segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Apartheid Carioca



A minha Cidade sempre encarnou o que temos de melhor e de pior no país. Ainda que um pouco estereotipada, a carioquice sempre mobilizou no imaginário nacional tendências progressistas. Ficou lá atrás, quase de um Rio como se não tivesse existido, a violência deflagrada contra a pobreza no exemplo didático da ‘Revolta da Vacina”.Mesmo as nossas favelas, espaço em que a lógica sistêmica resolveu alocar a violência institucional ao lado da força de trabalho que sustenta a Cidade, mesmo nelas, o esterótipo não vira estigma pelo samba, pelo funk, pelo passinho, pela recusa simbólica à segregação, enfim. Somos uma Cidade sem outra alternativa senão encarar a questão racial.

O exemplo pioneiro das costas na UERJ não cabe aqui. É que a questão de fundo que o meu amigo Rubro-Negro, cartunista, Pedro Dias levanta acerca dos ataques racistas sofridos por Cristóvão, embora localizados, específicos, por vir do futebol, estabelece uma ligação direta com o ensino básico e com o apartheid que, perplexos, verificamos ser instituído, oficialmente, nas ruas do Rio, nos ônibus, a caminho da praia, que não é de ninguém, é pública, independente de onde se more ou se venha.   

Nessas horas, dados de documentos públicos são bem-vindos. Retiro do PNE do MEC a meta 8 que diz, literalmente, o seguinte:

“Apesar do aumento expressivo da população negra na sociedade brasileira, outro grande desafio é igualar a média de escolaridade entre negros e não negros. Como mostra o Institutode Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), na população negra entre 18 e 24 anos, 1,1% não tem nenhum nível de escolaridade, 70,7% estão fora da escola e apenas 1,4% tem o ensino superior completo. Na população não negra, essas taxas são de 0,6%, 64,5% e 4,5%, respectivamente. No que se refere à população negra entre 25 e 29 anos, 1,5% não conta com nenhum nível de escolaridade, 84,1% estão fora da escola e apenas 5,7% possuem o ensino superior completo.

Essas desigualdades também se refletem na participação e rendimento no mercado de trabalho. Considerando a desigualdade de gênero, a população negra apresenta as mais elevadas taxas de desocupação e de rendimento, ainda que disponha do mesmo nível de escolaridade. Segundo estudo do IPEA (2012), a taxa de desocupação do homem negro é de 6,7%, e a da mulher negra 12,6%, enquanto a de homem e mulher não negros é de 5,4% e 9,3%, respectivamente. Esse conjunto de dados revela que é necessário, no que se refere à educação, um esforço concentrado e articulado entre os entes federativos e respectivos sistemas de ensino para a promoção de uma política pública voltada para a igualdade social, de modo a garantir a elevação dos anos de escolarização da população brasileira entre 18 e 29 anos, com atenção especial às populações do campo, negra e mais pobre, que apresentam maior vulnerabilidade social.”

disso, no último dia 28, foi assinado um acordo, um protocolo de intenções entre a Secadi (secretaria de educação continuada, alfabetização, diversidade e inclusão) do MEC com a Fundação Palmares para acelerar não apenas esta meta, mas também o conteúdo da lei 10.639/2003, que estabelece a obrigatoriedade do estudo da história e cultura afro-brasileira nas escolas.

O interessante deste protocolo, Pedro Dias, é que haverá estímulos para os alunos da educação básica produzirem curta metragens sobre a cultura negra, reforçando a inserção desta nos conteúdos de História do Brasil.

Fica aqui uma sugestão: um dos vídeos poderia ser justo sobre o apartheid produzido no Rio.

Fica aqui também uma pergunta: por que o Ministro da Educação não sai das nuvens onde anda e toma conhecimento do que ocorre no seu Ministério e começa a contribuir pra contra-hegemonia indispensável à luta contra pauta reacionária que ocupa o espaço público e que permite ações como a que temos visto no Rio?

Isso, sim, seria Grande Política Educacional.

SRN


Rezemos a Oração que o Senhor nos ensinou


domingo, 30 de agosto de 2015

Sempre 87

A história da Copa União é mais do que conhecida. A CBF, ainda mais desmoralizada do que hoje, pois não tinha dinheiro sequer pro café, tinha na presidência um tipo notório do futebol daqueles tempos de conluio com a ditadura, Otávio Pinto Guimarães. É quando surge o Clube dos 13 (não este arremedo de hoje), no embalo da constituinte, com o objetivo da autonomia dos clubes. Os clubes se organizam, montam a Copa União, que seria o campeonato brasileiro. Mas, no meio do caminho, a CBF cresce o olho e resolve retomar o controle da prerrogativa do campeonato, montando uma competição paralela com os clubes que ficaram de fora, estabelecendo, ainda, que, ao final, haveria um cruzamento entre o campeão da Copa União e o campeão do torneio organizado pela falida e picareta CBF. O Flamengo, campeão, muito justamente recusou-se a participar da farsa. Que, de resto, rende até hoje. Se eu fosse pernambucano e torcedor do Sport, teria vergonha de insistir nesse papo furado.

SRN


Oswaldo de Oliveira



Sempre achei o Oswaldo Oliveira e o Cuca (que já esteve na Gávea, fomos campeões com ele,mas dizem que é muito instável emocionalmente) os que melhor encarnam o futebol bem jogado tributário ao Telê. Seus times fluem em campo, compactos, habilidosos, virando o jogo, sempre no ataque, em busca do gol. 


Hoje, já com alguns dias de trabalho, o Flamengo demonstrou, sobretudo, capacidade de controlar o jogo com um adversário com menos um em campo. Consciência tática, que só não resultou um placar maior por circunstâncias. No primeiro tempo, compactos, forçamos o jogo pela direita, com o Everton invertido, aproveitando a canhota pra usar melhor o lado interno do campo. 

No segundo, Everton volta pra esquerda, com o Emerson na direita. Depois, o Cirino, com o Emerson fazendo uma função que já havia mostrado competência, a ponta-de-lança. Ganhamos,tranquilamente, desse arremedo rubro-negro, cuja virtude, única, consiste justo no rubro-negro do uniforme.

Só pra lembrar: como se fala besteira, sem consequência, na crônica esportiva. Há algumas semanas, o Trajano, na ESPN, achou de classificar de racismo as manifestações da torcida Rubro-Negra contra Cristóvão. Com base em quê? Em nada, simplesmente achou e disse, pois tinha a câmera ligada para tal, descartando completamente o histórico, que considerava insignificante (e talvez fosse mesmo), no resto do Rio. Racismo como, Cara-pálida, se o Andrade nunca sofreu nada parecido, mesmo quando, após o título do brasileiro de 2009, fomos eliminados da Libertadores? O passado de um Mito Rubro-negro não foi capaz de segurá-lo. Ou só após a eliminação, a torcida virou racista?

SRN

Imagine?


sexta-feira, 28 de agosto de 2015

71


Na briga de foice da Fiesp com o banqueiro, cadê o martelo?

O presidente da Fiesp, Paulo Skaf, que é filiado ao PMDB, em almoço com o vice Temer reunindo outros empresários, pede a saída de Levy. Mas, será que os motivos de Skaf coincidem com o interesse público? Afinal, o que é interesse público?

Fica claro o acerto do argumento dos que sempre criticaram a política econômica do lulopetismo. E não é vergonha reconhecer a ignorância, a falta de leitura mais aprofundada deste camarada que aqui digita (embora há muito idiota que nem sequer se dá ao trabalho de ler, mas que recorre ao anacronismo pra justificar sua “indiferença” nas eleições presidenciais do ano passado), empolgado de ver, pela primeira vez, a autoestima de grande parte do povo brasileiro, historicamente à margem do mercado desse nosso capitalismo de segunda. E aí justamente o problema: consumo é uma palavra mágica que inebria, exatamente como a TV de plasma (ou seja lá o nome da tecnologia da moda) do imaginário cheio de cores e fantasia.

A crise da dívida pública, antes alardeada como resolvida, agora justificativa para a austeridade do corte dos programas sociais; o aumento do salário mínimo, agora apontado com uma das causas ao emperramento da produtividade que deve ser estimulada a qualquer preço, ao preço até do ataque à flexibilização legal de proteção do trabalho (vale um exame cuidadoso da MP 680, no portal da Câmara, ontem renovada por mais sessenta dias, que reduz a jornada de trabalho, junto à redução do salário, com conseqüências deletérias sobre o fundo de garantia) e do recurso da terceirização.

Um “desenvolvimento” à base de commodities, cujo negócio da China foi pro ralo, com a mudança da composição do desenvolvimento da terra  do Mao, que há uns poucos anos vem sinalizando na busca de um paradigma de uma economia de serviços. Certamente, a Kátia Abreu deve mitigar e minorar o máximo que puder os interesses em jogo no Ministério do Agronegócio.

Uma valorização excessiva do real, na esteira de vinte anos, sob o argumento de “oxigenar” a economia brasileira. O resultado é o que os economistas da chamada nova economia do desenvolvimento classificam de “especialização regressiva”, numa espécie de “reprimarizaçao” da economia brasileira. E aqui começam as diferenças, antes disfarçadas: Skaf representa os interesses da indústria nesse jogo  de disputa aberta sobre os despojos do pacto lulopetista contra a força da banca, sempre presente nos últimos jantares tanto com o vice, quanto com a presidente. O presidente do Bradesco esteve nos dois.

Aliás, não é de hoje. Basta ler ‘A Grande Transformação”, de Polanyi, para ver o recurso da paz, responsável pela relativa tranqüilidade do século XIX, inventada pela finança internacional, dando aos Estado-nação, ainda a se consolidarem, um mecanismo oculto de estabilidade, conveniente, de resto, aos negócios da sociedade burguesa, que faltara até mesmo à Santa Aliança, “internacional”, por excelência, do início daquele mesmo século, com suas raízes atávicas no sangue e no sagrado, hierarquias de sangue e direito divino, num esforço breve, mas violento, de recidiva medieval.  

Não é curioso que a expressão de tudo isso, hoje, com uma pauta reacionária cada vez mais arrogante no espaço público, seja a novidade histórica do apartheid oficial no Rio?

SRN





Qual o sentido da presença de Mujica na UERJ?

São muitos. E o problema da análise de conjuntura é que dá ênfase a um ou outro aspecto, desconsiderando fatores que envolvem uma perspectiva mais ampla. Mujica, por isso, é a expressão de uma notável crítica à Economia Política. Sua presença comum, que dispensa pompa e circunstância, ajuda a enxergar o jogo de interesses políticos e econômicos em disputa na formulação de estratégias de Estado:
“Sou pobre o caralho! Consumo o justo porque defendo minha liberdade.”
De fato, Mujica, que porra de desenvolvimento é este em que a difusão da novidade tecnológica exige um padrão de consumo que sacrifica a universalidade da saúde, pendurada em planos de saúde, e da educação, das catedrais de aço e vidro de conglomerados de capital aberto com financiamento público liberado pelo Ministério da Educação do Reino Unido?


E já terminando a descida rápida à conjuntura (afinal, isso é postagem de blog), já foram esquecidos o massacre de professores do Paraná e da violência, praticamente em cima da do Paraná, cometida aqui, na mesma UERJ em que esteve ontem Mujica, numa demonstração da crise da Universidade da minha Cidade, crise, decerto, pois revela os limites de uma situação que já não mais se sustenta com possibilidades abertas que não podem ser prefiguradas?


SRN

quinta-feira, 27 de agosto de 2015

A falácia da 'Carta de Professores Eméritos da UFRJ ao Ministro da Educação"



Quem vem de uma Universidade como a UERJ, que vive todas os problemas de se abrir, pioneiramente, à realidade brasileira, em que a expressão "realidade brasileira' não é apenas um objeto para brinquedo de acadêmicos em situação de "externalidade" ao sistema, aprendeu que a torre de marfim do conhecimento, "de excelência", "puro", é uma falácia simplesmente porque desconsidera as condições em que é produzido. Chama a atenção a "Carta de Professores Eméritos da UFRJ ao Ministro da Educação sobre a ingerência de instancias sindicais no Conselho Universitário e na Reitoria da Universidade". 

Ao chegar próximo ao fim da carta, tive a nítida sensação de que ela terminaria com a denúncia da "república sindicalista". Rapidamente, recuperei-me do anacronismo. Afinal, o Ministro da Educação, a respeito de cuja similaridade com Jango só se pode dizer que se deu no período do parlamentarismo instituído para castrar-lhe o poder legítimo e transformá-lo numa espécie de rainha da Inglaterra, integra o mesmo governo que corta 70% das verbas de pós-graduação e estimula com financiamento público essas catedrais de aço e vidro em que se fundem calhambeques universitários sob a orientação de conglomerados de capital aberto com atuação livre numa área que deveria ser prioritária e predominantemente pública. E quanto a isso? Nenhuma palavra iluminada?

SRN

http://www1.folha.uol.com.br/colunas/guilhermeboulos/2015/08/1674069-a-patria-educadora-e-a-greve-nas-universidades.shtml?cmpid=compfb

Vice de Lágrimas

Meus amigos paulistas não irão se incomodar com aquela velha querela. Afinal, há muito que venceram a disputa, nos carregando nas costas com toda a altivez bandeirante É que, às vezes, dá pra ressuscitar Nelson Rodrigues e atualizá-lo em São Januário: 

"A pior forma de solidão é a companhia de um paulista." 

De fato, São Cristóvão, hoje, tem trechos irreconhecíveis. Parece que nele só se escuta moda de viola, com "r" escandido. Até um campo tem pra rodeio. Oh Louco! E como ficaram loucos, parecia mesmo um bando de loucos, dando pra ouvir aqui em Vila isabel, que é perto, a quantidade de morteiro por terem eliminado o Flamengo. Porque só isso é o que conta lá naquele arraial: ganhar e eliminar o Flamengo.


Orra meu!

SRN




terça-feira, 25 de agosto de 2015

54 anos da renúncia de Jânio



Na carta de renúncia, Jânio escreveu “forças terríveis”, que ganhou a versão mais cinematográfica, “forças ocultas”. De maluquice à tentativa de imitar de Gaulle, convocado pela Assembléia Nacional francesa por pressão dos militares como o Salvador da Pátria na crise da Argélia sob nova constituição, inaugurando a V República, tudo já se disse a respeito para a saída do enigma da vassoura que, paradoxalmente, ao mesmo tempo em que, em pouco menos de 6 meses, fazia uma inflexão progressista de nossa política externa para a Cuba e para a África, moralizaria com os famosos “bilhetinhos” a mini-saia das garotas, proibiria briga de galo, o bíquini em transmissão de concurso de miss e o lança-perfume no carnaval, abrindo uma crise política que só se resolveria com o golpe de 64. 

Jânio foi embora, enquanto Brizola abria a Campanha da Legalidade, pelo rádio, buscando a mobilização a fim de garantir a posse do vice, João Goulart, ameaçada de veto pelos ministros militares anti-getulistas que o consideravam um instrumento do comunismo. Em 12 dias, Jango viajando de volta e o Congresso tentando uma solução de compromisso com o parlamentarismo, que transformaria Jango numa espécie de rainha da Inglaterra, muito antes do nosso atual ministro da educação. Implementado através de um Ato Adicional pelo Congresso no dia 2 de Setembro, a posse de Goulart no dia 7, com seu mandato  na presidência até 31 de janeiro de 1966, o parlamentarismo durou menos de um ano e meio, encerrando-se em janeiro de 1963, com um plebiscito que restauraria maciçamente o legítimo poder de Presidente de Jango.

Só pra lembrar, Jânio voltaria a ser protagonista, anos depois, de uma cena de humor das mais hilárias. Eleito por voto direto prefeito de São Paulo, em 86, antes de sentar na cadeira, pega um espanador e a limpa, como se quisesse imunizá-la de Fernando Henrique, o candidato derrotado, mas que antes do resultado, achando-se eleito, aceitara posar pra fotos pra imprensa sentado na referida cadeira de prefeito.


SRN

E aí, governador, conhece?



Não, não estava no ônibus pra praia.

SRN

Santo Guerreiro contra o Dragão da Maldade


Nunca consegui ver até o fim um filme do Glauber Rocha. O excesso de alegoria me cansa e eu começo a escalar o time do Flamengo de 81, já que se trata de Grande Arte. Pois muito bem, só mesmo recorrendo ao Santo Guerreiro contra o Dragão da Maldade. Seguinte:
Minha filha, numa entrevista de emprego, nessas agências de intermediação de mão-de-obra que chegam a cobrar pelo cadastro, numa prova de que não é apenas o Ministério da Educação ocupado por similar à rainha da Inglaterra, após passar pela "dinâmica" coletiva, foi pra entrevista individual. Três perguntas mais ou menos idiotas, aí vem a cereja do bolo:
"Diz alguma coisa que me surpreenda?"
Se fosse eu:
VAI TOMAR NO CÚ!
SRN

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Getúlio Vargas



Permite tantas abordagens e, quanto a todas, as torna insuficientes, quando não crônicas.

O mito se sobrepõe à divisão de classes, é tributário ao lugar onde se formou. O Rio Grande do Sul foi o único endereço das idéias de Comte. A forte penetração do positivismo na elite política gaúcha do início do século passado, levando-a a ver no Estado um consenso que deveria corrigir as injustiças de um esforço de industrialização e manter a coesão social, uma entidade autônoma acima dos interesses de classe, fez com que a questão social deixasse de ser um caso de polícia e nos ajuda a compreender as reformas do trabalho e da previdência executadas por Vargas.

O desprezo pela democracia formal, que descia pelo ralo do liberalismo incapaz de fundamentar a nova fase do imperialismo, agressiva, fascista, era em Vargas a espera da oportunidade para superá-la. Getúlio é seu chefe de polícia Filinto Muller, seus chefes militares Goés Monteiro e Dutra, as cadeias cheias de comunistas, Graciliano preso, Estado Novo, mas é também o nacional-estatismo, o IPHAN, o modernismo em arte e arquitetura, a CLT. É um impulso para desenvolver no país um capitalismo industrial por substituição de importações (ISI), com orientações de proteção social.

A propósito, qual o papel do trabalhador no nacional-estatismo? São os “amarelos” que, no ínicio do século XX,  praticamente perderam o registro pela hegemonia de disputa entre anarquistas e comunistas? Sujeito ou objeto? Interação ou manipulação?

Há uma historiografia relativamente recente, feita basicamente na UFF, por Jorge Ferreira, entre outros, , segundo à qual o nacional-estatismo era uma relação entre sujeitos, assimétrica, mas suficiente para caracterizar uma interação. Assim, não haveria capacidade explicativa no conceito de populismo da chamada “sociologia uspiana”, de Welfort e Ianni, o qual simplesmente reduz os trabalhadores a mero objeto inconsciente de manobra do chefe carismático, numa espécie de “política de massas da burguesia”.

Admitido o trabalhismo como uma corrente de esquerda, não marxista, de que modo disciplinar a propriedade como fonte do processo de urbanização capitalista?
O grosso do operariado passa a ser justo o camponês de macacão que sai do campo, explorado e miserável, para servir à industrialização a partir de 30. Vargas, gaúcho, de um tipo de propriedade rural de qualidade distinta da do resto do pais,  não pode mexer no campo, entre outras razões de força maior, por necessitar desse fluxo migratório de força de trabalho para a acumulação industrial que estimula.

O historiador Marcus Dezemone, analisando material de fonte oral de camponeses dessa época, nota, curiosamente, como estes reconheciam em Vargas uma espécie de protetor dos seus direitos contra o latifundiário, embora a legislação social só seria definitivamente estendida ao campo com o governo João Goulart (1961-1964) no Estatuto do Trabalhador Rural, em 1963. Talvez não estivesse aí, numa das famosas artimanhas de Getúlio, mais uma tentativa de proteção à força de trabalho pelo equilíbrio da oferta, na busca de reduzir o estoque de reserva de braços que a desvalorizaria?

O salário mínimo consistia na estipulação do valor necessário á reposição do desgaste do trabalhador. Com o camponês dispensado da obrigatoriedade de usar macacão, Getúlio não estaria pensando reforçar os mecanismos de proteção ao mundo do trabalho?

São especulações que morreram junto com Getúlio Vargas, na bala com que se suicida por ter voltado, anos depois - a burguesia contraditória e heterogênea que patrocinara querendo-lhe o sangue -, conforme Samuel Wainer, em “Minha razão de Viver”, agora, 1950, eleito maciçamente pelo povo em pleito direto, como “líder de massas”.


SRN

domingo, 23 de agosto de 2015

Bradesco, Itaú... golpe pra quê?


Quem tenta uma noção de interesse público que não se confunde com torcida de futebol, não tem nenhum problema de revisar posições. Dilma e o PT, pra mim, não são o Flamengo. Após o presidente do Bradesco, Luiz Trabucco, no O Globo, agora é o do Itaú, nesta entrevista à Folha de São Paulo, defendendo o governo - o que demonstra, pra quem procura manter a capacidade crítica, que nunca houve condições de golpe. Aliás, golpe pra quê? 

Produtividade, flexibilização da legislação trabalhista e aprofundamento ainda maior da internacionalização da economia brasileira - estes os pontos fundamentais defendidos pelo presidente do Itaú que espera serem atendidos na construção de um ambiente de retomada do crescimento. Vida que segue, como dizia o grande Saldanha.

SRN


http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2015/08/1672332-nao-ha-motivos-para-tirar-dilma-do-cargo-diz-presidente-do-itau-unibanco.shtml?cmpid=compfb

sábado, 22 de agosto de 2015

O Golpe e o Golpe de João Goulart

Só não é título de romance de Jorge Amado. Mas, é uma trama, que permanecerá sem desfecho, enquanto não se fizer um trabalho de Memória da ditadura militar-empresarial recente. Por que a vontade de um general ainda tem o poder de vetar, proibindo a construção de um monumento em homenagem ao ex-Presidente golpeado e derrubado, uma ação de um governo perfeitamente legal pelas regras da Constituição?

Porque o problema é sempre político, não jurídico. E justo pela pedra no passado recente, na conciliação para evitar constrangimentos que hoje já não cabe mais, haja vista Lobão, Roger, Bolsonaro e esses grupelhos fascistizantes das patéticas manifestações de 15 de março e 16 de agosto últimos. O passado acabou tornando-se imprevisível com o apagamento do que se viveu. Ele pode ser qualquer coisa, na disputa de significado em que o papel da discussão pública, da mídia, sobretudo, joga um papel decisivo no direito social que é o dever de memória.

Enquanto isso, Jango continuará sendo golpeado.


SRN


sexta-feira, 21 de agosto de 2015

"Deu no New York Times"


Esta era uma expressão que Henfil usava como crítica de nossa colonização cultural. A piada agora virou realidade. Editorial do jornal em defesa do governo serve como prova de grandeza.

Acho melhor voltar a rir de piada de papagaio, ou melhor, do Zé Carioca...

SRN


terça-feira, 18 de agosto de 2015

A utilidade da galinha verde

Para o governo, a melhor imagem de domingo são esses nichos patéticos, de pequenos fascistas fantasiados de super-heróis de verde-amarelo. 

Fornecem um bom argumento para o discurso de propaganda do “Não passarão”, ao mesmo tempo em que transmite aos que estão sentados a sua direita, a caneta na mão, que, de fato, não vale a pena usar essas imagens como chantagem de reserva sob o risco de desmoralizar qualquer virada de mesa.

SRN




"Escola sem partido" é amnésia da memória política

A organização do esquecimento, a pedra no passado, logo a seguir à transição política de 84, encontra no tempo um aliado a favor do nivelamento de memórias, com o que lucra a lembrança da ditadura militar-empresarial recente, manifesta em faixas e cartazes como o que vimos anteontem, na disputa por interpretar o nosso passado traumático de poucos anos atrás.

Esta "Escola sem partido" é uma excrescência fruto dessa amnésia da memória política

Uma pergunta prosaica: como é possível trabalhar a História sem falar de política?

SRN




GT Ensino de História e Educação – ANPUH-RJ

Tramitam, em diferentes Câmaras de Vereadores e Assembleias Legislativas pelo Brasil, propostas de lei que instituem, no âmbito dos sistemas municipais e estaduais de ensino, o “Programa Escola Sem Partido”. Tramita também na Câmara das Deputados a proposta de lei 867 de 2015 que inclui, entre as diretrizes e bases da educação nacional, o "Programa Escola sem Partido". Tal “programa” foi criado pela organização homônima e constitui um ataque direto a qualquer projeto de educação emancipadora e crítica, mesmo porque a organização em questão defende que os professores não são educadores.

No site do Escola Sem Partido, é indicado para leitura o livro “Professor não é educador”, de autoria de Armindo Moreira, que serve de embasamento teórico para as suas propostas. Esse livro propõe uma dissociação entre os atos de educar e instruir, defendendo que a escolas e professores não devem educar, apenas instruir. Opomo-nos veementemente à dissociação entre os dois atos, uma vez que ela vai totalmente contra o fundamento do projeto educativo que defendemos.

No mesmo site, encontra-se disponível a cartilha intitulada “Flagrando o Doutrinador”, que expõe a tônica da proposta desta organização: apresentar os professores que investem em um processo educativo que dialoga com a realidade do aluno como criminosos que devem ser denunciados. Essa cartilha traz uma lista de características que deveriam ser buscadas na atividade docente para fazer as denúncias contra os professores. A primeira delas diz o seguinte:

“Você pode estar sendo vítima de doutrinação ideológica quando seu professor se desvia frequentemente da matéria objeto da disciplina para assuntos relacionados ao noticiário político ou internacional”.

Outra dissociação que combatemos veementemente: a oposição entre a “matéria objeto da disciplina” e os “assuntos relacionados ao noticiário”. O Escola Sem Partido assume uma concepção de “educação” na qual os alunos constituem uma “audiência cativa” aprisionada em uma sala de aula, isolada da realidade do mundo que a circunda, na qual é objeto da maquinação maquiavélica de doutrinadores meticulosos. Isso é um absurdo! A educação não pode ser dissociada da instrução! A realidade dos alunos, os fatos que estão acontecendo no mundo e são relatadas nos noticiários, são a matéria do diálogo aberto que existe dentro da sala de aula, diálogo este no qual alunos e professores trazem as suas experiências cotidianas e seus saberes para constituírem JUNTOS o conhecimento escolar.

E qual é a solução para o problema criado pela própria visão deturpada do processo educativo do Escola Sem Partido? O “Programa Escola Sem Partido”, que estas propostas absurdas querem incluir na própria lei de diretrizes e bases da educação e instituir nos sistemas de ensino no Brasil inteiro! E qual é a grande proposta prática deste “programa”? Uma lista com os “Deveres do Professor”, com 70 centímetros de altura por 50 centímetros de largura a ser afixada em todas as salas de aula do Brasil. Existem coisas tão mais urgentes a serem exibidas nas paredes de nossas escolas! Por que não fixar o valor dos recursos nacionais que deveriam ser dedicados anualmente para educação em oposição aos efetivamente recebidos? Por que não descrever para os alunos as condições básicas de infraestrutura que deveriam estar presentes em todas as escolas do Brasil? Por que não os informar que uma educação pública, gratuita e de qualidade é direito de todos?

Eis um dos tais “deveres do professor”: o professor não deve estimular “seus alunos a participar de manifestações, atos públicos e passeatas”. Agir em concerto com outros no espaço público é parte essencial da vida em um regime democrático. A aprovação dessa proposta – seja em âmbito municipal, estadual ou federal – constitui uma afronta a um projeto de educação que forme os alunos para a atuação em uma democracia, na qual as manifestações são condição para a vida política.

As organizações, associações e instituições subscritas abaixo, por conta do exposto nesta carta, repudiam veementemente todas as propostas de lei que visam instituir o “Projeto Escola Sem Partido”.

Qualquer outra organização, associação ou instituição que deseje assinar esta carta de repúdio deve enviar um e-mail para  gtensinodehistoriaanpuhrj@gmail.com


segunda-feira, 17 de agosto de 2015

A Burrice também é profundamente coerente



De vez em quando consulto o Caboclo Miles. Sempre que baixa, vem logo avisando que não tem paciência pra anacronismo e que previsão do futuro era com a falecida Mãe Diná.

O Caboclo acha engraçado certos macumbeiros que, embora arriem o despacho como qualquer outro, também acendem uma vela pra Deus, outra pro Diabo, pois assim cercam a encomenda por todos lados e, qualquer que seja o resultado do "trabalho", sempre acertam. Em geral, são sonsos, ambíguos, escorregadios, bajuladores, pois o que querem é ser qualquer coisa que dê certo. Incapazes de análise, de arriscar por conta própria, pois não apenas não têm nada pra arriscar, mas, o que é pior, não pensam, porque nunca tiveram nada pra dizer, por isso vivem pedindo "coerência". Aliás, coerência é uma espécie de palavra de ordem desses tipos.

Por isso, é difícil explicar o que é estratégia e tática em situações de crise, sobretudo quando se trata de decidir entre o Coisa Ruim, o Capeta ou Netinho do Vovô da História. Pedem "coerência". A burrice também é profundamente coerente. Nunca deixa de ser burra.


SRN

domingo, 16 de agosto de 2015

O Legado de Ricoeur

Não há humor com reacionarismo desse tipo. A prova maior da importância do trabalho negligenciado de memória a respeito da ditadura militar-empresarial recente: a "organização do esquecimento", a pedra no passado, logo a seguir à transição política de 84, encontrando no tempo um aliado a favor de boçalidades desse tipo. Há um crescente interesse por representações do passado. Outras formas de discurso disputam, por isso, a interpretação de fixá-lo, no espaço público.

Contudo, a diferença da interpretação historiográfica está na perspectiva crítica, do exame e dúvida das fontes, do exame e dúvida de toda e qualquer representação (historiográfica, inclusive) que organiza a mediação da experiência do que se viveu. Da memória. Da imagem que passa a ser uma construção política a serviço do controle.


SRN


Nossa defesa, no alto, parece a cabeça do Cunha


Nosso time está de cabeça tão ruim quanto o Cunha. Enquanto este vive suspirando a saudade da Carlota Joaquina, nossa defesa no alto parece pintor de rodapé. 

Cristóvão hoje não teve nenhuma responsabilidade pela virada posterior do Palmeiras. Ao contrário. Voltamos pro segundo tempo com o Ederson, no lugar de um volante, e tivemos 10 minutos de grande jogo virando o placar com dois gols justo do Ederson. 

Canteiros faz falta.Protege bem como volante e sabe tocar a bola razoavelmente.

SRN 

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sábado, 15 de agosto de 2015

Enquanto isso, no paraíso...


O mundo é belo, Brecht?

“Com efeito, diz Brecht, a situação se complica pelo fato de que a simples reprodução da realidade não consegue dizer nada sobre a realidade. Uma fotografia das fábricas Krupp ou da Aeg não diz quase nada sobre essas instituições. As relações humanas, reificadas – numa fábrica, por exemplo -, não mais se manifestam. É preciso, pois, construir alguma coisa.” / Benjamin, em “Pequena história da fotografia”.

Brecht influenciou muito Benjamin e este trecho da “Pequena história da fotografia” é uma crítica à estetização da imagem, um fetiche que não apenas ilude a mercadorização da arte, mas também a sua possibilidade política.

Será que no Fantástico, amanhã, o agente aposentado do Dops aparecerá, em meio ao colorido verde e amarelo, devidamente legendado com a bandeira “Comunista: vai pra Cuba!”, ao lado de adolescentes risonhos, com seus tabletes e celulares, fotografando o vovô de fim de semana?


SRN


quinta-feira, 13 de agosto de 2015

O picadeiro do golpe sem cobertura

De onde veio esse papo de golpe?

Considerando a “ação em contexto”, alguns agentes eram notórios:

O viúvo do espírito da Carlota Joaquina, o ex-monarquista e ex-baixo-clero, atual Paladino da Chacrinha, o deputado Eduardo Cunha. 

O roedor Renan Calheiros, senador. 

Michel Temer acabou com a ilusão de FHC e do netinho do avô da história. 

Por último, as organizações globo, cujas razões devem estar em algum financiamento não viabilizado no BNDES, agravado pela ameaça do corte da propaganda do governo federal. Assim como botou seus empregados pra trabalhar no clima do golpe, Waack, Sardenberg, Bonner, Merval, mandou-os calar a boca, quando o presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabucco “(que teria sido cotado para Ministro da Fazenda)”, em entrevista ao globo a 8 de agosto, encerrou o assunto dizendo “que o dissenso político precisa ser superado para o avanço das reformas e a retomada do crescimento.”

Com a “Agenda Brasil”, a República tem, enfim, seu Condestável, o Indefectível Roedor.

Domingo será um circo com o picadeiro sem cobertura.

SRN


quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Voltando da UERJ, na pastelaria em frente ao Pedro Ernesto



Uma síntese do noticiário econômico: a desaceleração da China, a queda no preço dos primários e o aumento das taxas de juros pelo Fed que levará ao abandono dos investidores dos mercados financeiros “emergentes’ e o destino aos EUA.

Imersos no pragmatismo, parece que não há solução senão sentar ao meio-fio da Sernambetiba e verter o choro de ex-novo rico.

“Quem tem olho grande não entra na China”. Mais do que um ditado, é preciso apurar a vista pra tentar entender um país, que é um continente sozinho, além de referência de um modo de produção, o “asiático”. Evidente que o que possui, pro Ocidente, um caráter catastrófico irreversível, na China, é parte de uma estratégia. Não à toa o controle que mantém sobre o yuan. Com 1 bilhão de habitantes, o dia em que constituir um mercado interno pujante não precisarão mais inundar o mundo vendendo bugigangas. Aliás, necessitarão do mundo, mas isso é outra História. 

Como o futebol. Os chineses decidiram que serão campeões mundiais daqui a 50 anos. Já ouvi piada a respeito, voltando da UERJ, na pastelaria em frente ao Pedro Ernesto, aqui na 28.  Esquecem-se os presepeiros de que, materialistas chineses, da quantidade sai a qualidade e que já que querem é agora é superar as contradições do que podem.

Enquanto isso, temos levy e Kátia Abreu.

Em breve, também de volta Felipão. 

Quando os chineses abrirem o olho.

SRN 

Night fever


terça-feira, 11 de agosto de 2015

A ‘Carta de Intenções” virou Moody’s

Nos anos 80, era a “Carta de Intenções”. O noticiário econômico vivia a expectativa da aprovação ou não pelo FMI da política econômica expressa na tal “Carta”. Agora o aval mudou de nome e endereço, abrigando-se nas “agências de classificação de risco”, na moralidade de fancaria, sobretudo a Moody’s. A recomendação é igualmente categórica, embora não afaste de todo a ameaça: a economia brasileira ficará parada em 2015 e 2016, mas se se mantiver na austeridade, conseguirá o superávit primário necessário à “qualidade da dívida pública”.

Não dá pra ler isso sem rolar a página e verificar a data. De fato, 11/08/2015. O tempo passou, a economia brasileira se diversificou, cada vez mais complexa em sua dimensão continental, não bastando mais sequer o fato de sermos hoje um mercado interno aberto. É curioso como antes o problema era a ‘economia fechada” e, depois de aberta, parece que retornamos a uma divisão internacional do trabalho de fornecedores primários – o que não é muita bobagem, haja vista a importância das comoditties, cujo negócio da China indo pro ralo deve tirar o sono da Ministra do Agronegócio,  Kátia Abreu.

Forçando ainda a leitura, é possível constatar o melhor dos mundos para o rentismo. No noticiário, conforme a Moody’s, ainda não perdemos a condição de investimento, mas o risco é alto, o que exige taxas de juros elevadas a fim de podermos continuar a receber a visita do capital que estabiliza (risos).

Tudo muito subserviente, mesquinho, árido, sem nenhuma imaginação.

SRN