quinta-feira, 28 de abril de 2011

Perdemos a Copa de 50 Porque Deus, Mais do que Brasileiro, é Carioca

Por Anselmo Gonzaga Bastos


Máximo:

Conheço o livro a que se refere, "Lance de Sorte: o Futebol e o Jogo do Bicho na Belle Époque Carioca", de Micael Herschmann e Kátia Lerner. Decerto, excelente. Gostaria, se possível, me fizesse a gentiliza de publicar-me a postagem. Pois muito bem:

A prática do futebol significa um processo que combina equidade, disciplina e catarse, e o resultado, seja lá qual for, é uma mera consequência, sem prejuízo da pedagogia que propiciou a convivência.

No futebol, a equidade manifesta-se em regras claras, estáveis, iguais para ambos os times. A disciplina que o treinamento exige para o bom desempenho também caracteriza um espaço, o único espaço possível para o exercício e a recompensa do mérito de quem está na base social. Além da catarse: no estádio o palavrão, o choro, o espasmo são livres e recomendados para compensar a frustração e a tensão represadas no cotidiano de uma vida árida.

Norberto Elias afirma que política e esporte concorreram para a estabilidade institucional inglesa. Atribui à "parlamentarização" e à "esportização" a combinação fundamental em que o inglês, "na retórica e na persuasão do parlamento e na perícia e na força do esporte", aprendeu a perder e "a viver em uma sociedade baseada no auto-controle".

Não há dúvida: o esporte moderno da era industrial veio com a função de alienar os dominados. Equidade, disciplina, catarse. Três palavras-chave no controle social pretendido pela nova ordem dominante, destinado à massa trabalhadora.

No Brasil, dialeticamente, um produto importado, branco e elitista se distribui pelas fábricas para a prática do lazer entre operários.

O insucesso pedagógico talvez se revele com evidência na derrota de 50. Não sabíamos perder. O estigma daquela Copa exige uma renovação catártica a cada quatro anos, a despeito dos cinco títulos mundiais. Percebo nela, entretanto, o que eu chamaria de uma antipedagogia paradigmática. Assim como o malandro que desconfiava do discurso oficial, sabia que, numa sociedade de privilégios e desleal, corria sério risco se se dispusesse a cumprir regras, a derrota de 50 me parece que interrompeu um processo de domesticação ao capital, com resistência particular entre os cariocas, sede da Copa e da fragorosa derrota, de cuja estratégia o futebol constituía parte importante.

Essa chave analítica que vislumbro encontra seu antagonismo na derrota de 82. Mas isso é outro papo.

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