sexta-feira, 16 de julho de 2010

Praxis Rubro-Negra, Noel e a Vila


Este é um blog sobre o Flamengo, para o Flamengo e, às vezes, a despeito do próprio Flamengo, um bem imaterial muito superior à própria instituição a que está circunscrito e, por isso, exposto.

Justo o Flamengo, a respeito de cuja imaterialidade é mais do que um suporte. Provavelmente Nele também se pensava quando se construiu a categoria de bem cultural não tangível. Podemos a partir do Flamengo praticamente tudo. Constituímos uma infinidade de conexões. Da economia à política, resumimos em Preto e Vermelho a cultura brasileira.

Aqui no Rio a Câmara Municipal reconhece a percepção e torna a Torcida Rubro-Negra patrimônio cultural da cidade. Somos na verdade a concisão nacional, porque críticos e autocríticos, no pensamento desse grande carioca, Carlos Lessa, em "Rio de Todos os Brasis", em que nos diz que "um mito, uma vez desconstruído, não é restaurável. O culto que consagrou a cidade maravilha tropical, com praias, lagoas e florestas por todos os lados foi dissolvido. O Rio, sem a liderança industrial e financeira e sem ser a sede do poder, dispersará alguns recortes ideológicos. O povo do Rio está em movimento restaurando a sua auto-estima".

A violência é a expressão pública da "cidade partida". Expostos ao que há de pior, no asfalto, na favela, devagar abandonamos a condição humana. Morremos sempre da bala precisa, no enfrentamento à soleira da porta, entre a legalidade e a ilegalidade, que, de resto, confundem-se.

O Rubro-Negro é uma construção de esquina. Lembra-me o cruzamento da Gonzaga com a Maxwell, que, na minha infância, pela quantidade de acidentes, me parecia o destino da morte. Os carros e os acidentes diminuíram de tamanho. Foi o que reparei a primeira vez em que a atravessei sozinho, a pedido de meu pai, a fim de comprar um maço de continental sem filtro. Na volta, ela me parecia ainda menor. Adiante, já quase chegando em casa, nem sequer mais uso os ombros do velho que eu usava às cinco da tarde de todos os domingos. Tenho a impressão de que o Flamengo é eterno. Não há nada antes daquelas tardes.

Outro dia, em homenagem a Noel, que, aliás, não era de bola, vieram com esse papo. Um passado muito bem arrumado. Esqueceram-se de que Vila Isabel, antes de tudo, nos cultiva o antipanegírico. Aliás, um erro uma Vila monolítica, unida contra o panegírico, ainda que contra o panegírico. No próprio Noel havia algo de trágico no sentido que este imprimia à própria vida. Noel não parecia interessado em compor uma “obra” nem armar um jogo com truques, mas em registrar como fosse, do jeito que viesse, ao estilo do Geraldo, assobiador, caminhando sobre a bola, na perspectiva do lugar em que se encontrava, que era Vila isabel.

Eis o flâuner de Benjamin. O andarilho urbano, em deslocamento, uma outra estética, material, árida, a se movimentar nesse novo mundo de mercadorias. Seu movimento é a própria matéria em que o flagrante, o instantâneo, predominam sobre a experiência acumulada na tradição.

Noel também não se coagulava.

Ser moderno na 28 era escrever antiparnasiano, simplificar o desenho como fizera Nássara, sem produções em que pingam gordura, cheias de pieguice de um Coelho Neto de segunda divisão, como textos de pastel chinês.

Noel chegou a escrever que o que falávamos “era brasileiro, já passou de português”. Contudo, Noel era de um modernismo tirante à Graciliano. Seus sambas eram revoluções formalmente clássicas. Um paradoxo, como tudo em Noel.

Se fosse o 28, leria o que acabei de escrever e diria que o diabetes está alto.

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