Por Máximo
Este blogueiro preparava uma postagem sobre o uso do futebol, sobretudo da copa de 78, pela ditadura argentina. Havia visto uma reportagem na ESPN justo sobre o assunto, consultara os acervos digitais do Jornal do Brasil e da Folha de São Paulo em suas edições do dia seguinte ao do golpe ocorrido a 24 de março de 1976 e constatara como os golpistas sabiam da importância do futebol. Em meio à enxurrada de proibições, ameaças e penas de morte, expondo sem embuste tratar-se de uma ditadura, apenas uma autorização: a transmissão da partida entre Argentina e Polônia a ser jogada na Europa.
A realização da copa caracterizou uma operação de cinismo, tortura e morte. Massera, o representante da marinha na junta golpista, queria o controle da organização da copa. O exército, porém, sob o comando do outro golpista da junta, videla, encarregara o general actis, que acabou assassinado por massera, que, pôde, assim, botar o almirante lacoste à frente da organização da copa. Lacoste recebe a chancela de havelange - outro personagem, agora brasileiro, de um cinismo e indiferença que, em nada, o diferenciam de qualquer golpista, ditador, torturador, cúmplice, fosse sob qual bandeira nacional fosse. Um acordo de grande sordidez política: havelange garantia o mundial pra videla e massera e, em troca, estes permitiam que havelange e a fifa faturassem e lucrassem o que quisessem e conseguissem. Tudo a poucos metros da tortura: o campo do River Plate, de onde se ouviam os gritos da torcida, localizava-se apenas 700 metros da escola de mecânica da marinha - o centro mais terrífico da ditadura portenha.
Toda história é, de fato, história contemporânea, como nos ensina Sérgio Buarque reproduzindo o italiano Croce.Buscamos no passado um aspecto que nos ajude a compreender a nossa realidade. Não apenas os "historiadores são presa fácil de seu tempo", mas também os epígonos de havelange.
O maracanã do blatter que o governador outorgou acaba de ter o último obstáculo removido. Cumprindo mandado judicial, a tropa de choque invadiu hoje a aldeia maracanã e removeu à força parte dos índios que não aceitaram o aluguel social nem a promessa da construção futura de um centro cultural indígena, ali perto, na Quinta. Gás lacrimogênio, spray de pimenta, arrastão - a confusão se sucede na proporção dos sofismas: Marcelo Freixo diz que há uma mandado judicial que deveria ser cumprido, mas pede prudência na execução; os índios divididos: parte resiste, parte cede descendo pela escada encostada ao muro pela polícia; a defensoria pública acusa a polícia de truculência, argumentando que havia negociação; a polícia acusa parte dos índios alegando que teriam botado fogo numa oca improvisada que poderia alastrar-se e que agiu com a força necessária; a imprensa informa que a rede social de apoio aos índios fecha a Radial naquele tom típico de indignação pasteurizada.
Os fatos não podem ser entregues a si mesmos, porque não são auto-explicáveis. Indispensável saber que não se trata de uma mera questão legal. Qual o problema atrás da lei?
O discurso dominante e acrítico sempre tem como premissa a manutenção da ordem e a fragmentação da demanda popular. Uma censura velada, justificando a repressão, de que a "radicalização" partiu de manifestantes que nada tinham com os índios. Como se a "limpeza" urbana, apenas para atender aos interesses dos epígonos de havelange de videla, não fosse um problema carioca, mais do que carioca, brasileiro. Como se o racismo manifesto outro dia numa concessionária emergente da barra contra uma criança, não fosse, mais do que carioca e brasileiro, um problema humano
Videla, massera, havelange, blatter, marin, cabral: 1978 ou 2014?
SRN
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