Por Tadeu dos Santos, graduado em Ciências Sociais e Direito pela UERJ
Buraco de búlica na terra ainda úmida da chuva da véspera, fendas abertas no pião com a fieira ainda pendendo no ar, pelada no campo da Luiz de Castro, pique-bandeira e carniça à noite pra fechar o dia.
As idas e vindas do meu avô ao botequim. As quedas nas bicicletas alheias, a bola de outrem pendurada no arame farpado. Tudo isso acompanhado, claro, da novela na TV do vizinho. Vês? Infância e alheio são meio que sinônimos para mim.
Bloco de sujo na João Ribeiro, ensaio da Caprichosos visto do alto do Viaduto. Preto contra branco no 3l de dezembro, casa apinhada de crianças no natal.
Pantalona cor-de-rosa sobre o sapato Cavalo de Aço. Pipoqueiro na esquina, baile aos domingos e os olhos postos na menina do beijo primevo.
“Moço me dá uma carona” pra descolar o transporte pra escola, arroz com peixe na merenda, ping-pong no recreio e a libido. Ah! A libido.
O presente de natal que só vinha no 27 de setembro, junto com o “Já tá crescidinho, hein!!!” ouvido na fila que não andava nunca.
Um pouco mais adiante o vinil na vitrola tocaria nogueira e Martinho e Paulinho, As dores do amor também conheceriam sua trilha sonora, mas aí a infância já dobrava a esquina.
Asfaltaram as ruas, levantaram espigões, proliferaram shoppings, ergueram muros e aqueles anos perderam sua “fisicalidade”. E assim, tal e qual, os resistentes do Fahrrenheit 451 de Truffaut/Bradbury sou o depositário fiel e último desses tempos em que o mundo era inteirinho meu.
Foi bem aqui que meus lábios colaram aos seus, logo ali a tampa de um bueiro mal arrumado ceifou a ponta do meu dedão, era dali que eu arrancava com a bandeira e mais adiante ficava o sítio onde jogávamos carniça.
E eu era o senhor desses domínios.
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