também certos limites absolutos a considerar nesse aspecto.
É bom lembrar que estou falando da crise estrutural do capital, que é um
problema tão sério quanto a crise do capitalismo, pois uma forma de se
livrar da crise do capitalismo, em princípio, era a regulação estatal da
economia - e, em alguns aspectos, no horizonte externo do sistema
capitalista ocidental você pode considerar sua possibilidade. O capitalismo
estatal pode surgir quando o sistema capitalista ocidental enfrenta
problemas profundos, mas eu diria de novo que esta não é uma solução
viável a longo prazo, porque os mesmos tipos de contradições são
reativados, notadamente a contradição entre a extração política e a
econômica do trabalho excedente. E não estou falando de fictícios eventos
futuros. Basta pensar no fascismo, no sistema nazista que tentou esse tipo
de regulação corporativa estatal do sistema, a fim de sair da crise do
capitalismo alemão naquele momento preciso da história. Portanto, o que
estamos considerando aqui é que todas essas formas de deslocar
temporariamente as contradições internas do capital estão se esgotando. O
mundo todo é muito inseguro. A maioria avassaladora da humanidade vive
nas condições mais abomináveis. O que aconteceu com a modernização
desses países? Ela assumiu a forma de roubo, subtração e recusa insensata
em considerar mesmo as implicações para a sobrevivência da humanidade -
o modo como esses territórios e sua população foram tratados -, que tudo
foi completamente solapado, e hoje você tem uma situação na qual
ninguém acredita mais na modernização do chamado "Terceiro Mundo". E
é por isso que esse continuum depressivo é, a longo termo, uma situação
insustentável e, por essa razão, uma transformação social deve ser viável.
Mas não o é por meio da revitalização do capital. Só pode ser efetuada com
base em um afastamento radical da lógica desse insensato e destrutivo
controle orientado para a acumulação.
Essa crise imensa a que me refiro viu não apenas a virtual extinção dos
partidos comunistas, dos partidos da Terceira Internacional, mas também a
extinção dos partidos da Segunda Internacional. Por quase cem anos,
aqueles que acreditavam nas virtudes da reforma e do socialismo
evolucionista falavam da transformação da sociedade que conduz às
relações socialistas da humanidade. Tudo isso foi descartado, mesmo em
termos de seus próprios programas e perspectivas. Vimos recentemente que
os partidos socialistas da Segunda Internacional, e seus vários associados,
sofreram derrotas e reveses avassaladores em cada país particular: na
França, na Itália, na Alemanha, na Bélgica e nos países escandinavos e
agora há pouco também na Inglaterra, a quarta derrota consecutiva do
Partido Trabalhista. Foi bastante apropriado que essa derrota em série, em
todos esses países, coincidisse com a abertura festiva da Euro Disney,
porque o que esses partidos adotaram nesse período histórico, em sua
resposta à crise, foi uma espécie de socialismo Mickey Mouse, e este é
totalmente incapaz de intervir no processo social. Eis por que não é
acidental que esses partidos adotem a sabedoria do capital como sistema
insubstituível. O líder do Partido Trabalhista chegou a declarar que a tarefa
dos socialistas é o melhor gerenciamento do capitalismo. Atualmente essa
espécie de grotesca insensatez é ela mesma uma contradição. É uma
contradição nos próprios termos porque é extremamente presunçoso pensar
que o sistema capitalista funcionaria melhor com um governo trabalhista.
Os problemas continuam a se tomar mais graves e o sistema político é
incapaz de responder, porque opera sob os cada vez mais estritos
constrangimentos do capital. O próprio capital não deixa mais nenhuma
margem de manobra. A margem que antes existia para os movimentos
políticos e as forças parlamentares era incomparavelmente maior no século
XIX ou nas três primeiras décadas do século XX. A Grã Bretanha já é parte
da Europa e não há meio de reverter esse processo, no sentido de que a
pequena Inglaterra será capaz de resolver tais problemas.
Mas isso também levanta imediatamente a questão: como nos
relacionamos com o resto do mundo diante do que aconteceu no Leste, na
União Soviética? Um novo problema fundamental surgiu no horizonte. No
caso da Rússia, li recentemente que, além dos 25 bilhões de dólares
prometidos pelo Ocidente, ela precisará somente este ano de outros 20
bilhões. Onde vamos achar os bilhões de dólares de que a Rússia
necessitará quando o débito americano é ele próprio astronômico? Os
problemas deste mundo estão se tomando tão entrelaçados, tão mesclados
uns com os outros, que não se pode pensar numa solução parcial para eles.
São necessárias mudanças estruturais fundamentais. As duas décadas e
meia de expansão depois da Segunda Guerra Mundial foram seguidas por
um mal-estar cada vez maior, o colapso de estratégias antes acalentadas, o
fim do keynesianismo, o aparecimento do monetarismo etc., e todos eles
levando a nada. Quando pessoas autocomplacentes como John Major
dizem que o socialismo está morto e o capitalismo funciona, devemos
perguntar: o capitalismo funciona para quem e por quanto tempo? Li
recentemente que os diretores da Merrill Lynch receberam, um 16,5
milhões de dólares, outro 14 milhões e outros dez ou quinze deles, 5,5
milhões cada um, como remuneração anual. Funciona muito bem para eles,
mas como funciona para os povos da África, onde você os vê todo dia, na
tela da TV? Ou em vastas áreas da América Latina, ou na Índia, ou no
Paquistão, ou em Bangladesh? Eu poderia continuar enumerando os países
onde falamos de centenas de milhões de pessoas que mal podem
sobreviver.

Em sua visão, o agente da mudança nessa situação, o sujeito revolucionário, é ainda a classe operária?

MÉSZÁROS: Sem dúvida, não pode haver outro. Lembro-me que houve
uma época em que Herbert Marcuse sonhava com novos agentes sociais,
os intelectuais e os marginalizados, mas nenhum deles foi capaz de
implementar a mudança. Os intelectuais podem desempenhar papel im-
- - -
portante na definição de estratégias, mas é impossível que os
marginalizados sejam a força a implementar essa mudança. A única força
capaz de introduzir a mudança e fazê-la funcionar são os produtores da
sociedade, que têm as potencialidades e as energias reprimidas por meio
das quais todos esses problemas e contradições podem ser resolvidos. O
único agente capaz de alterar essa situação: que pode fazer valer sua força,
encontrando satisfação nesse processo, é a classe operária.

E quanto à sua formo. de organização? O senhor pensa que são necessárias novas formas de organização? Há quem diga que o partido político de velho estilo é irrelevante.

MÉSZÁROS: Sim, eu concordaria totalmente com isso. O partido político
de velho estilo está integrado no sistema parlamentar, o qual sobreviveu à
sua relevância histórica. Ele existia bastante antes do aparecimento da
classe operária no horizonte histórico como agência social. A classe
operária teve que se acomodar e se constranger às possibilidades, sejam
quais fossem, que esse quadro fornecia e, conseqüentemente, podia
produzir apenas organizações defensivas. Todas as organizações da classe
operária historicamente constituídas sendo os partidos políticos e os
sindicatos de trabalhadores as mais importantes - foram organizações
defensivas. Mas elas funcionaram até um certo ponto e é por isso que a
perspectiva do socialismo evolucionista teve sucesso por tantos anos, uma
vez que ganhos parciais podiam ser conquistados. Os padrões de vida
operária dos países do Grupo dos Sete subiram enormemente nesse período.
Quando Marx diz no Manifesto comunista que a classe operária tinha a
perder apenas os seus grilhões, isso certamente não é verdade para a classe
operária dos países do Grupo dos Sete, tanto hoje como há algum tempo.
Eles foram muito bem-sucedidos em melhorar seu padrão de vida por todo
esse período histórico até a última década, aproximadamente. O que
aconteceu na última década ou década e meia foi a conclusão desse
processo, porque o capital não pode mais permitir-se garantir benefícios e
ganhos significativos às classes trabalhadoras. O capital nunca deu nada de
presente. Se isso estivesse afinado com sua própria lógica interna de
expansão, de auto-expansão, então esses ganhos podiam ser fornecidos. Na
verdade, eles se tornaram fatores dinâmicos nesse processo autoexpansionista.
Eis por que estamos na situação em que os serviços de saúde
estão em crise, o sistema educacional está em crise, o sistema de welfare,
em seu conjunto, está em crise. Assim, o fim histórico desse processo
reabre a questão: se a classe operária não pode mais obter ganhos
defensivos, por meio de que estratégias ela pode transformar a sociedade?

O que eu tinha em mente eram mais os partidos extraparlamentares como os bolcheviques de Lenin ou o Partido Comunista Chinês, que foram bem-sucedidos em destruir o capitalismo. Eles estão historicamente superados?

MÉSZÁROS: Sim, completamente. Mesmo eles permaneceram
constrangidos pela perspectiva do parlamentarismo e o próprio Lenin era a
favor de que operassem no quadro parlamentar. Assim, o que constitui
certamente um imenso problema para a agência histórica da transformação
é que o capital é, por definição e de forma bastante efetiva, em seu modo de
agir e funcionar, uma força extraparlamentar. Os sindicatos de
trabalhadores seriam uma força extraparlamentar, mas eles se identificaram
com os partidos reformistas, o que os refreou. Não haverá avanço algum até
que o movimento da classe operária, o movimento socialista, seja
rearticulado de forma a se tomar capaz de ação ofensiva, por meio de suas
instituições apropriadas e de sua força extraparlamentar. O parlamento, se
deve se tomar de algum modo significativo no futuro, deve ser revitalizado
e somente poderá sê-lo se assumir uma força extraparlamentar em
conjunção com o movimento político radical, que também pode ser ativo
através do parlamento.

O que o senhor pensa do estado presente da filosofia marxista?

MÉSZÁROS: Penso que a filosofia marxista em geral encontra-se numa
situação muito difícil, precisamente pelas razões que estamos mencionando,
porque estamos numa crise histórica crucial, a desorientação é a regra do
dia e o que aconteceu no Leste afetou fortemente socialistas e marxistas no
Ocidente, de forma compreensível. Ela tem que passar por um processo de
reavaliação, de busca de ânimo e redefinição de todo tipo de coisas.
Considero muito mais interessante, por exemplo, a situação na América
Latina, o fermento intelectual que ocorre ali é muito mais interessante no
momento do que eu possa apontar aqui. Mas não creio que essa situação
seja permanente e sou o último a sugerir que uma transformação socialista
radical possa vir dessas áreas sozinhas. Com efeito, estou paradoxalmente
convencido de que o futuro do socialismo será decidido nos Estados
Unidos, por mais pessimista que isso possa soar. Tento aludir a isso na
última seção de The power of ideology, em que discuto o problema da
universalidade. Ou o socialismo se afirma universalmente, de forma a
abranger todas essas áreas, incluindo as regiões capitalistas mais avançadas
do globo, ou ele não vencerá.
O mundo é um só. Eu sempre rejeitei a noção de um "Terceiro
Mundo": existe um único mundo. Estou convencido de que uma retomada
do pensamento marxista no futuro também ocorrerá aqui em resposta aos
problemas e demandas da época, especialmente quando foram varridas
algumas das mistificações do passado. Até quando as pessoas poderão ser
enganadas com a idéia de que se esperarem bastante tempo, por meio dos
processos de reforma social-democratas e do socialismo evolucionista, um
dia seus problemas serão resolvidos? Não creio que as pessoas acreditem
nisso hoje e houve bastante evidência nas eleições por toda a Europa de
que essa idéia foi profundamente desacreditada. Quando as expectativas
parlamentares são amargamente contrariadas, as pessoas se movem para a
ação. Tivemos um exemplo muito dramático no passado recente com a
oposição ao Poll Tax* e, por meio desse processo, a derrota de Margaret
Thatcher, antes considerada permanente, imbatível. E agora, depois da
eleição geral britânica, na Escócia as pessoas já falam de ação direta e
mesmo de desobediência civil, a fim de afirmar o que consideram ser seu
interesse legítimo de assegurar seu próprio parlamento ou até sua
independência. Então, é esse o tipo de eventos sociais, de movimentos
sociais, em relação aos quais a filosofia marxista, o pensamento marxista
em geral, pode se redefinir.

Presumivelmente o que precisa acontecer é que os operários nos Estados Unidos formem vínculos e façam causa comum com os trabalhadores no Terceiro Mundo. Mas como podem fazê-lo? Esses trabalhadores vivem, em certa medida, de uma transferência de valor desses mesmos países.
MÉSZÁROS: Este é um dos problemas e é também onde uma crítica de
Marx tem que ser indicada, pois a própria classe operária é fragmentada,
dividida, há muitas contradições. Nos Estados Unidos, nos últimos dez
anos, o padrão de vida da classe trabalhadora decaiu. Assim, estamos
falando de um processo, não falamos de objetos de desejo mas de realidades
que ocorrem em nosso tempo. Em janeiro de 1971, proferi a Conferência
Memorial Isaac Deutscher, "A necessidade do controle social", e aí eu
indicava o início do desemprego estrutural. Mas o desemprego na Grã-
Bretanha da época estava bastante abaixo de um milhão. Hoje, mesmo
depois de 23 falsificações das verdadeiras cifras de desemprego, está
oficialmente em torno de 2,7 milhões. E não há compromisso, nem mesmo
do Partido Trabalhista, de retorno ao pleno emprego. Eis a medida das
mudanças em curso. É uma contradição maciça quando você declara
supérflua uma parcela bastante grande da população. Esta parte da
população não vai permanecer sempre dócil, complacente e resignada às
condições às quais está condenada. Portanto, as coisas estão acontecendo,
estão mudando. Mas essas mudanças terão que se aprofundar e estou
convencido de que o farão.

* Poll Tax: imposto pago por cabeça. (N.T.)

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Anti-Cipaísmo Rubro-Negro

Sem chance gastar vela com defunto barato. Com gaúcho que quer virar paulista quando crescer, então, o negócio é só fazer o registro, no sinal de vida que merece só porque cruzou com o Flamengo: 2 x 2.

O voo de volta, porém, é uma oportunidade para a Nação Maior refletir, sem triunfalismo, mas, longe do provincianismo deslumbrado que, felizmente, sempre passou longe da Gávea, a despeito de todos nossos defeitos. A rota do voo é importante porque faz a diferença justamente entre essas aporrinholas. Aqui a vida inteligente é Rubro-Negra. Não era à toa que o mineiro Darcy Ribeiro, que passava os fins de semana em Maricá, era Flamengo.

Gilberto Vasconcellos é sociólogo e vale ler o que escreveu pra Revista Projeto História / Projeto História, São Paulo, n.36, p. 313-326, jun. 2008:


"O problema é que a soberania nacional foi considerada uma meta impossível de ser atingida. A universidade brasileira, por recalcar o nacionalismo como estratégia de superar o atraso e a miséria, está enferma, por isso colocou no ostracismo Darcy Ribeiro, que é um dos mais importantes cientistas sociais da América Latina. Ele dizia que a confusão teórica (considerar, por exemplo, Leonel Brizola como “populista”) levaria ao equívoco político; afi nal, a meta do nacionalismo trabalhista não era apenas a de melhorar a ordem vigente, e sim a de subvertê-la e transformá-la. O patronato local é o seu principal adversário, vinculado ao latifúndio, fazendo contato com as empresas estrangeiras que superexploram o trabalho. A burguesia brasileira está contente com a tutela do capital estrangeiro. A parte do leão cabe à multinacional fi nanceira, tendo como integrantes menores o capital industrial e os bancos nativos. Estes, sozinhos, não têm condições de imprimir uma política própria ao Estado com um efetivo comando. Não existe, a rigor, um capitalismo fi nanceiro periférico que seja autônomo, assim a fi nança estrangeira ocupa
o Banco Central. Todos os governantes se curvam diante do capital estrangeiro, tido como agente civilizador e fator de progresso, quando, na verdade, é a causa fundamental da existência de massa excedentária, impossibilitada de arrumar emprego e que se situa abaixo da classe operária. Quanto mais desenvolve o pólo multinacional, mais aumenta o pólo de marginalizados e despojados, os quais o brizolismo queria converter em força política, não se limitando ao proletariado.

É, sem dúvida, sintoma do colonialismo interno que o nacionalismo trabalhista tivesse sido derrotado eleitoralmente em São Paulo, que é a sede da indústria recolonizadora sob a égide das multinacionais. Darcy Ribeiro se valeu da categoria “industrialização recolonizadora”8 para explicar o progresso ingeneralizável a toda população. O progresso regido pelos interesses das multinacionais é necessariamente confi nado e excludente, responsável por uma “modernização refl exa”, que é empreendida por pacotes tecnológicos exógenos que reproduzem os fatores do atraso. Segundo Darcy Ribeiro, a modernização refl exa “fez de nós proletários externos de outros povos”. A industrialização recolonizadora, com as multinacionais dentro de casa e sediadas em São Paulo, impõe novas formas de dependência, trazendo “os frutos e não as sementes do saber e da tecnologia”.

Esse saber empacotado, hoje cybernetizado e informatizado, é a fina flor do colonialismo que apresenta o subdesenvolvimento como uma fatalidade. A modernização reflexa – ou o progresso reflexo – é uma faceta do colonialismo interno, teorizado brilhantemente por Rodolfo Stavenhagen10: o colonialismo interno é o imperialismo posto em ação regional. Esse colonialismo interno, sob a égide da industrialização multinacional, engendra uma superestrutura cultural (midiática e universitária) que justifica a existência da metrópole colonial satelitizada pelo sistema capitalista mundial. A metrópole colonial se vangloria, ainda que com um narcisismo também refl exo e mímico, de ser o berço das fábricas multinacionais. Darcy Ribeiro mostrou que a função ideológica do colonialismo interno, representado por São Paulo, é limpar a nódoa espoliativa do imperialismo norteamericano, o qual é a idealizado, edulcorado, convertido em dispositivo fi lantrópico aos olhos da pequena burguesia universitária com suas becas e barretes honoris causa. Para a sociologia cipaia (cipaismo é a defesa do setor economicamente privilegiado estrangeiro), quanto mais São Paulo conectar-se às áreas cêntricas mundiais, tanto melhor é para o bem estar intra-regional. Dessa maneira, o que é bom para São Paulo é bom para o Brasil. De Sarney a Lula, todos os governos têm feição paulistocêntrica. Esse paulistocentrismo cultural é o refl exo da internacionalização do país sob a hegemonia dos estamentos multinacionais, que são coadjuvados pela burguesia industrial e fi nanceira nativas. A anatomia do capitalismo videofi nanceiro revela que o centro econômico do país é São Paulo, enquanto a televisão dominante situa-se no Rio de Janeiro.11 A telenovela produziu o esquecimento do golpe de 64. O ex-diplomata Adriano Benayon, crítico do capitalismo videofi nanceiro e dos intelectuais cipaios porta-vozes do colonialismo interno, formulou o seguinte apotegma: “Nada é mais prejudicial à economia de um país que se juntar ao centro ou ter com ele boas relações”.12

De Montevidéu, exilado pelo golpe de 1964, Darcy Ribeiro enviava o recado para os intelectuais de São Paulo seduzidos pelas pesquisas brasilianistas: o tabu é a questão nacional. 13 O cipaísmo intelectual paulista, que medra tanto nas hostes tucanas quanto nas petistas, considera o sagrado capital estrangeiro como um acelerador do desenvolvimento nacional. Com as multinacionais operando com todas as regalias dentro de casa, sucedeu um fenômeno estranhíssimo na cultura brasileira: o imperialismo norte-americano tornou- se invisível, deixou de ser um incômodo sob a vigência da democracia. O trabalhismo nacionalista foi vencido, assim como se tentou diuturnamente desmoralizar a idéia de que produzimos para promover a prosperidade das metrópoles. Essa situação espoliativa, que nos condena ao atraso e à miséria, deixou de ser o critério para caracterizar a posição política de direita.

Ainda não foi esclarecido o espantoso conformismo intelectual e artístico diante do capital monopolista estrangeiro. Yes, São Paulo, yes, outrora plantou-se banana fruit na América Latina, agora plantamos indústria for export. Com as exceções de praxe, a intelectualidade paulista, tal qual o proletariado das nações opressoras, extrai vantagens materiais do colonialismo interno, portanto difi cilmente aprofunda o conhecimento acerca do signifi cado da internacionalização do país. O intelectual subprivilegiado da metrópole colonial apresenta-se, para usar a linguagem oswaldiana, como o garçom de costeleta no banquete ovíparo da globalização. A tecnologia transferida do país avançado para o país atrasado é o mais recente pacote da ideologia colonialista, tendo por vetor a televisão como aparato técnico que é igual em todo lugar do mundo.

O capitalismo videofi nanceiro hiperbolizou a função ideológica do colonialismo interno na cultura. É por isso que inexiste mímese na qual apareça retratado o estamento das multinacionais. Resulta daí o paradoxo da invisibilidade do que está escancaradamente visível: o domínio exógeno. A incumbência universitária do colonialismo interno é mostrar que a antítese centro/periferia desmanchou-se com a industrialização orientada para a exportação. É que nessa etapa de expansão do capitalismo monopolista nas sociedades subdesenvolvidas a unidade produtiva principal é a corporação estrangeira, que se instala no país receptor visando ao mercado externo. O que triunfou, o que venceu como razão sociológica, repetia o estribilho da campanha eleitoral de FHC, foi o Brasil multinacional em aliança com a oligarquia agrobusiness. Destarte esse poder econômico e cultural consagrou-se pelo voto direto desde Collor, portanto é legítima a democracia dirigida pelas corporações estrangeiras. Assim, poder-se-ia afi rmar que, na fase de exportação de capital, o imperialismo por aqui era algumas vezes objeto de ódio e iracúndia, mas depois que suas fábricas instalaram-se dentro do país tornou-se de casa, ou senão alguma coisa que não atrapalha nossa vidinha cotidiana. Essa é a ideologia dos empresários nativos que se privilegiam ao fi carem sócios menores do capital estrangeiro, abdicando do papel de sujeito autônomo e sem nenhum constrangimento de integrarem uma classe social subalterna e desnacionalizada. Com o espetáculo midiático da democracia, aplaude-se a política antinacional do golpe de 1964 mediante a privatização internacional do território.

A vassalagem desejada é o traço marcante da cultura no Brasil do século XXI. O marxismo e o nacionalismo desaparecem dos currículos das universidades, os intelectuais exibem sem pudor o “discurso dos saciados”14, junto com o cinismo e a resignação acerca da impossibilidade de incorporar a maioria da população ao mercado de trabalho. O que se verifica nesta atitude vassala é sua simetria com o que está ocorrendo com o país, cada vez mais submetido a um de colonialismo cósmico, com a destruição progressiva do Estado."

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Corn Flakes

Ou kellog´s ou macdonald´s. A verdade é que, dentro do alugado dos amarelos, o artificialismo é tão grande, com a bambilândia à frente como maionese embalada, que o empate parece um "bigmac".

Tão fútil quanto a pós-modernidade é essa pasteurização de bambilândia amarela.

Não dá sequer pra continuar. Produz efeito semelhante ao da ingestão de um "bigmac".

SRN

domingo, 19 de setembro de 2010

Diacronia do complexo

Por Saruê

Um dos dois, ou Máximo ou o 28, mas o fato é que não há melhor expressão do que o "resto carioca" para classificar o complexo histórico desses times pequenos. Compreende-se a necessidade, a ansiedade por enfrentar o Flamengo, o medo da consciência do trabalho que na história já se fez e, mesmo, a conclusão.

Não deve ser fácil precisar reunirem-se todos, num domingo, à crença numa esperança de segunda. Os argumentos idiotas revelando uma ignorância que a Nação desconsidera pela irrelevância.

Bambis frágeis, contam aquilo em que não acreditam e vão ao campo dos amarelos sem "camisa porque hoje é contra o Flamengo". Podem ir acompanhados, talvez pelos próprios amarelos, pelos de segunda, pela alienação que é o único meio de se enganarem úteis, na turgidez de mentes atormentadas por complexos, para abstraírem-se e alcançarem-se "ao plano divino e à elaboração espiritual superior". Acreditam - como se vê - em ETs, OVNIs, etc.

O problema do Flamengo foi se contentar em afastar a alienação que dominava o futebol. Era-lhe suficiente, do mesmo modo que em nosso materialismo ainda deixamos, por generosidade, traços idealistas ao não nos recusarmos a disputar com refugos de rebaixamentos mal-resolvidos, cartoladas de "ficha limpa" e supersticiosos que pareciam cucos de parede, daqueles antigos, "regula não regula", "regula não regula".

Daqui a poucas horas iremos ao mundo dos mortos e ressuscitaremos aquele cadáver há três anos insepulto. Com a nossa presença, talvez ganhe uma sobrevida. Mas, francamente, o Flamengo não é banco de sangue. O melhor é Volta Redonda.

Quanto ao jogo, a diacronia da história, pela qual se conhece o objeto, conforme o seu percurso no tempo a fim de ser o que é.

SRN

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Autonomia?




Sou Rubro-Negro desde tempos imemoriais, ainda da nossa Idade Média, de Paulinho, Luis Paulo, Jaime e Liminha (eu o vi completar os 500 jogos com o Manto). Ainda me divirto com a memória de meu fanatismo de moleque/adolescente, o campeonato carioca de 74, o primeiro ao vivo no Maracanã, em cima dos de segunda, mas cujo adversário era mesmo o América, que tinha um timaço e contra quem o Júnior, ainda no começo ocupando a lateral-direita, fez um golaço num chute lá do meio da rua, matando o goleiro Rogério. Foi o ano em que Zico se firmou. Não calculem como é difícil mesmo prum veterano, que cresceu com o Zico como ídolo, e que sabe que na vida real não somos nada especiais, sendo movidos por interesses materiais, objetivos, independente do mito do herói.

Não tenho dúvidas de que o papo de “amor ao clube” só existe pra torcedor, pra mim, pros companheiros que colaboram aqui no Nação Maior, pra toda a massa de 40 milhões de que nos constituímos. Infelizmente, já vivi o suficiente. Impossíveis a ingenuidade e a ilusão quanto à maioria dos que se aproximam do futebol, notadamente em relação àqueles que nunca entraram em campo, talvez nem sequer tenham jogado uma pelada na rua, mas cuja conta bancária é inacessível, confortável que está em Luxemburgo – não a “modelo”, como no humor na veia do grande Urublog, www.globoesporte.globo.com/platb/arthurmuhlenberg/, na definição exata do presepeiro ex-lateral fuleiro, reserva do Monstro Júnior (lembro-me bem: em 75, tiveram de trazer o Júnior às pressas da seleção brasileira amadora pra jogar uma partida decisiva do Carioca, porque "a" modelo sem chance, era uma avenida certa, pista livre).

Por falar no Urublog, foi nele em que vi o tal projeto de “Autonomia do Futebol Rubro-Negro”. Sabemos quanto o futebol é o queijo mais exposto às ratazanas disponível. Indispensável dispor de mais informações, estudar melhor o assunto, conhecer a legislação,ouvir quem a conheça, considerar as implicações. Também sabemos da dicotomia esperta entre a maravilha perfeita do clube-empresa e o pior dos mundos do clube social. Não é razoável que só o clube-empresa possua vantagens e o histórico clube social, responsável por 6 brasileiros, incontáveis cariocas, copas brasil, libertadores, mundial, seja só problema Calculem uma marca como a do Flamengo entregue de mão beijada prum grupo, quailquer grupo, enriquecer à vontade. Temo que as dívidas velhas fiquem com o clube social, o FLAMENGO propriamente, e a marca novinha, saudável, mundialmente famosa, entregue sob a propaganda de uma “modernidade”, de resto, mais do que anacrônica, do que já deveria ter virado sucata desde os sertanejos de goiás às gravatas hermés dos novos-ricos do collor. Sucata tal qual a concepção iluminista de uma história como “mestra da vida”.

SRN

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Bodas de Ouro

Por Álvaro Souza Franco

As bodas eram de ouro. Mais Feio nunca sabe direito, mas não importa. Pequeno-burguês é tudo igual. Como a história do galo. O galo tem um dono; o pequeno-burguês escuta o galo cantar, mas não sabe onde e, perdido, mas querendo fazer parte, se pendura em prestações ansiosas só para saber que ele canta. O endereço do galinheiro era, pois, na Vinte e Oito, uma churrascaria, uma pizzaria, um restaurante, em Vila Isabel. O mesmo lugar em que, alguns anos depois, seria uma boate exclusiva para lésbicas, endereço perto de cuja porta, aliás, quase fizera uma lambança.

A Nossa Senhora de Lourdes se iniciava com a chegada dos “Ramones”. A namorada de Mais Feio chegou logo. O olhar de reprovação pela camisa do Flamengo usada em hora, para ela, inapropriada. Ficar invisível é difícil. Passar suspenso, as carcaças enrugadas, viperinas, gravidades de “ducal”, apertadas na gravata que trava a garganta seca, crianças abortadas, pois não são crianças as que estão amarradas aos bancos por roupas de anão; estão rindo, o padre deve ter dito algumas daquelas graças.

O avô de Mais Feio havia sido jogador de pôquer, grande jogador, e o tio, noivo de Cristo:

“Eu, que já tenho três saias, agora terei a quarta.”

Não conhecera o avô. Sua namorada não para de falar. Também não escuta e martela, martela. Não encontra dificuldade para achar dona Maria, ela e suas cúmplices, ajustando o alvo sobre alguma vítima.

Acaba de chegar ao restaurante, à pizzaria, ou algo parecido; sua namorada, sentada ao seu lado, arranca-lhe das mãos um casal de bonecos que começa a desmontar sobre a mesa. De plástico ou de cera, refletem sem querer o que acontece:

“Mas esses putos são escrotos demais pra perceber.”

Uma mulher mais velha. Acha que lhe deu atenção. Aí, o último fragmento de registro: um cara alterado, vindo na sua direção, sua namorada arrastando-o, tudo escurecendo.

Pedro Ernesto.

“...de vários materiais consistem os detritos que boiam defronte dos olhos e cobrem a Baía, forcejando por asfixiá-la. Pedaços de eucatex, latas de leite condensado, pequenas, latas maiores de azeite e de óleo de cozinha, cascos de cerveja, garrafas de refrigerantes, de vidro, até do uísque que matou Bonham, cujo solo, em “Bonzo’s Montreux”, vai substituindo Hooker na cabeça, à medida que a barca manobra para atracar. Tanta sedução no matiz prateado do azul líquido, quanto na categoria de não apenas tocar com os pulsos, mas ainda beber direito, e bebendo, um dia não mais voltar, por asfixia. A morte, de ambas as quais – tanto a da Baía de Guanabara, quanto a de John Bonham – nada se diga, nada se escreva, sob o risco de pieguismo...”

“O segurança, travando a nossa entrada, na perscrutação do óbvio, encerrou a palhaçada do marinheiro, amigo da mãe do Nylon. Distante poucos anos das bodas. Hoje, entretanto,não mais me aporrinham... o sobrado barato, onde se trepava barato, com qualquer uma das que levantavam a saia ou arriavam a calça, afastando a calcinha, e mijavam agachadas no térreo, na poça de urina com amônia, no corredor aberto para o banheiro do lado de fora.... “

“Quem já era veterano era o marinheiro, que comia a mãe do Cebola e que teve a infeliz idéia da boate, depois de encher os cornos, na calçada do botequim lotado pelo tumulto do mocotó que, segundo ele, lambendo os beiços, cuspindo a farofa com elogios de que não havia nada melhor, toda vez que estava desembarcado no Rio. Eu ainda era mais magro, devia pesar uns sessenta quilos; o cara, além de maior, parecia um muro pixado com uma tatuagem de uma âncora no braço direito. Não havia fumado nada. Só cerveja que tomara com o Cebola, a quem encontrara na Silva Teles, quando eu voltava da casa da minha namorada. Já pancado, o marinheiro, na roda do mocotó, se mostrava um cagador de goma. Bastou nos ver que foi batendo no peito do Cebola:

“A mãe desse moleque sabe disso. Só goza comigo. Por isso é que esse moleque é burro desse jeito.”

“Você é casado, meu irmão?”

O marinheiro não entendeu nada e ficou por instantes me avaliando: se me metia logo a porrada, acabando com a petulância daquele magrela, se não passava recibo, concentrando-se no mocotó e na meia dúzia de cervejas que o dono do botequim trazia em substituição ao velho barreiro.

“Você é casado, meu irmão? – tornei a perguntar.

“ Qual é a tua moleque?”

Achei que o marinheiro não iria aguentar e viria pra dentro. Ainda assim, não resisti e continuei, metendo uma história ocorrida com o meu pai na padaria:

“Tinha um cara que todo dia passava na padaria do meu pai. Comprava duzentos gramas de mortadela, três pães franceses, pedia umas sobras de bolinho de aipim pro cachorro e ficava por lá batendo papo. Então, entrava uma mulher, o cara olhava e, depois que ela saía, dizia pro velho que tinha comido. Entrava a segunda, entrava a terceira, o cara tinha comido. Comeu tanta gente que o velho não segurou a onda e perguntou: e a tua mulher, quem é que come? Não leva a mal. Deu pra notar que, se for casado e apesar de comer muita gente, você tem pouco tempo pra tua mulher.”

A enfermeira pergunta ao Mais Feio alguma coisa. Este não sabe ao certo, parecia que lia a própria cabeça como num livro. Passaram-se quantos anos, até esta sexta de 1996? Aquilo era quando? Que fim levou minha camisa do Flamengo?

“Existe no álcool uma espécie de espírito engarrafado. Quem bebe sabe do que eu estou dizendo e do fio por que fica comentários e situações, que, não atuasse esse espírito, terminariam muitas vezes em conflitos, cascos partidos dentro de carnes flácidas e mármores quebrados e espalhados até no meio da rua. No meu caso seriam ossos, se o marinheiro não se tivesse imposto uma súbita humildade e me apertado num abraço ostentando uma gargalhada de cachaça e mocotó.

“Tu é dos meus, garoto. Tô sabendo duma boate de sapatão ali na Vinte e oito. Vamos nessa.”

Falastrão mais do que valente, meteu o rabo entre as pernas quando o segurança nos barrou à entrada. Resolveu descontar a raiva que sentiu, e que não pode extravasar. Dei sorte, provavelmente protegido pelo espírito da garrafa: ao correr atrás de mim, rodando em torno de um sp2, parado na esquina, o marinheiro escorregou e caiu, oferecendo-me os cornos. Meu sapato de bico fino tinha uma parte mais dura na ponta, àquela época eu ainda usava essas merdas. Tive pena. Ao invés de bicar-lhe os cornos, fui embora pra Torres Homem.”

Tamo junto, companheiro


Por 28

Acabo de ler o que me mandou.

Máximo, tá de sacanagem.

Esse papo de fazer história depois de velho dá nisso, uma linguagem ambígua, atravessada, com medo de não parecer superficial, além de querer agradar.

Meu irmão, é o seguinte: sem chance pra quem leu apenas revista placar e a obra completa de Jorge Amado, fora as entrevistas da playboy (lembra aquela em que junto veio a Maria Zilda? Teu pai, naquela semana, além do teu pé, das peladas descalço da Senador, também teve de furar os calos da tua mão).

Mas, tá tranquilo, estamos juntos, como falam no NA, companheiro, a luta continua e você está mesmo certo em defender os desvalidos, as minorias, o diabo, que agora também anda muito perseguido pela quase maioria crente. Por falar nisso, arrumaram lá pra Gávea um Jorginho paulista. Viu ontem? O cara faz aquelas caretas, fala escondido, mas, pra todo mundo ver, no microfone na lapela, como agente secreto português (foi mal aí pelo Velho, de quem, aliás, eu gostava muito), levanta um dedo, roda os outro cinco, se der um passe certo, a marafa e o alguidar corretos, baixa o caboclo do Lar do Prado, sem precisar do paulista lp 45 que sempre o acompanha. Não faltarão os discursos que muitos insistem sobre o Flamengo. A garra, a raça, a "mística" rubro-negra. Inépcia, apenas. De que adianta a posse de bola, se não se sabe bem o que fazer e se se é uma merda na conclusão. Como parece confuso esse Deivid, quanto atrapalhou os demais metendo-se em jogadas que não lhe eram próprias. "Ansiedade" é sempre a resposta pronta-entrega, junto com a outra, que me dá vontade de zunir o rádio: "a bola não quis entrar".

Está aqui no e-mail: “28 será que daria pra fazer um comentário, com urbanidade, sobre o jogo de ontem. É que tenho de terminar uma ilustração e entregá-la até a hora do almoço. Se se dispuser, faz e me manda, que eu só acesso o computador pra publicar no Nação.”

“Com urbanidade” é uma maravilha. Pelo menos, você ainda publica geral lá no Nação. Da direita à esquerda, tem de tudo, como convém à Grande Nação Rubro-Negra – uma síntese, de fato, do Brasil. Na verdade, somos mais importante do que este Estado que insiste em nos usurpar a soberania. Ou por acaso, mesmo com as tuas palhaçadas politicamente corretas, você acha que nós somos iguais a paulistas, gaúchos e goianos, que é uma versão ainda mais rural da roça do tietê?

E a menina, tranquilo? Também vai fazer vestibular pra UERJ?

SRN

Manso, ainda não é dessa vez


Por Tadeu dos Santos

Dizíamos ainda ontem que os Complexados Chorões, bem como os Assustados Bambis seriam vítimas de seus próprios e históricos receios. Mas como todos sabem, nossas preocupações tem vida própria. Não estão atreladas aos desígnios alheios. Somos Flamengo e temos luz própria. Ao contrário de todos os demais, não necessitamos dos resíduos da luz que brilha no quintal do vizinho. Falemos, pois, do que realmente importa, a saber, do mais querido, do Flamengo. Justificar

Ganhamos e com gol de atacante.

Ato contínuo e já andam a dizer que finalmente logramos encontrar o nosso rumo.

Há, evidentemente, muito entusiasmo na afirmação. Mas faz-se escassa (quase ausente) a verdade.

Ganhamos e não convencemos e o que se viu ontem em campo era tudo, menos um time organizado e equilibrado. Estávamos mais para amontoado, atabalhoados e coisas afins.

À exceção de Angelim e Leonardo Moura, todos os demais jogadores não conseguem nos passar um mínimo de confiança.

Juan se transformou num reles carimbador burocrático. Também no meio futebolístico, a ausência de concorrência implica na péssima prestação de serviço.

Deivid e Diogo possuem o condão de nos remeter ao passado, ao tempo em que produzíamos nossos próprios jogadores. A falta de investimentos nas divisões de base nos transformaram em compradores. E nessa coisa de comprar e vender somos historicamente péssimos e isso, em derradeira análise, apenas e tão somente, demonstra nossa inépcia administrativa. E o longo passar do tempo apenas tem o condão de mostrar que nossa inépcia administrativa é já histórica. É entranhada.

Vinícius Coelho (não jogou ontem, felizmente) me remete ao Djalminha e Marcelinho. Ambos eram jovens e bons jogadores e foram negociados. Não ouso dizer sequer que Vinícius Coelho seja jogador e no entanto ele prossegue incólume na Gávea e ao que me consta logrou renovar recentemente o seu contrato.

Há tempos Petcovich não cobra faltas com precisão. Já faz tempo também que seguer tenta arremates de meia-distância. Sua função, pois, consiste na cobrança de escanteio e enfiada de bolas. Ou não? Convenhamos que isso é muito pouco, quase nada. Ou não?

O gol não redime Toró. É volante antigo. Desarma e, ato contínuo, procura apressadamente alguém a quem passar a bola. Tem um péssimo passe e carrega a bola à moda dos caninos.

Willians não fica atrás. É excelente no desarme e só.

A coisa, porém, não ficaria tão desorganizada não fosse a péssima forma física de Renato e a lentidão de Corrêa.

Não falarei de Silas pelas razões que quase me levaram a não falar de Vinícius Coelho. Este não é jogador de futebol e aquele, com todo o respeito, não é técnico de futebol.

Em suma. A defesa não é confiável, o meio não arma e o ataque não conclui.

Reafirmo que a segunda divisão é buraco de dimensões reduzidas à grandeza do Flamengo, mas como já diz o rubro-nego Jorge Ben Jor, caldo de galinha não faz mal a ninguém.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

De resto, é o resto




Por Tadeu dos Santos

Vemos sempre nesses Animal Planet da vida a eterna corrida do leão atrás da manada de Bambis. Não resistimos e ficamos ali pra assistir ao quanto Darwin tinha razão. Dizemos então a nós mesmo que nossa torcida vai toda pro Bambi. Mas no fundo sabemos que o mesmo será alcançado pelo leão que, ao fim e ao cabo, terá um jantar daqueles. A conclusão inelutável a que se chega é que gostamos de ver o bambi ser derrubado. E que é bela, afinal, a vitória do leão.

Já no Futebol Planet os bambis são dados ao elitismo. Gostam de um tapetão e sempre que obrigados a correr pela relva viram jantar do leão da vez. O da terra da garoa tem fama de bom administrador, mas gosta mesmo é de influenciar arbitragem. E são eficientes. No mais das vezes conseguem.

Já o do Rio é famoso pelas vitórias no tapetão. Num passado nada remoto investiam mais em advogados do que em jogadores. E olhe que a coisa dava certo. Entregam-se a prática de passar um pó-de-arroz e como é comum acontecer aos de sua espécie andam em bando. Acham-se superiores. No entanto, não resistem a uma corridinha na relva e tampouco à força das estatísticas.

Já os chorões não chegarão porque acham que não merecem. Gostam da derrota. Gostam do apequenamento. São coitadinhos a trajar camisa, calção, meião e chuteira. Vivem da piedade alheia. Alguns que até recentemente também viviam da piedade alheia andam por aí a tentar redenção. E o que vemos é a histórica piedade posta a serviço de objetivos inconfessáveis. Mas não tem jeito serão sempre os coitadinhos hollywoodianos.

Nenén-dói dói típico. Vivem das glórias do passado. Comemoraram o último estadual como se estivessem a ganhar a Libertadores, quiçá o campeonato mundial. Aliás, digam-me: eles já ganharam alguma libertadores? Algum campeonato mundial? E os Bambis? Já sentiram o sabor de uma conquista na Libertadores?

Vez mais torcem para que o Mengão, o urubu travestido em leão, caia doente. Uns querem passear sossegadamente pela relva. O outro quer se jactanciar e dizer: vês? Não sou dócil como o bambi, não sou um bebê chorão.

A única certeza de que até o momento dispomos é que com os Bambis e chorões na dianteira, os estádios estarão vazios. Sim. Eles não sabem torcer e não são dotados do salutar hábito de ir ao estádio e se transformar no 12º jogador.

Quanto à mulambada vascaína... falemos de coisas mais relevantes.Ao fim e ao cabo, estarão todos unidos a torcer pela queda do mais querido. A segunda divisão, todos sabem, é buraco pequeno demais. O Flamengo e toda a sua grandeza não cabem em toda a pequenez daquela espaço. Somos os únicos do Rio de Janeiro que jamais respirou o ar rarefeito da segundona. E nada mudará. Chegará o momento em que nos levantaremos. Poremos o bebê chorão pra dormir e os bambizinhos a correr.

Aquietem-se, pois, bambis, chorões, mulambada e crentes "cientistas" emperdenidos.

domingo, 12 de setembro de 2010

A Função Industrial de Kleberson

Por Maxwell Gonzaga

Deixemos para o Máximo, que é melhor desenhista do que universitário, a emoção do que ontem ocorreu em Volta Redonda.

Ocorre que foram dois gols de grande utilidade, a corroborar bem a propósito o que me motiva a colaborar.

Em recente postagem, detive-me sobre E. P. Thompson, importante historiador marxista inglês , falecido em 1993, e que produziu significativa reflexão historiográfica sobre o papel da diversão como um campo de disputa na estratégia de controle do tempo do não-trabalho.

E a conclusão que se revela mais adequada é a sua defesa do grau relevante de autonomia da cultura que, a despeito da forte vinculação, não é estritamente condicionada pelo econômico.

Uma postura coerente, dado ser um crítico feroz do utilitarismo do racionalismo iluminista, que resumia a razão praticamente a um enfoque instrumental.

Atento, evitou reproduzi-lo e, no interior do campo marxista, é o que explica a defesa que faz do improviso e da imaginação, bem como do romantismo da cultura popular inglesa, particularmente na investigação do contra-iluminismo ao final do século XVIII, a importância do papel dos antinomianos, na articulação com a academia, ensejando um tipo de racionalidade muito mais rico - "as raízes emocionais do intelecto" - para além dos estreitos limites da razão instrumental.

Para Thompson, há na cultura uma força intrínseca, capaz de um sentido muito mais profundo do que o mero racionalismo esclarecido. Também não é o absoluto da tese de Marx do povo como sujeito da história, mas a toma por base sobre a qual constrói o próprio e criativo argumento.

Ao estudo do futebol, particularmente o brasileiro, creio ganha uma importância fundamental.

Quando importado da Inglaterra, com função similar de controle, não obtém sucesso na submissão do tempo livre nem na modelagem do comportamento do trabalhador ao ritmo da industrialização nacional.

O futebol não domina mecanicamente a cultura brasileira, mas é apropriado por ela. A destreza corporal, a habilidade com a bola - conforme os estudos brasileiros, notadamente os produzidos pelo Núcleo da UERJ - são, entre outras, especificidades nacionais, muito mais do que construções literárias, narrativas tributárias da clássica história mítica (exclusão, provação e redenção), em face ao disciplinamento que, de fato, se pretendeu.

Ao invés de higienizar, foi o costume nacional quem contaminou o importado inglês, tornando-o brasileiro.

Ademais, não somos de todos destituídos de funcionalidade.

Haja vista o que fez ontem Kleberson.

Graças a Deus.



sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Varnhagen Sentiu o Púbis


Por Ameríndio Sevilha

Como conciliar a construção da identidade nacional, seus mitos e representações, em uma terra de índios e negros, com a orientação iluminista de um projeto civilizatório de progresso branco e europeu?

Uma pergunta cuja resposta pode ser encontrada nas marcas do dezenove, das condições de transformação da produção historiográfica e que encerrava vício, virtudes e limites de um víes romântico que se afirmava.

O lugar brasileiro de construção do discurso historiográfico nacional é exatamente o IHGB, fundado em 1838, tributário ao modelo europeu das academias ilustradas organizadas com base nas relações sociais de cúpula, no evidente elitismo de caráter iluminista. Portanto, a discussão da identidade nacional, na consolidação do Estado Imperial no Brasil, não poderia apresentar-se senão marcado por um elitismo nasciturno, em que o saber se vê sacrificado ao panegírico típico de uma trama de relações de corte, marcadas pelo favor do privilégio. A história aqui produzida gira em torno do Estado Imperial e do que interessa ao âmbito estrito de uma elite letrada cortesã. O recorte enunciado ganha ainda mais nitidez ao se verificar que a ideologia que sustenta o projeto de construção identitária da nação brasileira certamente deve se abster de inconvenientes. A questão nacional – tema candente na Europa – deveria evitar aqui a escravidão e a população indígena, sem embargo aos mitos românticos provenientes da natureza e que cumpririam a função específica de ilustrar certos mitos de origem. Dificuldade anunciada pelo próprio José Bonifácio, já em 1813: “... amalgamação muito difícil será a liga de tanto metal heterogêneo, como brancos, mulatos, pretos livres e escravos, índios, etc, etc, etc, em um corpo sólido e político.”

Impõe-se o método iluminista: esclarece-se primeiro a cúpula, para, posteriormente, passar ao resto. Ponto central da historiografia que irá orientar a identidade nacional, tanto interna, quanto externamente. Sua particularidade está na ausência de ruptura: a nação brasileira é pensada como continuidade do processo civilizatório iniciado pela metrópole portuguesa. Nação, Estado e Coroa: ao contrário da Europa, em que a nação e o Estado afirmam-se distintamente. A identidade brasileira pretende-se um legado da civilização européia.

A metáfora de “povos irmãos” é uma estratégia de reforçar a ideia de continuidade, ao invés da ruptura. Relevantes de consequências, a continuidade presente na articulação Nação / Estado / Coroa, ao marcar uma concepção em academia de elite, excluía não só , do ponto-de-vista interno, todos aqueles que não se inscreviam em condições ao exercício civilizatório definido: negros e índios, mas também, politicamente, no que respeita a nossa diplomacia, relativamente à percepção de constituirmos um extrato superior sob a forma de monarquia em antítese à barbárie republicana, adotada no resto do continente.

Adiante, nas três primeiras décadas do século XX, o que no projeto identitário imperial era um entrave – o “amálgama inviável” – na república, particularmente às vésperas e durante o Estado Novo, é a solução através de uma suposta confraternização num projeto coletivo de democracia racial. Numa palavra: harmonia.

Era a questão nacional em face também a um novo problema, agora posto pelo sistema de produção capitalista: a emergência e o encaminhamento das massas, sem por em risco o regime da propriedade. A democracia racial, apresentada no livro de Mário Filho, “O Negro no Futebol brasileiro”, como uma expressão do nosso futebol, ameniza atritos e mantém velada a discriminação de hábito. Sua estratégia é a contenção, para a colaboração de classes, servindo de opção de encaminhamento da massa nacional mestiça e negra. Estratégia tributária à de Vanhargen, quando da fundação do IHGB, um século antes, que não via no negro capacidade para a civilização e que nela só integrar-se-ia sob uma forma subordinada, subalterna. Esta é uma abordagem crítica, em campo distinto ao do Núcleo da UERJ , cujo trabalho sobre o futebol brasileiro recebe Mário Filho como referencial.

Antônio Soares, que a sustenta, insiste também que Mário Filho escreveu um manual de instrução. Seu objetivo é apontar a presença de Gilberto freyre, a quem considera o ideólogo responsável pelo projeto da democracia racial. Freyre mandava e o resto escrevia. Mário Filho seria justo um desses redatores. Lendo-o, aprende-se a ser brasileiro, na integração nacional e étnica via futebol. Como se o futebol fosse o locus, por excelência, do cancelamento da luta de classes.

Soares é, de fato um crítico ácido. Pejorativamente, chama os pesquisadores do Núcleo de “novos narradores” ( conforme classificação de Hobsbawm para o problema da identidade nacional ), mais literatos do que cientistas. Apenas atualizam o projeto identitário da democracia racial, estabelecido por Freyre. E não cabe às ciências sociais coonestar nenhum discurso. Tem de expor-lhe as mazelas, desvelar seus mecanismos de dominação.

Talvez esteja errado. Na perspectiva marxista, à crítica não cabe apenas apontar defeitos, mas também ser propositiva, ao confrontar a realidade com a sua razão de ser não aparente. Escreveu Marx que a crítica demonstra como a razão já está presente:

“A razão sempre existiu, mas nem sempre sob a forma racional. A crítica pode, então, partir de qualquer forma do conhecimento teórico ou prático, das formas próprias da realidade existente, desenvolver a realidade verdadeira como finalidade e objetivo.” (ARON, 2005: 74)

Talvez em Freyre, dialeticamente, a síntese.

SRN

ARON, Raymond. O Marxismo de Marx. São Paulo: Arx, 2005

GUIMARÃES, Manoel Luís Salgado. Nação e Civilização nos trópicos: O Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e o Projeto de uma História Nacional. Rio de janeiro: Revista Estudos Históricos, Rio de Janeiro, n. 1, 1988, p. 5-27. Disponível em : >http:// www.cpdoc.fgv.br/revista/arq/26.pdf

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Vuvuzela e o Corneta

O Corneta, similar ao Dunga de Macedo, desperdiça tanto as palavras quanto a bola que não joga, ainda bem que pediu pra sair, não sem antes não ter feito nada pra cancelar o desfile das modelos que se amarram numa passarela na diagonal , justo a que foi usada pra enfiarem uma bola, do jeito que gostam, pra saírem na cara do Lomba: 1 x0.

O Vuvuzela ainda aporrinhou e no final tomou elástico até do homônimo do borracheiro que jogava pelada na Senador Soares no final da década de 70, início dos oitenta. Ilsinho (só podia ser paulista) quase fez o terceiro, como se já não bastasse a lambança que o Vuvuzela fez no primeiro gol bambilândio, além da zona em que deixou a nossa defesa e que só não foi melhor aproveitada porque zona não é lugar de moça.

Faz o seguinte, Zico: troca de roupa e entra em campo.

SRN


Não acho o Correa nada demais. No entanto, aquela substituição foi um horror. Não tem jeito, o Vinicius Pacheco não vai se afirmar nunca no Flamengo. Pode ser que num outro time faça um puta sucesso, mas na gávea não vai rolar. Perdemos a saída de bola pelo lado direito e pelo lado esquerdo não temos nada. Não seria melhor deixar o Renato recuperar a boa forma física treinando?
No mais, o Silas não tem o jeitão do Flamengo e se não burro, é um tanto quanto míope pra enxergar futebol.

Outra coisa: substituição aos 21 minutos do primeiro tempo só mesmo se o cara estiver enterrando o time, o que não foi o caso.

Tadeu dos Santos

Se sobrar algum

Encaminhado por Tadeu dos Santos




Maracanã por  Eve DA Folha de São Paulo noticiou que a reforma do Maracanã para a Copa 2014 pode chegar a quase R$ 880 milhões. Somado aos R$ 250 milhões gastos, também em reforma, entre 99 e 2007 chegamos a mais de R$ 1.1 bilhão.

Entretanto, é bom ressaltar, que o consórcio formado pela Odebrecht, Andrade Gutierrez e Delta vencedor da licitação da reforma do Maracanã venceu com a proposta de R$ 705.589.143,72. Mas pelo edital o governo estadual admite que pode pagar até 25% a mais do valor licitado. Chegando então aos R$ 880 milhões.

Será que vale a pena fazer esta reforma?

Com esse valor poderia fazer um estádio novo, até mesmo onde está o Maracanã.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Pertencimento


A Vinte e Oito nem sempre foi uma linha reta. O Boulevard francês de que se ressente também é memória inventada e, a princípio, o que importa. Por quê?

Uma pergunta cuja resposta pode ser encontrada no chão. Olhe pro chão, repare bem nele. As pedras portuguesas cantam versos em notas de calçada. Não se pisa em Vila Isabel, como diria o poeta, na verdade, nas estrelas aqui pisamos distraídos.

Noel passa. Cumprimenta.

28 passa. Os pés inchados, a despeito do chinelo. Seus pés ainda ficam mais rubro-negros. O sangue pisado, na ponta dos dedos, é o preto que faltava à composição. Diz-se logo.

“Ali vai um Rubro-Negro.”


Valeu, aí.


28 não é simpático, mas, estranhamente, respondeu o que nem sequer era uma pergunta. Nem um gesto, tampouco um aceno.


“Passa lá.”


Aqui em Vila Isabel, certamente, é pra não passar.


Vila Isabel – se há mesmo a pós-modernidade – assume sua própria estética. Isto porque não encerramos a totalidade, não sem antes o exercício da crítica a quem insiste, continua insistindo, permanece insistindo:


“Esqueceu-se de Noel? Se continuar limpando a mesa, não pago a conta nem a despesa.”


SRN