Por Tadeu dos Santos
- E aí? Rola uma caroninha até o outro lado da lagoa?
O pedido foi feito sem que o escorpião permitisse que seu olhar cruzasse com o da rã. Há os que dizem que o olhar é o espelho da alma e o escorpião ainda que sem verbalizar o que havia ou não de profundo nesse ditado, seguia-o à risca.
- Sem chance. Disse a rã.
Também ela não conhecia a vetusta máxima. Mas o que até aqui se lhe dera aos olhos era suficiente pra viabilizar a compreensão que entre os de sua espécie e os daquele pedinte que a todo custo evitava mirar-lhe os olhos, não havia amizade entranhada e tampouco o hábito da concessão do mero bom dia.
E prosseguiu:
- Conheço os da sua espécie. Vais me dar uma ferroada. Vais me matar e eu, pródiga nadadora, irei ter ao fundo da lagoa.
- Não há aí qualquer razoabilidade. Não sei nadar e se morres, vou junto. Por que eu faria uma bobagem tão grande?
A rã matutou por alguns minutos. Pesou os prós e os contras, adicionou à toda a situação um boa pitada de racionalidade e ainda um tanto relutante disse:
- Tá bom. Vou te dar uma carona, mas olha lá, hein!
Já ia ali pelo meio da travessia quando sentiu uma pontada muito aguda. Ferroada das boas. Ela já desfalecendo, dirigiu o olhar marejado ao escorpião e perguntou:
- Mas... Por quê?
- Sinto muito. Lamento mesmo. Mas é a minha natureza. Não consigo evitar.
Essa fábula (não exatamente assim) é contada no filme “TRAÍDOS PELO DESEJO” (The Crying Game), de Neil Jordan.
A história é narrada pelo soldado britânico Jody (Forest Whitaker) ao militante do IRA, Ferguns (Stephen Rea) e revela que a fidelidade à nossa natureza supera o medo da morte.
Não há por aí quem desconheça a natureza que anima a maior e mais bonita torcida do Brasil. Já disse e vou repetir: não somos dados a marolas, somos das grandes ondas, quase tsunâmis.
Mas até mesmo pra que a onda grande vá ter à praia, faz-se necessário um ligeiro aumento na temperatura da água. Ponham a água ao fogo. Pode ser fogo pequeno, alguns gravetos e um ligeiro roçar de pedras já faz fagulha. Todo o resto fica por conta da Nação Maior.
Toda a metáfora está aí a dizer o seguinte: precisamos de um time minimamente confiável. Há que se dar o impulso inicial. Uma ou duas vitórias em sequência. Alguns gols, eis que já não mais aguentamos ver o grito morrer ainda na garganta.
Façam isso e seguiremos juntos (e misturados). Já à praia seremos onda grande. Daquelas que apequenam os adversários e maravilham a orla.
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