quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Uso de Imagem na Sala de Aula de História

Por Máximo



Uma biografia, por exemplo, de Geraldo, "assobiador", meio-campo habilidoso do Flamengo, que surge com Zico, chega à seleção brasileira, dirigida por Oswaldo Brandão, em 1975, e morre de operação de amígdalas no ano seguinte, em 1976. Um personagem cujas contradições ajudariam a compreender um futebol de transição à pasteurização atual. Não só andava sobre a bola, na jogada famosa que Zidane imortalizaria, mas também pela sua morte, aos 22 anos, por todas as possibilidades ou, talvez, pelas que não se ensejariam, no confronto com sua concretude histórica, como se os personagens não pudessem ser diferentes do que foram, benzidos pelo destino e condenados ao heroísmo. 
Abordar Geraldo, como tema de uma biografia, já é uma escolha crítica. Impossível a ausência de paradoxos na trajetória deste mineiro que tinha até nome de personagem: Geraldo Cleofas. A um só tempo artista e desperdício, quando irritava a torcida com dribles e jogadas sem nenhum outro propósito senão o de simplesmente brincar em campo, como se estivesse numa pelada. Nessa hora éramos unânimes, no lado esquerdo da tribuna de honra: pedíamos em uníssono: Tadeu! Tadeu! -  meio-campo correto, vindo do América, que ainda existia e era um clube relevante a um ponto, até o ponto de ser considerado um dos “cinco grandes” do futebol carioca.
Geraldo também era completamente displicente em relação ao tipo de profissionalismo do futebol brasileiro. Pensamos que, neste ponto, de tudo o que já se disse sobre a sua estrutura profissional, semiprofissional, paternalista, até escravista (pela antiga lei do passe, em que o jogador era “vendido” e “comprado’, literalmente, como pé-de-obra compulsório), um modo de aproximação ao futebol brasileiro talvez esteja em considerar a incompletude das relações modernas um espaço conveniente com todas as condições objetivas e subjetivas para as questões pós-modernas, tais como, o acirramento do individualismo, a precarização do trabalho, de um lado (a maior parte dos jogadores profissionais no Brasil ganha muito mal e trabalha em condições piores ainda), do outro, a pasteurização dos estádios, a construção do espetáculo midiático, com jogadores produzidos concomitante em estúdio e no campo, “fenômenos” dados de antemão (exemplo evidente, recentíssimo, é o Pato. Quem paga o pato desse pobre-diabo inventado? O que importa, porém, é o cinismo que mói um pobre-diabo feito pelo departamento de propaganda pra ser um cracaço, quando não passa de uma atualização do Iranildo. Venderam dele o que puderam e esse craque de videogame agora é cobrado por não ter "consciência da importância e da gravidade do momento por que passa o Corínthians". E isso é dito como se o estúdio fosse o Palácio do Planalto, sem se considerar que o futebol é uma paixão que mobiliza aspectos coletivos ainda não suficientemente estudados.)
São questões que o professor pode trabalhar em sala, pois que o futebol é um tema da realidade de – podemos dizer – todos os alunos, gostem ou não de futebol.  A oportunidade de trabalhar a figura de Geraldo mobiliza a problematização de diversas categorias históricas: o tempo, a memória, a história dos “vencidos”, a relação passado-presente, além de discutir o ponto central do problema das biografias não autorizadas: os indivíduos não explicam a história, mas sem eles não há história, por isso, a importância de se conhecer-lhes as ações e como, e em que medida,  suas personalidades, características, gostos, comportamentos e idiossincrasias podem influenciar e produzir consequências históricas. Mostrar, no próprio exemplo do que o professor conhece do Geraldo e do que todos vemos e sabemos hoje do Pato, os interesses envolvidos na construção de personagens e dos problemas evidentes de uma versão autorizada, laudatória, panegírica.
SRN

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