domingo, 13 de fevereiro de 2011

O Rio Frita, Uri Geller e a Vila que Segue


Por 28
  


Minha filha me levou pra passear. 

O Rio frita, as ondas de calor embolam a perspectiva, na Manoel de Abreu, na Felipe Camarão, na Francisco Xavier, UERJ, Maracanã. 

Aberturas, cruzamentos, esquinas. 

Nascido e criado em Vila Isabel, sei da importância da esquina, do futebol jogado na rua, os pés descalços expostos aos calos de sangue.

Não foi à toa que, na sofisticação do samba do Estácio por Noel, produzimos o autor de "Com que Roupa",  em seus acordes à ironia ufanista, ouvindo Ismael, indo e vindo a Cartola, subindo a Mangueira.
 
Noel ia à pé, da Teodoro da Silva onde morava. 


Vila Isabel foi também a primeira produção incipiente do urbanismo carioca. Abandonada a fazenda dos macacos, presente de D.Pedro à Princesa Isabel, quando de seu retorno a Portugal, adquiriu-a o Barão João Batista de Viana Drummond (também muito conhecido por ter criado o jogo do bicho)  que montou a "Companhia Arquitetônica de Vila Izabel", com projeto do engenheiro Francisco Bittencourt da Silva.
Ao conselheiro João Alfredo Corrêa de Oliveira, que a maioria conhecemos como uma escola que dá fundos prum muro na Manoel de Abreu, mas cujo acesso é pela 28, ao lado do banco de sangue com o busto do Betinho, o Barão pediu permissão para estabelecer uma linha de ferro-carril ligando a Fazenda do Macaco ao Centro da Cidade.  Eram os bondes.

"Ponto Cem Réis": assim era conhecida a esquina da 28 com Souza Franco, devido às manobras que ali fazia o bonde. Quando nasci – é certo - ainda havia bonde, cheguei a andar neles, mas  no colo da minha mãe, logo substituídos, ou derrotados, pelos ônibus elétricos, os “chifrudos”.

Bonde mesmo muitos de nós só conhecemos no clube Maxwell, na rua de mesmo nome, ali perto da Casa do Barão, antiga fábrica Confiança, atual supermercado. Era um vagão deixado por conta no terreno ao lado da piscina, que usávamos para brincar. 

Treze ruas projetadas; a 28, "Boulevard", a avenida  28 de setembro, vértebra do bairro e a Praça Sete, como até hoje a chamamos, a despeito de ter virado Praça Barão de Drummond, por motivos óbvios.

O panegírico, como é óbvio, foi muito além do que é de hábito, na criação de um bairro que nada teria de formal ou "oficial".

Vila Isabel,  antes de tudo, nos cultiva o antipanegírico. Aliás, um erro uma Vila monolítica, unida contra o panegírico, ainda que contra o panegírico. O próprio Noel não gostaria dos seus cem anos comemorados do jeito que se viu. A  Noel desgostavam os heróis, os protagonistas fossem de que tipos,  o viés moralista que só enxerga o mundo dividido entre duas categorias: os honestos e os ladrões, os decentes e os imorais.

As próprias letras em Vila Isabel não costumam a crítica feita por conformismo. Desde Marques Rabelo, não se quer andar tranquilamente sob o tacão da polícia nem se agradece por não se ter o que se quer, mas aquilo que Deus quis dar.

Ainda que pós-modernos, novos objetos, novas abordagens, identidades fragmentárias, o que for, com tudo isso, estou certo de que a Vila continua  útil. 

A vista turva,  espero a Ângela sair do Hortifruti. 

Enquanto bebo a água de côco me lembro do Uri Geller, na ponta-esquerda, discutindo com a geral em 79.

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