Por Tadeu dos Santos
Em a História da Loucura Foucault remete-se à Nau dos Loucos que na Europa Medieval levava os insanos de cidade em cidade. Havia em todo aquele ritual algo de místico e como já dito aos loucos eram dados ouvidos.
Vitorioso o discurso racional e triunfante o capitalismo, a exigência de uniformidade resultou no confinamento e marginalização desse considerável contingente. Precedeu a tudo isso, porém, a cassação de qualquer sentido no discurso outrora ouvido.
Nos dias que seguem, cresce assombrosamente o número de pessoas com transtornos mentais e de pacientes tratados com antidepressivos e outros medicamentos psicoativos (os psiquiatras auferem elevadíssimas comissões junto aos laboratórios), conforme excelente artigo publicado em Piauí, , agosto de 2011, nº 59, da lavra de Marcia Angel – A EPIDEMIA DA DOENÇA MENTAL.
“ O que está acontecendo? A preponderância das doenças mentais sobre as físicas é de fato tão alta, e continua a crescer? Se os transtornos mentais são biologicamente determinados e não um produto de influências ambientais, é plausível supor que o seu crescimento seja real? Ou será que estamos aprendendo a diagnosticar transtornos mentais qe sempre existiram? Ou, por outro lado, será que simplesmente ampliamos os critérios para definir as doenças mentais, de modo que quase todo mundo agora sofre de uma delas? E o que dizer dos medicamentos que viraram a base dos tratamentos? Eles funcionam? E, se funcionam, não deveríamos esperar que o número de doentes mentais estivessem em declínio e não em ascensão?”
A exemplo de “O Alienista” de Machado de Assis, hora teremos todos direito à nossa camisa de força. É a lógica capitalista, a saber, lucro a qualquer preço.
Também a Revista CULT, em seu nº 159, traça os novos rumos da doença mental.
A internação compulsória, contudo, já não é mais possível. É esse o escólio do preclaro Waldeci Gomes Confessor Júnior, exteriorizado em seu artigo “A Internação Compulsória no Contexto da Reforma Psiquiátrica Brasileira”, in verbis:
“Os enfrentamentos são, necessariamente, árduos, uma vez que a reforma psiquiátrica choca-se com um modelo historicamente estabelecido de agenciamento social da loucura, reclamado pela psiquiatria, desde seu surgimento. Há duzentos anos, a psiquiatria responde ao problema da loucura com a solução da internação, exclusão do doente do seu meio social, fomentando estigmas sociais inviabilizadores da expressão subjetiva do indivíduo.
A reforma psiquiátrica, constituindo-se essencialmente enquanto tentativa de evitar a internação como destino, e fomentando uma resposta ao problema do desequilíbrio mental a partir de práticas não asilares, mas tomando como base o agenciamento social da loucura, permite que esse indivíduo, nas contingências de sua loucura, se expresse na forma de ser histórico. A lei nº 10.216/2001, expressão da reforma do modelo assistencial em saúde mental no Brasil, tem por escopo a busca de um aperfeiçoamento técnico e institucional que promova práticas inclusivas, contribuindo profundamente para a transformação da visão social da loucura e do louco.”
Todo esse preâmbulo apenas para dizer que em meio aos removidos do IASERJ por força de Liminar, haviam dois loucos que à falta dos devidos cuidados da família e, claro, do Estado, por ali fixaram residência.
Se antes havia afronta ao Direito, agora dá-se indesculpável ataque aos mais comezinhos princípios de civilidade.
E já que o assunto é civilidade, adivinhem quem foi chamado pra colocar as mãos no lamaçal? O braço armado do Estado. Sim! A Puliça. E como sabem chegar esses caras. Sobretudo quando na trincheira adiante há desvalidos, doentes e maltrapilhos. Como sempre foram sutis, educados e indolores.
Desfeita a massa ignara, espalhados os doentes pelos diversos hospitais da cidade (e que se virem as famílias) e postos os insanos na revivida Nau dos Loucos, deu-se por cumprida a decisão prolatada pelo Juiz (parte imparcial do processo) que logo mais irá lançar-se à cama, deitar a cabeça ao travesseiro e dormir o sono dos justos. Não será atormentado pelos olhos embaçados e pelos gestos destituídos de esperança daqueles a quem parece já a doença um mal menor, quase um bálsamo.
Não sentirá a truculência policial e tampouco o brusco fechar da porta da ambulância. E à moda de Pilatus, o Pôncio, dirá, já ferrado no sono reconfortador, sou imparcial, sou neutro e pouco se me dá...
Á essa altura, Foucault rodopia no túmulo enquanto nosso insigne governador concede entrevista coletiva
- Resolvido o problema, Governador?
- Sim, mas não sei se foi a contento. Não entendo muito dessas coisas, sabe? Falar da situação dos funcionários da Saúde, remoção de doentes e coisas que tais, causa-me profunda depressão e constrangimento. Sabes do que gosto? Gosto de Paris, adoro meus amigos empreiteiros, gosto de obras, de construções. Por que não me chamaram pra construir um novo hospital? Você não tem ideia do quanto eu e meus amigos entendemos desses assuntos. Também gosto de lencinhos na cabeça, sabe? Mas duvido que sejas capaz de adivinha aquilo de que mais gosto. E olhe que supera meu amor às obras, aos amigos que ajudam nas obras, a Paris e aos lencinhos que coleciono. Sabes o que é? Adivinha! Adivinha! Não sabes? Pois lá vai: adoro, morro de paixão por volta olímpica. Fico maravilhado ao vê-las. E gosto de saboreá-las de perto. Só vou aos finais de campeonato. Daí meu time invariavelmente perde e eu fico pra ver a volta olímpica dos adversários. Uma beleza só!
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