segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

A volta da democracia representativa



A esquerda não deveria enfrentar a direita no campo do ressentimento. O argumento que exige reflexão não pode nada - ou pode pouco - contra ataques que capturam a dor e a frustração imediatas, cotidianas. Quando tenta, fica marcada por populista.

Bolsonaro foi uma invenção muito bem urdida, estratégica como um plano militar. Ao poste trumpista em versão cabocla bastava atuar na campanha como um perfil de facebook. O "kit gay", inventado pela pastora-ministra da goiabeira, dominava as "postagens", alternando, aqui e ali, com alusões ao "posto ipiranga" do liberalismo mais descarado. Mas, mesmo tamanha futilidade leviana nem sequer era necessária: as eleições não passaram de um plebiscito acerca da volta do Lulopetismo.

Eis o grande erro. O sentimento antipetista, muito bem construído, com a lava-jato generalizando para toda a esquerda a corrupção governista, exigia que o protagonismo do campo popular e progressista fosse deslocado, entregue, por exemplo, ao Ciro Gomes, um mero centro-esquerda. 

O PT, porém, só sabe fazer política em condição de hegemonia. E o poste trumpista ganhou fácil. 

Agora cabe reconhecer que a nossa democracia representativa não padece apenas de problemas novos, em comum, de resto, com o que se verifica no mundo pela mobilização política das redes sociais. Temos instituições liberais bastante tensionadas, capazes de nos levar à suspeição, até o ponto de não demonstrar muitos escrúpulos - e suicidarem-se, uma vez demonstrada a incompatibilidade entre o Estado do Bem -Estar e o PIB. A desmoralização de Moro não tem maior inportância a não ser para as apostas sobre até onde irá o Luis Bonaparte da Barra.

Nova realidade, o discurso também deveria ser outro. E, aí, cada vez mais notória a apreensão que Lula livre causa entre certos setores da sociedade. 

Lula livre hoje é o melhor teste para a democracia representativa reafirmar o caráter liberal de suas instituições.

SRN

segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

Chico Alencar se despede com dignidade

Não voltará ao Congresso. Mas, deve continuar como boa fonte, sobretudo para jornalistas como Bernardo Mello Franco. As citações curtas de Alencar são resumos exatos do que ocorreu. 


"O voto raivoso", no qual se traduziu a antipolítica associada às contradições do período do Lulismo, acabou por generalizar-se à esquerda. "A esquerda ganhou pecha de corrupta. A extrema-direita conseguiu canalizar a indignação da sociedade."

Quem entendeu bem os novos tempos, com movimentos de massa destitutivos, via redes sociais, produziu um personagem cuja função era capturar as consequências na hora em que fossem institucionalizadas. Novamente as palavras precisas de Alencar: "a esquerda perdeu as disputas de ideias na sociedade." Concordo também com ele que nada é definitivo. Aliás, a história acaba de provar que continua viva. Seu fim, anunciado quando da queda do muro de Berlim, com missa de sétimo dia para a dissolução da URSS, não encontrou a paz de espírito na democracia representativa, paradoxal e ironicamente ameaçada pelo reencantamento do mundo numa espécie de Jesus trumpista com versões ramificadas e específicas.

Aqui, no que nos diz respeito, teremos uma versão farisaica, cujos sinais já são mais do que evidentes. Do "baixo clero" à presidência, Bolsonaro poderia ser qualquer coisa, bastava-lhe o roteiro adequado, desenhado justo no traço que figurasse a antipolítica percebida como o maior ressentimento popular. O achado da extrema-direita foi tatuar as contradições do Lulismo nas costas da esquerda e satanalizá-la. Bolsonaro, como se vê, é uma seita, ungida em plebiscito antipetista e versão abençoada pelo bispo Macedo, enquanto Lula, do outro lado, preso, é uma ideia.

A questão é saber quanto tempo durará a capacidade da seita de sustentar a imagem do ídolo. É bom lembrar que neopentecostal costuma quebrar imagens...

SRN




sábado, 15 de dezembro de 2018

O filho deveria ler O Globo online no Chile

O cônsul chinês, hoje em O Globo, mandou um recado elegante ao presidente eleito. Em descrição minuciosa, expõe atividades, recursos, áreas e projetos, na escala à altura dos dois paises, concluindo com a intenção manifesta de que nada os perturbe no futuro.

Espero que, antes do pai, o filho encontre um tempo no Chile, em meio aos afagos da recepção dos herdeiros de Pinochet, e leia O Globo. Agora, online, fica fácil. Mas, o texto é muito grande, excede o número de toques de um tuíte. Seja como for, ainda que em mandarim traduzido para o digital, o cônsul certamente enfrentaria a má-vontade do chanceler brasileiro. O filho não gosta de nada que cheire a comunismo. É provável que, nem o embaixador Ernesto, seu futuro assessor, o convenceria sequer a dar uma olhada no título do artigo. Sabe muito bem, preparado que está a ler nas entrelinhas e perceber ciladas, que o marxismo cultural é capaz de tudo, até de travestir-se de apelos a negócios da china. Do que precisamos mesmo é da "democracia direta" via facebook do pai, rezar para a alma de Pinochet e pedir a Jesus que apareça mais vezes em outros lugares do nosso Brasil e não apenas no alto do galho da goiabeira do quintal da casa da Ministra.

SRN


sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

O Baú da Felicidade não abre mais na Globo

A insistência afirma-se debalde, quando o destino está selado e terrífico.Debalde, porque me lembrei de Graciliano. Em vão, em português mais claro, já que de nada parece adiantar a trégua: devem estar encardidas as bandeiras brancas dos emissários enviados pelo Globo ontem, quinta, 13/12. A data também desagrada. Afinal, ao destinatário da embaixada a ditadura que o AI-5 consagrou só errou por não ter assassinado na escala necessária para limpar do perigo vermelho o nosso Brasil, com Deus acima de todos do alto do galho de uma goiabeira caipira.

Até o Veríssimo, muito constrangido, passou o pano encardido, tentando cobrir a vergonha apelando para um histórico cartunista do Post. Merval, oficial e porta-voz de sempre, deixando para Sardenberg, entretanto, a ideia síntese da casa:

"(...) ao menos, por ora, é votar a agenda do presidente, deixando claro que é a agenda dele nos casos de temas mais controvertidos. Algo assim: olha pessoal, a gente não gosta muito dessas reformas, mas o presidente está pedindo..."

E agora que o baú da felicidade foi aberto em outro canal, igualmente poluído como o tietê, com Bolsonaro anunciando que revisará (vejam como o "capitão" sabe usar eufemismos) as verbas de publicidade da Caixa Econômica e do Banco do Brasil?

SRN


sexta-feira, 7 de setembro de 2018

Bolsonaro não é Gandhi

Clássicos da Política, de Francisco Weffort, faz parte da bibliografia introdutória em história e ciências sociais. Clássico é clássico justo porque continua válido. E Hobbes, inglês do século XVII, integra o volume um com referências a Leviatã. Primeiro contratualista, enxergava o estado de natureza como guerra civil, reconhecia a necessidade do Estado, absorvendo prerrogativas, regulando a comunidade, reservando-se a violência. Bolsonaro, na Aman, pode não ter lido Hobbes, ou se leu, devia achá-lo literatura barata. Segundo o ex-capitão e deputado, todos temos direito de acesso livre às armas. Não é só o bandido no ônibus, mas também os passageiros, prontos para reação necessária. Mas, o que importa agora é repudiar a violência como recurso político, sem, entretanto, abrir mão de contextualizá-la e falsificar a realidade. A facada em Bolsonaro pode ter sido apenas uma ação isolada. O fato, porém, não é, faz parte de uma construção, um discurso social com Bolsonaro em posição de protagonista. O desequilibrado que o atacou está imerso no ambiente de ideias políticas que pregam o fuzilamento de Fernando Henrique, a suspeição quanto à veracidade dos tiros na caravana de Lula, a limpeza à bala dos esquerdopatas do Acre para a Venezuela.


Bolsonaro não é Gandhi. Ou a camisa preta com desenho de um fuzil de um dos seus seguidores em vigília e oração na porta do Albert Einstein lembra a bata do líder pacifista assassinado?

SRN

quinta-feira, 6 de setembro de 2018

O Globo não será um NYT

Assinante de O Globo, decidi-me pelo impresso, diário. Julguei que a cobertura dos porões clandestinos de Temer representava um marco, muito mais do que a contrição revisionista pelo apoio à ditadura, em editorial que não cansa de ser usado por Bolsonaro, de resto, como ironia. Não vejo como, a propósito, na cobertura diária mais do que evidente, da piada que parte dos cariocas inventou pra se divertir com o interior paulista receber de O Globo o tratamento que o New York Times conferiu ao original norte-americano. "Pode ser um conforto limitado nesta época caótica, mas os americanos devem saber que há adultos na sala" é parte do trecho de fonte anônima do governo do Donald que o NYT resolveu publicar pesando o interesse público e concluindo "a única maneira de entregar uma perspectiva importante aos nossos leitores." E o que faz O Globo? Diante de um irresponsável, leviano, até infantil, de que é exemplo o episódio da "metralhadora" no Acre, prestes a ameaçar ir ao segundo turno, prefere investir contra a UFRJ apenas para não afastar-se do manual de regras que obriga as pautas a trazerem sempre a criminalização da política e a desqualificação de quem discorda de que o Contrato Social não cabe mais no PIB. Digamos que haja, de fato, crítica a ser feita à reitoria da UFRJ. Mas, certamente, nada tem da leviandade que o jornal demonstra tentando imputar a filiação política do reitor ao PSOL, bem como aproveitar também o incêndio do Museu Nacional ao fato deste não estar entregue exclusivamente ao mercado.
Certo, O Globo é uma empresa, com interesses de mercado. Ocorre que trata-se também de um tipo muito especial de empresa, a respeito de cuja mercadoria podemos dizer que é muito melhor comerciada nos termos embalados pelo Times, ou para recuarmos no tempo, aqui mesmo na nossa Cidade, no clássico JB, igualmente liberal. 
Ciro não é Brizola, cuja presença faz falta pela estatura em meio a tantos nanicos de um contexto mesquinho no qual a Bíblia é mais citada em política do que a Constituição. Seria bom vê-lo eleito. Como seria bom também em que, mudada a realidade, cabe o revisionismo da má avaliação legada pelo Lulismo conciliador. Ou "Lula livre" ou "Lula mito". Cassada a candidatura, negada a liberdade, Lula alimentará o próprio mito, "virando cada vez menos uma pessoa e mais e mais uma ideia", preso em Curitiba. Não admitirá ser substituído na chapa. Pouco importa a vitória de Haddad. Ou "Lula livre" ou Lula na oposição, preso, até sua prisão constituir um fato político insuportável, inviabilizando o governo de quem quer eleito. Para o Brasil, "Lula mito" é melhor do que a candidatura de Haddad. Um questionamento e uma trava ao avanço de uma ordem autoritária, tirante à barbárie. Já ajuda.
SRN

sexta-feira, 31 de agosto de 2018

O debate sobre as "fake news" está correto?

Com a escala dos meios digitais, a imprensa-empresa perdeu o controle de pautar o debate público, e o puritanismo farisaico com "fake news" é a desculpa conveniente pra bloquear qualquer opinião que não tenha o mercado como prioridade . 

Ou acaso não se trata de "narrativa" única desqualificar quem recusa aceitar que o Contrato Social da Constituição de 88 não cabe mais no PIB?

SRN

quinta-feira, 30 de agosto de 2018

Ciro abandona a ambiguidade

Ter uma posição progressista hoje equivale a acumular mais um problema: a suspeição de ser um "influenciador" assalariado do Lulismo.

Brizola tinha razão quanto à existência de uma esquerda de que a direita gosta.

Ciro - aspirante, de resto, a candidato do trabalhismo histórico - faz o movimento correto, ao dirimir quaisquer dúvidas relativamente ao eleitorado de Bolsonaro. Sua ambiguidade incomodava. Parecia que apostava em uma verossimilhança que conta muito em contexto novo de peso eleitoral das redes sociais. Agora usou o estilo agressivo na direção justa. O político antes era um sabonete que precisava ser bem vendido. Hoje basta a imagem em jpeg da embalagem escaneada e publicada para as curtidas da bolha e dos comentários de ódio. Ciro fez POLÍTICA (assim mesmo, em caixa alta), quando reconhece e diz com todas as letras que o eleitor de Bolsonaro quer um país sob um Estado que aparte, discrimine, torture e mate.

     SRN

terça-feira, 28 de agosto de 2018

"Influenciadores"

A rua Ceará mudou muito. A Quinta já ajustou-se, com os seus históricos espaços profissionais bem repartidos e de acordo com a diversidade.

Vindo de Vila Isabel, atravessando a Radial, tendo de passar por São Cristóvão rumo à Linha Vermelha, o motorista pode calcular a surpresa das vestais sem mácula que frequentam as redes sociais e que reforçam a cruzada contra a invasão do algoritmo pela "agenda de esquerda".

A canalha comunista quer fazer do digital uma Quinta da Boa Vista. Até na tabela de preços: 1.500,00 para "influenciadores" lobotomizarem os cérebros dos brasileiros conectados.

Por tabela, resolve-se também outro incômodo. Evita-se imprimir qualquer coisa que atente contra a campanha da "reforma da Previdência", do  "ajuste fiscal" e da "atualização das relações de trabalho".

Resta que o que sabemos só pode admitir que o Contrato Social já não cabe mais no PIB. E mil e quinhentos reais, de resto, emulam alguma coisa de salário mínimo, entulho trabalhista com aparência de anacronismo varguista...
   

sexta-feira, 24 de agosto de 2018

Poder moderador ou inadequação de generais no dia do soldado?

As FFAA resolveram, institucionalmente, retomar o controverso papel histórico de poder moderador ou as manifestações do comandante do Exército e do Ministro da Defesa, hoje, são apenas opiniões inadequadas? 

Qualquer resposta comprova a fraqueza do presidente que temos. 

Parece que a hierarquia e a disciplina, pressupostos militares consagrados e que submetem constitucionalmente generais perante o Presidente da República, chefe maior das FFAA, não fazem parte do roteiro de cerimônia militar na qual Temer esteja presente. 

O comandante do Exército fez do discurso do dia do soldado um manifesto de crítica política. E confuso - o que ainda é mais constrangedor. Não explica o general como podem os demais atores sociais cumprirem a parte que lhes cabe, desonerando as FFAA, sem uma visão do problema do IDH carioca que não passe pela diversidade de enfoque e propostas que são, por definição, ideológicas, uma vez que traduzem ideias de mundo distintas. 

E quanto à lembrança de uma métrica para aferir quem merece mais a honra nacional entre os que são abatidos pela violência que levou justo Temer à "jogada de mestre"? Será que tal disputa de fundo de poço também não desune, fragmenta e isola? 


A propósito, quem discursa por último é o presidente.

SRN

quinta-feira, 23 de agosto de 2018

Miscelânea política?

O cenário aparentemente confuso, expresso nas primeiras pesquisas, não demonstra falta de educação política. A população já definiu um quadro bastante nítido: a antipolítica não exclui uma espécie de um novo "pai dos pobres". 


A parte que Lula encarna está longe de representar Vargas, cuja ação definiu, com instituições, o Brasil contemporâneo, em função do qual, até hoje, todos temos de nos posicionar. Entretanto, assim como Vargas, desqualificá-lo como "populista" (há historiografia relativamente recente, sobretudo na UFF, de crítica ao conceito pejorativo uspiano) é subestimar a população que sempre soube - e sabe - distinguir entre manipulação e interação. Lula permitiu o acesso popular às ofertas do capitalismo, ainda que subalternamente (revolução, certo, é outra coisa, bem longe do Lulismo).

Já a antipolítica, fruto do ceticismo com a experiência da democracia representativa que se seguiu à Nova República somado à escala da corrupção e à intensificação da criminalidade urbana, faz de Bolsonaro, político profissional há mais tempo do que capitão, a alternativa autoritária típica de quem quer uma solução rápida e simples para o desespero.

Lula e Bolsonaro fazem parte do mesmo "sistema" tão rejeitado. Ocorre que passam incólumes não por ignorância popular, mas por pragmatismo, retrato realista do que somos e que não esconde, de resto, aquilo que não é agradável reconhecer: em meio à antipolítica, há um segmento da população que deseja um Estado que discrimine, torture e mate, como na ditadura militar.

SRN

terça-feira, 14 de agosto de 2018

"Um país com mais armas e violência" do que imaginava Adoniran



Conforme os gráficos do Ministério da Saúde, divulgados na reportagem de hoje de O Globo, Um país com mais armas e violência, a leitura relevante permite estabelecer relações diretas entre regulação e homicídios.

Antes do Estatuto do Desarmamento (2003), em apenas um ano (1999-2000), um salto abrupto, a inclinação do gráfico quase se transforma numa ortogonal, indicando a progressão exponencial, absurda, de homicídios. 

Após uma queda igualmente vertiginosa, verificada no outro gráfico, o de novas armas, após o Estatuto, já a partir de 2004, começa uma lenta ascensão, com um leve recuo entre 2005-2006, para um comércio intenso alcançando, entre 2014-2015, praticamente um paroxismo. 

Comparadas as respectivas e correspondentes temporalidades, os gráficos levam à conclusão evidente de que há uma relação direta entre o aumento dos quantitativos de armas e de homicídios, de que são exemplos os dados do ano anterior (1999-2000) e posterior ao Estatuto (2003), quando o número de homicídios se estabelece num patamar muito alto, tributário ao elevado estoque de armas para pessoas físicas. Entretanto, o Estatuto, se não impede o comércio intenso de armas, ao menos impõe severas restrições ao seu uso, conforme indica a estabilização, embora alta, dos homicídios, restrições especialmente significativas neste momento de vigência de uma pauta reacionária, de fariseus da antipolítica, estimulada pelo investimento na desilusão do senso comum com o processo democrático combinada ao acirramento da criminalidade urbana 

Na mesma página, uma outra reportagem com as propostas dos presidenciáveis para o tema. De resto, demagogos não causariam problema maior, se limitados àqueles cujo traço nas pesquisas revela a resposta irônica ao plágio com as siglas alheias. Irresponsável e leviano, entretanto, o candidato com alguma viabilidade que, diante de tal quadro, prega o faroeste caboclo. 

Seria razoável imaginar que o eleitor da classe média carioca, devidamente armado, teria a sua casa como um novo alvo: certamente aumentará o número de roubos, com violência e morte, para, junto com o produto roubado, exigirem também a arma de proteção da família.

SRN

sexta-feira, 3 de agosto de 2018

Bolsonaro não ilude como bufão

Há semanas, em O Globo, Veríssimo escreveu que Bolsonaro é o candidato que não engana e quem vota nele quer mesmo um Estado que exclua, torture e mate, como na ditadura militar. 

O Roda Viva, pois, era mais um "like". 

Bolsonaro certamente combinou com a própria assessoria os "memes" que iria fabricar no centro da roda e que repercutiriam no reforço do personagem autoritário bem ao gosto dos seus adeptos. 

Está na hora de acabar com a ilusão de bufonaria. E é o papel da Imprensa. 

Bolsonaro e seus eleitores são impermeáveis a quaisquer argumentos. Expô-los à razão nunca funcionou em circunstâncias históricas semelhantes, dominadas pela truculência e sentimentos baratos e fascistas têm sucesso justo porque investem na vingança - facilitário sempre conveniente à corrupção, violência e antipolítica em que vivemos. Bolsonaro não pode usar, como quer,  as liberdades públicas para, primeiro, ameaçá-las, como faz agora em campanha, para, adiante, matá-las, caso eleito. 

Vida que segue, como dizia o grande carioca por afeto, João Saldanha...

SRN




domingo, 22 de abril de 2018

A continuidade do Estado do bem-estar

Corrupção e violência fazem parte hoje da agenda do chamado "Estado do bem-estar", cuja construção vem desde 86, com a eleição (aliás, não suficientemente explicada como deveria) para a constituinte e, ao final, a própria Constituição de 88. Lula fez parte deste processo, deu a sua contribuição que hoje só se ampliaria se não insistisse na versão, lamentavelmente, encampada por Boulos, de que não entende nada quem vê na sua prisão apenas uma disputa eleitoral e não um um risco à democracia. O desmonte do projeto do Estado democrático de direito - soberania, cidadania, respeito à dignidade da pessoa humana, ao valor social do trabalho, da livre iniciativa e pluralismo político - vem bem acondicionado, embalado para presente e com cartão manuscrito onde se lê: "a Constituição não cabe mais no PIB".

O risco, que é uma possibilidade, vem de outra fonte, está na expansão de uma direita agressiva e retrógrada, pouco a pouco referência para a insegurança e o medo cotidianos dos que vivemos, por exemplo, na nossa Cidade. 

A corrupção também. Descurada, considerada resquício farisaico que frequenta a mentalidade mesquinha de classe média, vale questioná-la, impondo duvidar da tese da falta de compromisso com a moral de uma ordem que se quer superar. Certo, corruptos são a autoridade e o empresário, cúmplices. Expropriação é outra coisa, quando praticada em favor da hegemonia que libertará o povo brasileiro. 

Creio que, neste ponto, amadurecemos.

SRN


sexta-feira, 20 de abril de 2018

Invertendo a seta do tempo

O futuro não é mais o destino, como, aliás, já queriam os pós-modernos. O vídeo da Fapesp, cujo link segue abaixo, evidencia uma possibilidade em poucos minutos agradáveis de assistir. Pois muito bem:
O que caracteriza o tempo? O que o define?
Sabemos o que é o tempo, podemos senti-lo, mas falta a definição que só pode vir da física que, adrede, não se recusa.
Entropia – eis a palavra para o fenômeno verificável empiricamente, pelo nosso sentimento, em substituição às palavras que não temos. Entropia é a desorganização, o enfraquecimento, a perda da capacidade de se manter estável. A exposição dá-se em corpos cujas temperaturas sempre passam do calor para o frio, da integridade para a fragmentação. Trata-se de um fenômeno irreversível: um copo de café perde calor, esfria, não volta a esquentar. Após jogá-lo fora, desequilibramos o copo à mesa, cai e, quebrado, não volta a integrar-se a partir dos seus cacos. Entropia.
O sentido do tempo, sempre para o futuro, é explicado, portanto, pela entropia.
Ocorre que, em sistemas microscópicos, formados pelos chamados “spins’, a organização destes elementos pode alterar a passagem habitual da temperatura em contato do quente para o frio. Uma configuração determinada, nesta mesma escala, pode fazer o “spin” frio transferir sua temperatura ao “spin’ quente, invertendo, assim, a linha do tempo, sem alterar, de resto, as leis da termodinâmica.
Observa-se também, em tais condições de laboratório, os "spins" possuindo o dom da ubiquidade, estando em dois lugares ao mesmo tempo. É um problema, sobretudo, se se conseguir resolver a escala e obtidas as condições necessárias, em que, aos "spins", pudéssemos nós, humanos, substituí-los. Na seta invertida do tempo, viajando, poderíamos, com a nossa massa, ocupar dois lugares ao mesmo tempo no espaço? Aí, então, seria, de fato, uma maravilha. Do ponto-de-vista político, estaria cientificamente justificada a cara de pau.

SRN

quinta-feira, 19 de abril de 2018

Interesse público e o novo ciclo de ouro do petróleo



Um exemplo objetivo do interesse público está na exceção ao princípio da exclusividade em que o legislador, em virtude dos imprevistos da dinâmica da vida aos quais o poder público tem de atender, garante no ano civil do orçamento em execução a contratação de operações de crédito por antecipação de receita.
Reparem a dependência da qualidade, do espírito público do governante. Trata-se justo da parte que cabe ao indivíduo na história a partir das condições dadas.
Um governador pode, por exemplo, antecipar receita dando como garantia a receita futura do seu estado. Aqui, no Rio, um novo ciclo de ouro do petróleo, já se especula o recurso. Significa antecipar dinheiro vendendo o futuro mediante ágio. Isso tem de ser muito bem pensado, considerar relevância, urgência e, sobretudo, capacidade de fazer a melhor operação para o interesse público a ser traduzido em água, esgoto, políticas públicas de educação, saúde e segurança.
A atuação do Ministério Público do estado será cada vez mais bem-vinda.
SRN 

terça-feira, 17 de abril de 2018

Política pulverizada é opinião


Política pulverizada é opinião, sem os compromissos da prática vinculada a movimentos e partidos. Não se trata de quem a tem na condição de integrante, que pode, no íntimo, discordar, apresentar o que pensa se houver oportunidade, mas é só isso: a militância o espera.
Sempre releio Graciliano. E o trecho adiante está no início de Memórias do Cárcere:
“Tendo exercido vários ofícios, esqueci todos, e assim posso mover-me sem nenhum constrangimento. Não me agarram métodos, nada me força a exames vagarosos. (...). Posso andar para a direita e para a esquerda como um vagabundo, deter-me em longas paradas, saltar passagens desprovidas de interesse, passear, correr, voltar a lugares conhecidos.”
SRN



segunda-feira, 16 de abril de 2018

O engodo da antipolítica


A antipolítica nem sequer é uma estratégia nova. Lembro-me, bem recente, do Enéas. Mas, desnecessário recorrer à caricatura. Faz parte do próprio sistema político, com personalidades que o encarnam reservando à vergonha o farisaísmo da justitificativa da vida que levam.  Ampliando o recorte e abandonando a caricatura, tivemos mesmo em 89, na nossa primeira eleição direta para presidente, após a ditadura, Fernando Collor e Lula decidindo o segundo turno.

O “caçador de marajás” era filho de senador, neto de Ministro do Getúlio, ele próprio ex-prefeito, ex-deputado  e ex-governador da periferia política, por isso, desconhecido e apto ao super-herói midiático que vinha ao encontro do desespero nacional decorrente das expectativas frustradas de uma Nova República articulada para a transição democrática e que acabara em José Sarney e hiperinflação.
Líder sindical das grandes greves do ABC,  símbolo da redenção do povo no poder, fundador do PT, ex-candidato a governador, deputado federal constituinte, Lula ainda não havia dito - talvez por conhecê-lo há pouco por dentro - que o Congresso era uma escória composta de trezentos picaretas, todavia, não pensava muito diferente e estava ali, diante do invejoso Collor  que não tinha um equipamento de som como o dele, para enfrentar o sistema encarnado no engodo disfarçado de “caçador de marajás”.
Como se vê, a antipolítica é um recurso eficaz. O contexto hoje, aqui e no mundo,  é outro, e a rejeição à política como um espaço da ladroagem piorou a um ponto, com estímulos perigosos à disseminação de práticas fascistas, que exige responsabilidade das lideranças e forças políticas na busca permanente da relação sempre difícil, tensa, que não se esgota em palavras de ordem, tampouco no facilitário oportunista da antipolítica, entre liberdade e igualdade.
Bolsonaro é um risco não pelo eleitorado que sempre representa, mas pela esperança que passou a encarnar. Embora nada sendo de antipolítica, deputado que é há quase trinta anos, reflete um problema negligenciado pelas forças progressistas por menor, caudatário, quando não sobrevivência de um anacronismo moralista. Refiro-me à corrupção e à violência.

Não é fácil ter de reconhecer em uma experiência política, ainda que de baixo reformismo, a corrupção como a fonte de uma estratégia em que os meios não mereciam respeito, “instrumentos de classe”, perante fins de hegemonia com o objetivo de “resgatar o pobre”. Gostaria de acreditar tratar-se de uma página virada. Entretanto, a história não é mestra da vida, e, em política, nada é garantido e está dado de uma vez por todas.
Vivemos  uma conjuntura em que a violência, sobretudo na nossa Cidade, e a corrupção, generalizada no sistema político, exigem uma dimensão de coerção e controle legalmente disponível no monopólio da força weberiano que se encontra no fundamento do Estado democrático de direito da nossa Constituição Cidadã de 88.  As forças progressistas têm dificuldade com a coerção, como se o seu uso implicasse descurar as causas sociais. Compreensível. A Revolução permanece um mito. O problema é que, na hipótese remota de Bolsonaro presidente, ele não terá os escrúpulos que outros tiveram, sem base política para governar, de tentar o apoio nas FFAA e na preparação de uma recidiva ditatorial. Um risco, de fato, pois que proporcional à esperança que incorporou e que certamente se frustará quando virem que se trata de mais um engodo da antipolítica.
SRN

sexta-feira, 13 de abril de 2018

O interior da Guanabara

O interior da Guanabara é muito grande. Do campo que se estende da faixa do interior paulista (desculpem-me o pleonasmo) até o sul da fazenda é compreensível a breve superioridade do 'curingão". Trata-se de uma espécie de Goiás estendido com variação de sotaque. Quando estive em Pirinópolis, a imagem estava dada do que quero dizer: uma pick-up Mitsubishi com um par de chifres no capô e dois berrantes como retrovisores, um de cada lado (fora o som estourando Leandro&Leonardo os paralelepípedos da cidadezinha do tomate inscrita na memória do ciclo do ouro goiano).
Como se vê, a explicação da pesquisa do datafolha, publicada pelo Globo, não precisa de muita exegese.
SRN

Um Tio Padre


Eu tive um tio padre, irmão da minha mãe. Estudou no São José, entrava no Seminário (acho que ali no Rio Comprido), saía do Seminário, e, não fosse pela minha Tia, firme e forte aí até hoje, não teria sequer se graduado em filosofia. Mas, o fato é que acabou padre, andou pela Bélgica, França, Barra Mansa, Mogi das Cruzes (no interior paulista, desculpem-me o pleonasmo), morreu, recentemente, em Juiz de Fora, após uma temporada de monge, Irmão Cirino, o codinome que adotara, onde o conheci melhor, ali no São Bento,nos anos 2000. A vista da Baía de Guanabara, daquele penhasco privilegiado do Mosteiro quando eu ia visita-lo aos sábados, era uma maravilha, justificava a visita. A vocação pro sacerdócio foi alguma coisa certamente muito divertida para o meu avô, português, açougueiro, daqui da Tijuca:
“Meu filho, eu já tenho três saias, e você ainda vai botar mais uma.”
Hoje, meu avô, absolvido pelo anacronismo do neto, padeceria na brasa do churrasco da patrulha. Juarez, aliás, foi porque meu avô gostava do tenentismo e, por isso, batizou o filho.
Fiz as ilustrações ( uma Maria negra, que percebeu e gostou) para o livro que esse meu tio resolveu lançar pouco antes de morrer. Trata-se de umas perguntas que queria que nós respondêssemos acerca de Maria. Eu me diverti fazendo os desenhos, mas não respondi a nenhuma das perguntas. É quase pueril, mas, curiosamente, o apelo ao diálogo que meu tio padre faz acho que vale.
SRN


quinta-feira, 12 de abril de 2018

Cariocas Já!


Temos parte do território disputado a fuzil por três facções do tráfico e milícias, a Rocinha debruçada sobre São Conrado, a Cerro Corá a poucos metros da mansão do Roberto Marinho, a praia e o arrastão. Somos a Maior Nação, Rubro-Negra. Não temos, cariocas, outra saída histórica senão a democracia inclusiva, mais cedo ou mais tarde. Aliás, mal ou bem já fazemos isso, há muito, com todo mundo, Diante de tanto farisaísmo dos últimos dias, cariocas deveríamos ser mais provincianos e esquecer o resto do País, que nos inveja, mas que vive nos esculachando.
Há tempos em Brasília, numa roda, o único carioca era eu. Todo mundo falando mal da minha Cidade: "não sei por que o Rio tem tanta fama." O outro: "e nem é tão bonito assim, Tem lugar mais bonito." O seguinte; "só tem bandido." Meia-hora nesse papo. Ao final, saí perguntando: você é de onde? O cara disse. E você? o outro responde. Até que, depois do último, fechei a tampa: curioso. Há meia hora vocês estão falando mal da minha Cidade. Mas, eu nunca ouvi falar de onde vocês vieram.
Saúde, Jaguar e Moacir Luz, dois cariocas, na veia, em um desenho que fiz, há tempos, pruma exposição sobre samba.
SRN
P.S. Ia me esquecendo: o paulista mais incensado é carioca, nascido em Botafogo e criado em Copacabana: Fernando Henrique Cardoso.



quarta-feira, 11 de abril de 2018

O mau-caráter do revisionismo historiográfico


Não tenho nenhuma admiração pelo que os intelectuais são. Gosto ou não do que escrevem, conforme as limitações da minha capacidade de entendimento. E não tenho, porque têm interesses e defeitos de caráter como os meus, como os de qualquer um. Mas, o que tenho visto na prisão de Lula ultrapassa, difícil encontrar paralelo em qualquer casa de tolerância.
Arautos de uma historiografia revisionista, capazes de escrever que o escravo foi também cúmplice da sua própria escravidão, por isso, não cabe cota universitária nem qualquer tipo de anacronismo reparatório, hoje usam o peso do nosso legado histórico pra explicar a prisão do Lula.
Um deles chega a dizer que temos uma elite tão retrógrada e "escravagista" que é capaz de condenar um homem do povo que aceitou as regras do jogo, não atentou contra os interesses desta elite, fez vista grossa e até estimulou a corrupção de que ela precisava pra continuar sendo elite e, ainda assim, mesmo tão cordato, é submetido a tamanha humilhação e injustiça. E vaticina: a democracia corre risco.
Burrice não é.
Não respeitaria um tipo desse como orientador. Penso em, mesmo velho, voltar atrás, fazer o Enem e tentar engenharia, meu sonho de moleque. Pode ser também Direito. Tanto uma graduação, quanto outra, eu as termino quase septuagenário. Direito talvez seja mais eficaz. Direito tributário é uma especialização que dá dinheiro, excelente pra quem tem defeitos de caráter, normais, como todo mundo.



terça-feira, 10 de abril de 2018

Uma democracia oportuna


Lula era um oportunista. Oportunista no sentido melhor do termo, daquele que identifica a oportunidade para realizar o que acha importante. Pra isso, foi fundamental sua capacidade de negociar, adquirida na luta sindical contra multinacionais, habilitando-se como alguém que veio do povo para administrar um regime sem comprometer qualquer interesse consolidado, nenhuma hierarquia estruturada, desde que pudesse melhorar a vida dos mais pobres, inscrevê-los na sociedade de mercado. Como o capitalismo que temos é terrífico, qualquer alívio já é bem-vindo.  Mas, durante a tarefa, a tentação foi grande. De fato, a democracia de um regime desse tipo está em risco porque um negociador como o Lula, que veio do povo, excedeu-se envolvendo-se na corrupção típica desse mesmo regime?



sábado, 7 de abril de 2018

Resta líder



Lula é o que resta de grande liderança. Basta olhar os seus adversários. Além dos erros alheios que acabam por beneficiá-lo.
Carmem Lúcia, com todo o afeto que as mulheres me despertam, me deu pena. Sob o argumento de não "apequenar" o STF, acabou virando a Branca de Neve tendo de arrumar togas pros sete anões em que transformou os Ministros da casa.
Não quis o Supremo refém de um casuísmo. Afinal, Lula é um brasileiro como outro qualquer. Mas, pautou o HC do Lula que põe em dúvida a prisão do condenado em segunda instância e não pautou as ADCs que avaliariam, em tese, a jurisprudência da prisão do condenado em segunda instância. E terá de pautá-las, se não o Marco Aurélio pede questão de ordem e pauta, atropelando-a
Lula - como afirma Delfim Netto: "compreende rápido o que importa" - está no melhor dos mundos.
Preso, é o Tiradentes do Pedro Américo, esquartejado, com cada pedaço distribuído entre a militância a expô-lo à opinião pública, demonstrando como sofre quem ousa enfrentar a "plutocracia oligárquica, bajulada pela classe média branca."
Solto, desde que não seja agora pra justificar o argumento, será o migrante nordestino, trepado no pau-de-arara estacionado na porta do Planalto berrando que, ali, naquele lugar da elite, "nunca antes na história deste país" o povo levou vida boa, consumo e cachacinha.
Lula é muito mais inteligente que Moro, Carmem Lúcia, Gilmar HC, Dallagnol e é tão esperto e oportunista quanto bolsonaro.
Preocupa.
E se Lula e bolsonaro produzirem uma anomia com o acirramento dessa polarização violenta?

sexta-feira, 6 de abril de 2018

"UDN vermelha" ou música do Paralamas?


Lula não é, nunca foi socialista, tampouco liderou qualquer projeto político semelhante. O "baixo reformismo" que comandou era um mero projeto de poder que buscava hegemonia numa composição que só poderia dar no que deu. Reformismo intenso no Brasil ou termina em suicídio (Vargas) ou em golpe (Jango).  Nem Vargas nem Jango, embora líderes de origem burguesa, ao contrário de Lula, não se associaram de maneira corrupta à "plutocracia oligárquica, bajulada pela classe média branca". Nem Vargas nem Jango associaram-se a empreiteiros nem a fundos de pensão corporativos. Lula paga o preço por ter sido útil ao capital. Como li ontem, em algum lugar, "preso político sempre foi aquele que ameaçava a ordem burguesa, não quem dela se beneficiou."
E o pior: o que era um projeto de hegemonia, agora virará uma questão de sobrevivência pessoal. Lula preso, ainda que por poucos dias ( há mecanismos jurídicos que conseguirão mantê-lo em liberdade, para não falar das ADCs que, mais cedo ou mais tarde, serão julgadas pelo STF), será, irresponsavelmente, cada vez mais o candidato do PT. Temo pela polarização violenta que viveremos. Pela primeira vez, caso isso ocorra, temo também pela ruptura do inédito período de amadurecimento institucional de 30 anos que vivemos em nossa história.
Um dado histórico muito importante, agora oportunamente esquecido: o PT, com Lula à frente, foi o campeão fiscal da moralidade que muitos hoje consideram hipócrita, demonstrando que, ao contrário do senso comum, o que temos é uma história saturada de memória, quase sempre, conveniente. Tanto que chegou a ser chamado de "UDN vermelha". Isso cobra um preço.
Não se esqueçam da música que o Paralamas fez a partir do que o Lula classificou o Congresso: um bando de picaretas e ladrões.


quinta-feira, 5 de abril de 2018

E a do português? Eu conto depois.

Tentando entender o fato como uma produção social. O pronunciamento do general Villas Bôas. Um general, mesmo boquirroto e falastrão, basta falar que o país amanhece sob ameaça de golpe. É golpe. Aí, o general vizinho do prédio ao lado também fala, mas vai além, pega a espada pendurada na parede e grita, escoteiro: "sempre alerta, comandante!". Trama-se o golpe. O whatsapp se inflama. Golpe! 
Eu pergunto: somos mesmo tão infantis, com medo do castigo? 
30 anos de normalidade institucional, com dois impeachments, sem ameaça de ruptura, não mudaram a nossa realidade? 
Se vivemos outra realidade, amadurecida institucionalmente, por que diatribes de general provocam tanta repercussão por ganhar curso em meios que têm por obrigação dar a tais diatribes a dimensão de bufonaria que contém? 
Ou, somos mesmo uma população que clama, de fato, por ditadura militar? 
Prefiro achar que o facilitário de quem vê tudo de um modo muito simples não contamine a responsabilidade de quem tem, por obrigação profissional, tê-la na vida.


Gilmar HC ofuscado pelo carioca Marco Aurélio


Marco Aurélio virou charge, pra desgosto de Gilmar HC ((que aqui, no meu desenho, entretanto, continua protagonista), quando da primeira sessão, sacando do bolso uma passagem aérea, disse que não poderia ficar muito tempo, pois teria de voltar pro Rio. Com todos os problemas, a polarização violenta em continuar agenda política e aqui vira símbolo, bala, morte, execuções, pesquisa do Datafolha e uma intervenção que não consegue sequer salvar o roteiro ruim do figurante do Zé do Caixão, todo carioca, como o Ministro, volta - e rápido. Está absolvido, para usar um termo pertinente.  E, ontem, bem disposto, embora fora da Guanabara, fez um voto com a concisão necessária à atenção que pretende fixar sobre a tese que o sustentou. Marco Aurélio defende que, bem antes do HC do Lula, já deveriam ter sido votadas em plenário as ADCs que tratam da tese da prisão do condenado em segunda instância. 

Assim como o Direito e a Ciência Política confundem-se, em teorias, leis e jurisprudências, no fundamento de decisões antagônicas e mesmo que se negam, justificando o que se quer, a História não teria problema nenhum de ser mobilizada e contribuir com o Ministro em sua estada em Brasília. Vale dizer: o fato há muito não é mais compreendido como dado, mas fruto de produção social a respeito do qual se diz alguma coisa. 

No caso do voto de Marco Aurélio, a especificidade não pode preceder a tese da qual extrairá o sentido. A decisão de Carmem Lúcia, evitando as ADCs, foi, de fato," a pior estratégia". O casuísmo Lula, para o bem ou para mal, é o que "apequena" o STF, evidenciando justo o caráter político tão temido por Carmem Lúcia. Se as ADCs tivessem sido julgadas e estabelecida a tese, ratificadora ou não, da prisão do condenado por qualquer colegiado de juízes, certamente teríamos sido dispensados da peroração do douto Gilmar HC. Mas, em compensação, o humor nacional perderia uma grande revelação.

SRN




quarta-feira, 4 de abril de 2018

Diatribes e Boquirrotos

A polarização violenta, com traços diluídos de fascismo, deve preocupar quem tem responsabilidade - o que não é nem muito o caso do general Villas Boas, um boquirroto que guarda analogia com Gilmar Mendes. Villas Boas é o Gilmar Mendes das FFAA. 

Acaso, tanto um, quanto o outro, por suas diatribes, botam em risco o quadro institucional que se consolida há mais de 30 anos?

SRN


Ontem e Hoje

Em 89, Brizola, na última semana para a eleição do primeiro turno, aproveitou seu horário de propaganda na televisão para conclamar aos candidatos do campo da oposição para que se reunissem, abrissem mão de projetos pessoais e encontrassem um nome que não fosse o Lula, porque o Lula - dizia Brizola - era, dentre eles, o mais fácil de ser derrotado. O tempo passou. Lula é hoje justo o contrário. Com ele no palanque, a conjuntura nacional pode ser uma coisa ou outra.
Sou de uma geração que nasceu nos anos 1960 e que só pôde votar, pela primeira vez, pra Governador, em 82, com 18 anos. Pra presidente, então, só sete anos depois. Participei, intensamente, das campanhas das Diretas Já, fiz camisas, desenhos, fui a pé ao histórico comício da Candelária com amigos, pois daqui de Vila Isabel era a melhor opção com tudo fechado desde a Praça da Bandeira. Nada se comparou aquele movimento em esperança autêntica, até ingênua, pura. Sabia a cúpula política da interdição imposta pela transição controlada pelos militares. Derrotadas as Diretas, Tancredo já operava nos bastidores. Era o candidato da "conciliação", do "não revanchismo". Brizola, o estratego de grande visão, não se engajou, apoiando à distância a ida ao colégio eleitoral. Chegou até a propor a prorrogação do general Figueiredo por mais dois anos, ao fim dos quais, em 86, haveria eleição direta à presidência. Calculem como o couro não comeu nas costas dele. Valorizo, por isso, a importância do voto. Discordo dos que o veem apenas como mero meio tático. Muita gente morreu, foi torturada. O voto direto já nos deu Collor, que sofreu o impeachment, dentro das regras do estado democrático da Constituição de 88. Lula foi eleito, reeleito, elegeu a Dilma, que também sofreu o impeachment nas mesmas condições que o Collor, pois um impeachment é sempre uma combinação entre direito e política. Como disse, não peguei a ditadura no auge, mas já, como adolescente, em sua transição controlada. Agora, posso dizer,  vivemos um ambiente que eu nunca vi. A violência é uma linguagem, e o proto-fascista bolsonaro dela se aproveita como ninguém (embora não a tenha criado). Temos, mais do que um movimento organizado, um sentimento fascista difuso que decorre da desesperança e corrupção. A propósito, também achava que a bandeira da corrupção era coisa de udenista, e o próprio PT, em seu purismo original, era mesmo chamado de 'UDN vermelha". A "Carta aos Brasileiros (da FIESP)" muda tudo. O Lulismo é uma corrente política como qualquer outra, oportunista, pragmática, que ´pagou ao PMDB o que foi preciso pra garantir a "governabilidade".
A analogia que faço agora diz respeito às FFAA.
Ontem, na premissa maior da Guerra Fria, golpistas e praticantes de crimes de Estado, com tortura, espionagem e sabotagem, vendo no seu povo um inimigo interno.
Hoje, continuam anticomunistas, mas, profissionais, respeitadoras da divisão dos Poderes e do jogo de pesos e contrapesos da democracia representativa.
Hoje, o Alto-comando se reúne, com todos os generais para uma avaliação política.
Não se trata mais de golpismo, mas de avaliação baseada na polarização violenta que vive o país e que guarda relação direta com o HC do Lula que poderá viabilizá-lo como candidato à presidência.
Não acredito que alguém que não seja cego pelo Lula possa admitir que o Lulismo não tenha sido corrupto na administração do regime contra o qual, até na Constituição de 88, o PT se recusava a aceitar.
Acredito mesmo que a popularidade do proto-fascista Bolsonaro, com eleitores em massa entre os mais pobres, esteja na razão direta da corrupção  praticada por um operário que se diz igual a ele, povo, na presidência da república.
Para não falar – repito - da violência que se generaliza sem controle e contra a qual o discurso estrutural das esquerdas é pertinente, mas não é suficiente. Há hoje uma dimensão coercitiva legal, dentro do Estado democrático de direito, necessária.
Nesta conjuntura completamente diferente do passado (comparar com 64 é um anacronismo: nem sequer como caricatura este MBL pode se comparar em eficácia ao que foi o IPES)), corremos o risco de uma solução que não dê posse a Lula caso ele prossiga até as eleições? Na polarização violenta que vivemos é justo submeter o país ao interesse de salvar a pele de um conciliador, que não mede o que for pra comprar a “governabilidade” que nos deu Temer, como Lula?
Os anacronismos comparativos assaltam a História. Vargas, como sempre, o principal alvo de caça. O Maior Estadista Brasileiro não descansa nem em sessão espírita, sempre demandado, psicografado. Foi Fernando Henrique, que disse que iria superá-lo. Lula também nada de esquecê-lo,  primeiro lá trás, hostil, no ABC, agora, com saudade, contra o “pacto oligárquico” que o admitiu como gerente.








domingo, 1 de abril de 2018

"Por que o Rio", ratazana?

Não tenho paciência pra quem não gosta do Rio. Cariocas, aliás, deveríamos ser mais provincianos, embora jamais superaríamos, neste aspecto, qualquer paulista dos demais estados da federação. Não cabe mais, pelo visto, o “estado de espírito” com que Vinícius de Moraes referia-se às demais capacidades - mineira, pernambucana etc – com que transformavam-se em carioca, sempre bem-vindas. A começar pela capacidade de Michel Temer. Hoje, Lauro Jardim publicou que, em Davos, Temer quis orientar o New York Times a corrigir a estada do seu correspondente no Brasil. “Por que o Rio, se a política está em Brasília e a economia em São Paulo?” Temer não passaria mesmo de um traço no Ibope não fosse o Rio, para o bem ou para o mal. Precisou de o Globo de Lauro Jardim, jornalista aqui no Rio, pra sair dos dutos subterrâneos onde opera sua política e ganhar protagonismo nacional. Agora usa o Rio, no que qualifica de uma “jogada de mestre”, pra ressuscitá-lo, livrá-lo da luz do sol que ilumina, péssima pra determinados tipos de filmes B, o que dirá para um Temer, que não passa disso. Aqui, Getúlio se matou pra entrar pra História. Daqui, sob intervenção, Temer sairá da história, provavelmente, para um camburão.




Feliz Páscoa (em tempos de reforma trabalhista)!


sexta-feira, 30 de março de 2018

Pra que mediador se podemos ir direto a Deus?

Marielle é lembrar de Jesus. Ia seguir nessa linha, mas havia acabado de ler a reportagem, Foco na atuação política, de Carina Bacelar, no Globo. Jesus, hoje, anda na boca de muito mbl, devoto da lei, da ordem, da moral de compartilhamento de fraude em massa e do bom costume de adular general. Pra que, então, usar mediador se podemos ir direto a Deus? E Ele fala. Segundo cita Carina: 

"Não há dúvida de que a atuação política dela, o que ela representa politicamente, não só no momento, mas até a projeção de futuro do que ela poderia representar, indica que a gente tem que ter um olhar mais acurado nessa direção. Isso é inegável."

O general Nunes é secretário de segurança da intervenção na minha Cidade. Não há nele nada que indique um "esquerdopata".