sexta-feira, 31 de julho de 2015

Zico x Arthur

Uma das coisas mais difíceis é a memória. Hoje central na historiografia, na relação entre Memória e História, sobretudo pelo exame do trauma na análise das ditaduras recentes latino-americanas. Várias abordagens, “organização de esquecimento” de Paul Ricoeur, “os abusos de memória”, de Todorov, “a guinada subjetiva”, de Beatriz Sarlo. Até um campo controverso, como a História do Tempo Presente, que tem no testemunho um dos seus atributos principais.


Por isso, pra qualquer Rubro-Negro, que teve no Zico seu ídolo de adolescência e juventude, é muito difícil abordar o cidadão que há no craque mítico.

Zico foi Ministro dos Esportes de Collor, o “Caçador de Marajás”.

Ficamos constrangidos ao lembrar disso.

Zico agora quer ser candidato à presidência da Fifa, cuja economia dos negócios que a escala do futebol no capital hoje exige é o que sabemos. Não se chega à cúpula de uma operação desse porte sem compromissos e silêncios.

Arthur ganhou o apoio de Del Nero.

SRN


quarta-feira, 29 de julho de 2015

Jameson e Don Corleone



A parte que ficou faltando foi o declínio dos Estudos Culturais, como tudo, na década de 90, em tempos neoliberais.  

Maria Celina Cevasco - do departamento de letras da USP, tradutora de Fredric Jameson, norte-americano, marxista, herdeiro intelectual do britânico Raymond Williams -, escreve sobre como o esvaziamento dos Estudos se deu  através da diluição do seu caráter político. 

A apropriação neoliberal ficou evidente com os novos epígonos, o americano Grossberg, especialista em rock e cultura popular, e a britânica McRobbie, especialista em moda, estabelecendo o novo programa baseado na superação de uma identidade de classe. Aliás, segundo eles, não há mais sujeitos de classe nem ideologias. Aliás, ainda, a pós-modernidade, já, de resto, queimando as velas,  nega qualquer tipo de determinação, de meta-narrativa vinculante, como se tal negação também não fosse uma.

Suspeito logo quando alguém, querendo bancar o gênio da lâmpada , começa dizendo, superior:

“Não sou de direita nem de esquerda...”                                              


SRN                              

Raymond Williams é útil nos 90 anos do Globo


Os Estudos Culturais constituíram-se na Inglaterra, sobretudo com Raymond Williams, que escreve o texto fundador “Cultura e Sociedade’, nos anos 1950, para superar a crítica formalista que defendia a autonomia “superior” da arte sobre o mundo “inferior” da vida real, a concepção abstrata, metafísica, da arte, dissociada da produção material completamente desestabilizada desde a Revolução Industrial. A “alta cultura” foi uma tradição que se construiu, a partir do século XIX, em reação à Revolução Industrial que organizava a sociedade à base da máquina e do mercado.

Os Estudos Culturais também retificaram a crítica cultural marxista, a velha relação infraestrutura/superestrutura, pela qual a arte não passa de decoração da vida real. A cultura não é apenas reflexo, ao mesmo tempo em que é produzida também produz a realidade, portanto, é um meio de acesso próprio ao seu conhecimento e transformação.

Os anos 50 se explicam, pois vínhamos de imediato da II Segunda Guerra. Na sociedade dos meios de comunicação de massas, emergente, a dominação do capitalismo torna-se sutil, não se limitando apenas à propriedade e à coerção. Agora dispunha de meios de organizar a representação da experiência do que se viveu. A imagem passa a ser uma construção política a serviço do controle.

É muito divertido ver os elogios auto-referentes de “imparcialidade, objetividade e respeito à diversidade”, na comemoração dos 90 anos do Globo.

Só falta a crônica cheia de gordura do Pedro Bial, o “intelectual” das organizações Globo.

Nem é bom consultar o Caboclo Sete Flechas, aqui na 28, em Vila Isabel, pra saber o que pensa Raymond Williams.

SRN    

terça-feira, 28 de julho de 2015

Terra é mercadoria?


Hoje é dia do camponês. E Francisco Julião, advogado, organizador das famosas Ligas camponesas, é uma boa síntese gráfica de homenagem. Também uma lembrança pra Kátia Abreu, por sua vez, a síntese do modelo agrícola nacional, do agronegócio preocupado com o fim das vantagens comparativas do negócio da China.

Curioso é que foi justo o campo uma das desculpas da derrubada de Jango. O latifundiário gaúcho foi deposto por comunismo e logo em seguida o marechal Castelo Branco elabora o Estatuto da Terra e – não é piada – uma lei de reforma agrária e de desenvolvimento agrícola. Castelo jogou mais ou menos como o Tita, no maior Time do século passado: queria a 10 do Zico e quando o substituía, jogava muito – pra arquibancada. Como o próprio marechal, que o desprezava por considerá-lo “coisa do povo”, o binômio golpista segurança nacional/desenvolvimento econômico, aliás, nem sequer prestava atenção ao futebol, conforme, posteriormente, o faria em 1970.

O diagnóstico de Roberto Campos, ministro do planejamento de Castelo, não era muito diferente do do governo Jango. Indispensável uma reforma agrária, superando o latifúndio, pesado,lento, improdutivo, a fim de modernizar a agricultura, aumentando sua produtividade, e, em consequência, atualizando o capitalismo nacional. O negócio era tão bonito que se pensava até em uma classe média rural, consumindo a produção industrial urbana.

Um mundo perfeito, como se vê, não fossem as forças sociais que sempre atrapalham. Uma delas era a CRB, com este nome de sigla de time do campeonato brasileiro dos anos 70 do almirante Heleno Nunes, com mais de 100 clubes em disputa – afinal, “quando a Arena vai mal, mais um clube no nacional”. CRB era a confederação rural brasileira, em 1965, posteriormente denominada CNA, confederação nacional da agricultura. Numa palavra: latifundiários.

Talvez, o problema de Francisco Julião fosse não ter sido tão bom no lado esquerdo do campo quanto o marechal pra poder jogar no time do CRB.

Tudo está muito melhor explicado no texto da professora carioca e historiadora, Carolina Ramos, “A Confederação Nacional da Agricultura e o Estatuto da Terra: embates e recuos”, cujo link segue abaixo

SRN


segunda-feira, 27 de julho de 2015

Moncada também foi ontem

Além de Celso Furtado, ontem, também, foi aniversário do assalto ao quartel de Moncada que, em 26/07/53, inicia a Revolução Cubana. Não se nega os problemas de Cuba. Não cabe aqui tampouco um inventário. O que importa é a demonstração que a Revolução deu de que a América Latina não precisa viver permanentemente na subalternidade. Fidel, Camilo, Che Guevara aproveitaram as condições históricas que favoreciam a ação revolucionária. Hoje as condições são outras. Mas, a dignidade sempre é possível e  deve ser buscada por qualquer governo soberano. Celso Furtado tronou-se um marco e referência porque não se limitou ao comodismo pragmático, embora não fosse um revolucionário. 

O diabo hoje é que o diabo veste Levys Tsipras.


SRN


Celso Furtado, um "Longo Amanhecer"





Este brasileiro, que ontem faria 95 anos, é uma das maiores matrizes do pensamento nacional. Inconformado com uma divisão internacional do trabalho (DIT) que nos condenava à condição de fornecedores de primários, aliou-se, vindo da Guerra, ao economista argentino Raul Prebisch, na Cepal, uma agência da ONU feita pra ser irrelevante, pra jogar pra arquibancada do Sul a fim de iludir a versão do Plano Marshal que não veio, mas que ambos alçaram à fonte de produção do pensamento econômico latino-americano, ao propor a industrialização por substituição de importações na América Latina para superar o subdesenvolvimento de nossos países. Independente da crise do modelo e de todas as críticas, o fato é que Celso Furtado pensou o Brasil, não tinha complexo de deslumbrado vira-lata diante da falácia do “livre mercado”. 

Furtado acreditava na necessidade de profundas reformas estruturais, sem às quais nossos países não retomariam o dinamismo econômico.

Ser hoje brasileiro independente é profundamente revolucionário, com o noticiário cada vez mais semelhante aos anos 80, pedindo “austeridade”, “gastar menos do que arrecada, como uma família”, “não podemos ter fama de maus pagadores” etc.
Tudo isso está no filme de José Mariani, uma cinebiografia de Celso Furtado, “O Longo Amanhecer”, cujo link segue abaixo.

SRN


domingo, 26 de julho de 2015

Cristóvão é lento

Cristóvão é lento. Tomamos um sufoco no primeiro tempo, lá pela lateral-direita, com o Aírton perdendo todas, embora tivéssemos três volantes em campo. O moleque Cesar, no gol, com mais casca, fez boas defesas. No segundo tempo,Cristóvão, sempre lento, resolveu compactar o time, avançando as linhas e conseguimos manter a bola no campo do Goiás. 

Com um passe preciso do Guerreiro, golaço, Cirino!

1 x 0. 

SRN



sábado, 25 de julho de 2015

90 anos do Globo. E as Diretas Já?



Começou o panegírico: 90 anos de uma vetusta instituição. As imagens irão nos inundar com a dignidade e a firmeza da história do nosso século passada a limpo nas páginas de O Globo. Será que irão lembrar-se do dia 26 de janeiro de 84?

No dia anterior, em São Paulo, na Praça da Sé,  milhares reuniram-se, junto a políticos e celebridades, pra pedir eleições diretas à Presidência da República. O Estado de São Paulo, jornal conservador, liberal, igualmente defensor da livre empresa e apoiador do golpe de 64, entretanto, estampava a manchete principal, com clareza:

“Multidão vai á Sé para pedir eleição direta”

Enquanto isso, aqui no Rio, o Globo passava incólume, preferindo ignorar o comício, certamente por ir de encontro ao seu papel de disciplinado porta-voz do regime e, tal era o fato, que a manchete principal desse mesmo dia 26 de janeiro de 84 era a seguinte:

“Antônio Carlos: Bahia segue Nordeste e apóia Andreazza”

À ditadura militar-empresarial recente faltavam elementos que pudessem caracterizá-la como fascista. Terrífica, é certo, mas, não fascista. Entretanto, mexendo nos acervos digitais dos grandes jornais prum trabalho, vi como havia no Globo elementos da propaganda do Ministério do Reich para Esclarecimento Popular e Propaganda, encabeçado por Joseph Goebbels. O fascismo alemão considerava propaganda a doutrinação popular através de imagens a partir de uma ideia, e o Globo se prestou à exaustão o papel de porta-voz do "Brasil Potência', do 'Ame-o ou deixe-o" do período do "milagre econômico" de Medici, ao passo que um jornal como o JB, , aqui mesmo no Rio, igualmente conservador, liberal, anti-comunista, como o Estadão, em São Paulo, permitia o contraditório e dava uma lição de liberdade possível em uma ditadura.


SRN

segunda-feira, 20 de julho de 2015

Com o Peixe Frito, em Cabo Frio

Morei em Saquarema, nos anos 90. Retorno agora pra fazer o concurso de professor de História do município. Aproveitei pra dar um rolé em Cabo Frio, onde não ia também desde essa época. Nos anos 90, já estava bastante diferente de quando, adolescente, nos anos 70, acampava na praia do Forte. Hoje, então, além de proibido acampar, ficou com um jeitão da Barra. 

Valeu mesmo foi tirar uma foto com o Monstro Sagrado, o Maior Lateral Direito da História do Futebol, o Grande Leandro, Peixe-Frito, da Santíssima Trindade Rubro-Negra, que nasceu em Cabo Frio.

SRN





sexta-feira, 17 de julho de 2015

quinta-feira, 9 de julho de 2015

Ser social-democrata é hoje coisa de comunista


O que está em jogo na Grécia não é o pragmatismo de rotina nem as tabelas de escritório de contabilidade. O que está em jogo é a Grande Política, que, aliás, nada tem de revolucionária. Trata-se de fazer valer uma tradição inaugurada com a Revolução Francesa: a Soberania Popular.

A menos que o capitalismo chegou a um ponto em que, pra funcionar, é preciso cortar direitos, precarizar o trabalho e afastar a democracia como um estorvo. Chegou?

SRN


AE at home


quarta-feira, 8 de julho de 2015

SAUDAÇÕES RUBRO-GUERREIRAS


Outro time. Paramos a bola na frente, com Guerreiro (que é centroavante, fazendo um gol de oportunismo e armando o outro, com categoria, pro Everton) e o Emerson, pela direita. Compactamos, conseguindo fazer a triangulação em toques curtos, próximos, embora com dificuldade de sair mais rápido pela falta de um meio-campo (mas, quem tem hoje no futebol brasileiro?). Marcelo, sempre cheio de pernas, mas foi o melhor da defesa, ao lado do sempre firme Walace. Esse moleque Jorge vai botar o Armeiro no banco.
Agora, o Cesar,, outro moleque, o que pesa muito mais em goleiro, está completamente apavorado. 

2 x 1. Ganhamos no Sul após tantos anos.

SRN

Greece Zeppelin

SRN
https://youtu.be/hAzdgU_kpGo


30% pra quê?

A equipe econômica prepara uma PEC que aumenta de 20 pra 30% o orçamento federal à disposição do governo para usar onde quiser, preservados os percentuais da Educaçâo e Saúde. Levy propõe mudar a Constituição pra aumentar os recursos destinados ao pagamento de juros da austeridade.

A ironia, nessas horas, é pior que o deboche. Esse vírusaécio, que dá coceira e febre, mas que congela rápido, voltando à hibernação inútil, garante assim mais alguns momentos de chupa-sangue.


SRN 


Esquerda possível? Esquerda para o capital? E o Syriza?



Há vários institutos liberais, com seus “intelectuais orgânicos” produzindo análises da conjuntura. Todos concluem pelo óbvio, e, a julgar pela qualidade das cópias, o original era bem melhor. O problema é que Lacerda era católico pré-Concílio Vaticano II e não há muita chance de vê-lo baixar em nenhum terreiro de boa vontade disponível.

Felizmente, há análises críticas. Lendo-as, predomina o consenso de que o Lulismo foi um método de conciliação de classes que se esgotou. O reformismo foi até o possível, com a inclusão já começando a incomodar. A formalização do trabalho de baixa qualidade, o aumento do salário mínimo, crédito e habitação populares tornaram-se ponto de partida para quem os alcançava e expressavam um estorvo para quem estava acostumado com serviços baratos e, de carona, um acinte, porque implicava ainda dividir aeroporto e hotel fazenda.

O PT é hoje, para alguns, a esquerda possível. Para outros, a esquerda apta para o capital. Há também quem diga que defender a qualquer custo a Dilma é uma medida de contenção da direita. Outros já dizem que não faz a menor diferença, pois pra que derrubar a Dilma se ela entrega tudo o que o capital pede e que vírus anexos como Aécio cumprem a função exata de incomodar com espirros, febres e coceiras?

A Grécia, mais uma vez, como um marco. O NÃO à troika tem a força de mostrar que tudo é política. Acima de tudo que a grandeza da política está muito além da chantagem de contadores mesquinhos.

SRN 

terça-feira, 7 de julho de 2015

Ocimar, a indústria cultural e o esclarecimento como engodo das massas

Ocimar estudou comigo na UERJ. Era assíduo, costumava sentar bem nas primeiras carteiras. Chegava a perguntar se podia gravar as aulas. Se autorizado, botava o celular no suporte do quadro. Lembrei-me dele porque precisava de um esclarecimento. Então, resolvi mexer aqui nos arquivos de áudio pra ouvir uma das disciplinas mais concorridas da UERJ que era justo o “Corredor I”. A transcrição foi difícil, pois o celular, muito ruim, confundia o barulho da circulação com o que o Ocimar dizia. De qualquer modo é suficiente, sobretudo por se tratar de uma postagem de blog.



“Máximo, é o seguinte: a História é também um produto da indústria cultural. Regida por critérios produtivistas – classificação e padronização -, pode ser encontrada em diversos títulos em banca de jornal e distribuída por livrarias em edições com narrativas jornalísticas e, mesmo, ficcionais. Há verdadeiros sucessos de vendas como qualquer Paulo Coelho. Então, se é assim, se já que estamos no circuito de massas dos bens simbólicos, por que não concordar com Benjamin que via na arte reprodutiva uma possibilidade política de emancipação crítica? Não é melhor enfrentar as condições de produção que nos disponibilizam diversas modalidades de narrativa histórica, ao invés de um esforço por pureza da autonomia da arte como queria Adorno em sua rejeição absoluta da indústria cultural?”

A vantagem do Ocimar é que ele falava como se escrevesse, me lembrando o grande João Saldanha. Bastava copiar.

SRN

domingo, 5 de julho de 2015

Criacionismo


Troika de Valor de FHC



O referendo, que, com muita justiça, virou plebiscito, põe à Grécia, de novo, um marco histórico. O Syriza percebeu que a luta institucional não era suficiente, indispensável a mobilização popular.

Enquanto isso, FHC, no El País de hoje, escreve, à parte a chicana política, sua visão de futuro pro Brasil. Seguinte: nosso desenvolvimento consiste num Estado de agências reguladoras administrando a inserção nacional às cadeias de valor globais. Exemplo de coerência impecável. Continua o mesmo do desenvolvimento “dependente/subordinado”.


SRN

Golaço!

Não se trata da vitória do paraíso. Ao contrário, começam agora as dificuldades de um desafio de se reinventar a vida sem os balizamentos mesquinhos da austeridade sempre sangrando os povos.
SRN


Orlof


sábado, 4 de julho de 2015

Messi da Gama


Chi! Chi! Chi! Le! Le! Le!


Maju, nem sempre a caravana passa

Fazer História nos torna desagradáveis. Mesmo quando a causa é boa, conforme Hobsbawm que dizia que a pior coisa do trabalho do historiador é a falácia da neutralidade. Mais um caso de racismo. E, de novo, o tratamento sempre conveniente, agora às condições pós-modernas, exatamente no ambiente midiático. Maju é uma jovem negra que se destaca por aparições superficiais no JN. É a “moça do tempo” e, por isso, tem sido defendida, apontada como exemplo do talento da raça negra. De fato, ‘Somos Todos Maju”, mas não nos termos em tudo semelhantes ao que, recentemente, nos deu Daniel Alves, na Espanha, comendo a banana arremessada pela torcida de Madri quando ia bater o escanteio. Não demora e Maju, se não tomar cuidado, será a próxima estrela do casal Hulk e Angélica.

O racismo não é uma questão de caráter. Não pode ser exclusivamente combatido de modo a se buscar um culpado. Evidente, quem o comete, cometeu um crime.

Assim como foi historicamente construído, com ações objetivas coletivamente, conformando as subjetividades, tem de ser combatido igualmente com ações objetivas, coletivas, sociais, identificando, enfrentando e combatendo subjetividades racistas.

O problema não é deixar a caravana passar, enquanto os cachorros latem. Pelé fez isso o tempo todo.

Os cachorros também latiram na cara de um garoto negro de classe média há poucos anos, aqui no Rio, numa agência da BMW na Barra. E a BMW simplesmente pediu desculpas.


SRN


sexta-feira, 3 de julho de 2015

“Sobre o Conceito de História”, Benjamin

“Articular historicamente o passado não significa conhecê-lo’ como ele de fato foi’. Significa apropriar-se de uma reminiscência, tal como ela relampeja no momento de um perigo. Cabe ao materialismo histórico fixar uma imagem do passado, como ela se apresenta, no momento do perigo, ao sujeito histórico, sem que ele tenha consciência disso. O perigo ameaça tanto a existência da tradição como os que a recebem. Para ambos, o perigo e o mesmo: entregar-se às classes dominantes, como seu instrumento.” (BENJAMIN,1944:224)



Benjamin pensa a História numa modernidade em crise, o que significa fazê-lo – marxista que é – nos termos do conceito de crise de Marx, “a anatomia de um sistema”, com limites e possibilidades. E o recurso é o trabalho de memória. Ao menos, o que sugere utilizar através do que considera “imagens do pensamento”.

Trata-se de uma abordagem extremamente atual nas disputas de memória em sociedades de ditaduras recentes que experimentaram e experimentam “justiças de transição”.

A História muda. Seu papel social hoje é outro.

Ao final do século XIX, tornara-se central nas escolas, forjando o sentimento patriótico para o Estado-nação em acabamento. Era o imperialismo, os capitalismos monopólicos nacionais em breve se enfrentariam na morte industrializada da Primeira Guerra.

Um século e décadas após, a dimensão simbólica que remunera o capital transforma a História num dos seus bens mais rentáveis, conforme Beatriz Sarlo, em “Tempo Passado: cultura da memória e guinada subjetiva”. Uma contrapartida ao “apagamento” do lugar-comum pós-moderno do presente contínuo, da ditadura do presente sobre as demais temporalidades. Sucessão volátil de embalagens descartáveis do passado. “A máquina da memória”, “memória midiatizada”, segundo, também, Andreas Huyssen, a volatilidade acelerada comprometendo a memória, produzindo amnésia.

Como, então, parar pra pensar, ensejar o trabalho de memória?

A volatilidade, acelerada – vale repetir -, não deixa. As imagens mal se esboçam e já são substituídas.

Consumo midiático.

Presentismo.

Nenhuma questão?

O que impede que, a fim de enfrentar os termos postos pelo presentismo, a memória também não seja criticada pela análise da classe?

Ou 15 de março último foi o que disse o Globo?

SRN